A higiene é essencial para qualquer gato. Na verdade, é tão importante que eles passam um quarto do seu tempo só a limpar o pelo. Talvez seja um pouco estranho para os humanos pensar que os felinos conseguem manter-se lavados com a língua (até porque geralmente a boca deles não cheira assim tão bem), mas eles não precisam de água nem de produtos químicos. A língua deles é suficiente — mas apenas porque não é uma língua qualquer.
Um artigo publicado a 19 de novembro na revista científica "PNAS" explica tudo. As línguas dos gatos têm aquilo que se assemelham a pequenas espigas (são as chamadas papilas), que são curvas e de ponta oca. O segredo da higiene dos animais está aqui: com esta espécie de cerdas, os felinos conseguem transportar grandes quantidades de saliva da boca para o pelo.
Quão grandes? Cada papila consegue reter uma fração de uma gota de água (4,1 microlitros). Pode parecer pouco mas, ao longo do dia, um gato doméstico transfere uma média de 48 mililitros para o seu pelo. Estamos a falar de qualquer coisa como um quinto de um copo de água.
E isto é essencial para a higiene dos gatos. Esta quantidade de saliva ajuda o animal a conseguir limpar-se até à pele, além de baixar a sua temperatura corporal à medida que a saliva vai evaporando.
O início do estudo — e como é que o gato persa é uma exceção
Tudo começou com a doutoranda Alexis Noel, orientada por David Hu, o autor principal do artigo publicado na revista científica. A jovem decidiu estudar a língua dos gatos depois de observar o seu próprio felino.
Noel ficou intrigada quando viu o seu gato a lamber uma manta felpuda. As papilas da língua do felino ficaram enleadas na manta, o que a deixou a pensar sobre como é que funcionaria afinal a higiene dos animais. Estava lançada a premissa do estudo.
Estudar a língua de gatos domésticos foi fácil, no caso dos felinos selvagens foi preciso pedir ajuda aos jardins zoológicos. Acabaram por conseguir analisar cinco espécies de felinos, além do gato doméstico: lince, puma, leopardo-das-neves, tigre e leão.
O professor e a aluna do Instituto de Tecnologia da Geórgia, nos Estados Unidos, perceberam rapidamente que havia poucos estudos sobre o assunto, e os que existiam podiam ser facilmente refutados. Foi o que aconteceu com um artigo científico de 1982, que dizia que as papilas dos felinos tinha a forma de um cone oco.
A tecnologia atual permitiu concluir que não é bem assim. Na verdade, as papilas são curvas, inclinando-se para trás, na direção da garganta. As papilas também têm capacidade de rodar, o que é particularmente importante quando o gato tem de desembaraçar um nó no pelo, por exemplo.
Com exceção do gato persa, todos os gatos domésticos conseguem assegurar a limpeza até à pele. Por isso mesmo, esta espécie precisa de ser escovada todos os dias para evitar o aparecimento de nós no pelo.
Como é que a língua dos gatos está a inspirar a tecnologia
As escovas e pentes não evoluíram muito ao longo das décadas. Pelo menos foi essa a conclusão de David Hu quando, depois de os filhos apanharem piolhos, passou na farmácia e percebeu que não havia nada verdadeiramente adequado para a remoção de lêndeas.
Poderiam as línguas dos gatos ajudar? Os investigadores acreditaram que sim, desde que conseguissem replicar as papilas. Foi assim que nasceu a TIGR. Com a ajuda de uma impressora 3D, os investigadores criaram uma escova flexível com o tamanho de dois dedos juntos, lado a lado — é bastante pequena, portanto. Comparando-a com uma escova convencional, Noel e Hu concluíram que a TIGR conseguia remover de forma muito mais eficiente uma pele sintética com pelo em nylon.
Há mais. Com uma simples passagem de dedo, os investigadores conseguiram remover todo o pelo que tinha ficado na escova. Com uma escova convencional, não foi assim tão simples.
A TIGR pode revolucionar as escovas para gatos. Além de escovar e limpar, Noel e Hu acreditam que possa ajudar a aplicar cremes e loções na pele dos gatos. Na indústria têxtil, pode também contribuir para triar fibras. Quanto aos humanos, bem, é continuar a investigar. Neste momento decorre o pedido de patente da TIGR, e os investigadores pretendem melhorá-la antes de pensar na produção em massa.