Mais de 55 mil pessoas cruzaram as portas do Passeio Marítimo de Algés, todos os dias, entre quinta-feira, 12 de julho, e sábado, 14. Durante os três dias do NOS Alive, fiz parte do rebanho que fez filas para entrar no recinto e que formou um mar de gente ainda maior para sair, como se todos os zombies do The Walking Dead se tivessem reunido para atravessar a ponte que faz a ligação entre os dois lados da linha do comboio.
Há pouco mais de um mês tinha estado no NOS Primavera Sound, um dos festivais mais bem organizados em que já estive. Nunca houve filas para nada, mas mesmo assim senti que metade do tempo era passado num vaivém entre a casa de banho, o bar e de palco para palco. Ir a um festival de verão é como participar numa corrida de estafetas, com pausas para concertos. Esta experiência deixou-me fazer uma previsão daquilo que se seguiria no mês de julho: se no festival de Matosinhos foi assim, como seria naquele que reunia no cartaz "Arctic Monkeys", "Pearl Jam", "Queens of the Stone Age" ou "Jack White"?
Tomei uma decisão. De forma a responder à minha pergunta, andei de cronómetro ligado, de um lado para o outro, para conseguir fazer uma média do tempo que, nos três dias, se gasta entra idas à casa de banho, entradas e saídas e esperas em fila para a cerveja. Este foi o resultado final.
Entrar e sair. Tempo total: 3 horas e 10 minutos
Isto é tipo o Instituto Superior Técnico: consegue-se entrar, mas é difícil sair. Apetece largar tudo e dormir num qualquer canto da rotunda de Algés, porque as forças estão para lá do nível zero e, verdade seja dita, a saga do inferno será a mesma nos dias seguintes.
A entrada faz-se relativamente bem, apesar de no terceiro dia — quando já se ouvia "Alice in Chains" cá fora — ter demorado 20 minutos a atravessar a extensa reta, cheia de etapas e de seguranças, que dá acesso ao recinto.
Mas aquilo que importa mesmo é falar sobre a saída. Há duas opções: ou esperar que o túnel do comboio reabra (dá acesso ao outro lado da linha, o melhor para apanhar táxi) ou fazer o caminho do The Walking Dead — o tal da ponte — caminhada que dura, sem problema nenhum porque o passo já é muito lento, uma hora, a que se somam o tempo da procura pelo táxi e a viagem até a casa.
Casa de banho. Tempo total: 1 hora e 45 minutos
Ora aqui está uma missão ao nível dos Santos Populares. Fui à casa de banho entre quatro a cinco vezes por dia de festival. Em concertos mais calmos, são cerca de oito minutos para ir e voltar, se estivermos junto do palco principal. O pior é que a vontade não se controla e aparece quando bem lhe apetece. No início, meio ou fim dos concertos dos cabeças de cartaz, o caso é diferente: entramos num campo de batalha.
Everything is New, obrigada por mais uma edição épica. Mas, por favor, expliquem-me porque raio é que num festival que recebe milhares de pessoas, há apenas dois polos de casas de banho? É que além de serem poucos, são o mais longe possível do palco principal, onde a malta se concentra quase toda para ouvir os convidados fantásticos que cá trazem. A meio dos concertos, todos temos vontade de fazer xixi, mesmo tendo ido antes de ele começar. A sério, nós conhecemos as regras. Mas pensem: as atuações nunca têm menos de uma hora e meia e estamos todos a beber cerveja.
O problema não está na casa de banho em si (são bastante boas), mas no caminho que se tem de percorrer. Tive de abandonar "Arctic Monkeys" para ir e foram 15 minutos de pura agonia até alcançar o destino. Tive a sorte de conseguir um lugar para ver o espetáculo bem lá à frente, mas o azar de ter de furar aquela mesma multidão. Em "Jack White" aconteceu o mesmo, mas como havia menos pessoas e estava numa zona mais acessível, foi mais rápido e menos penoso. Mesmo assim, demorei 8 minutos e 34 segundos.
No final dos concertos, o caso é igualmente dramático, porque a massa monstruosa de gente caminha toda para o mesmo lado, mas com algumas nuances: uns vão em linha reta, outros em direção à diagonal esquerda, outros em direção à direita. É um salve-se quem puder. Filas que não terminam. Bexigas prestes a rebentar. E alguma vontade de chorar. Fraldas?
Fila para cerveja e afins. Tempo total: 90 minutos
Pouco a acrescentar, porque os balcões até funcionaram bem, sendo que contaram com o apoio dos rapazes a que apelidei de cervejeiros — aqueles que caminham com um barril às costas e que nos cobram mais 50 cêntimos por imperial, apesar de nunca encherem o copo até cima. São as regras.
Mesmo assim, a média dá cerca de cinco minutos para pedir uma cerveja (ou outra bebida qualquer). Se multiplicarmos pelo número que bebemos, notamos que ainda é algum tempo, mas não faz mal porque uma estafeta tem paragens e esta puxa a alegria.
Ir de um palco para o outro. Tempo total: 21 minutos
Galgar os recintos também faz parte do espírito festivaleiro. Mas seria muito mais agradável se houvesse mais espaço por pessoa. É outra coisa que não se entende: é o festival de cidade que mais gente reúne e, segundo o Observador, vai continuar, durante mais cinco anos, a acontecer num recinto sem capacidade para tal, como já confirmou o Presidente da Câmara de Oeiras, Isaltino Morais. Além da falta de espaço, podemos referir ainda o facto de o piso ser plano, o que só deixa ver os ecrãs e com sorte o pé de um artista. A saída dos grandes concertos é simplesmente infernal. O cruzamento entre as casas de banho, a zona da restauração e o acesso aos outros palcos é um verdadeiro filme de terror, agravado pelos amigos que encontram amigos ou que querem parar para pedir mais um copo.
Passei grande parte do tempo no palco principal e fiz apenas viagens até aos outros para ver um pouco de "Branko", de " Surma" ou "At The Drive In", portanto consegui escapar mais ou menos a este quadro, muito porque na primeira noite senti o que dói, logo após "Arctic Monkeys".
Tempo total a andar de um lado para o outro: 6 horas
Portanto, passada mais uma edição, concluo que há três formas de estar num festival.
- Ou vamos exclusivamente assistir aos concertos, sem jantar ou ir à casa de banho.
- Ou vamos para comer e ir à casa de banho, sem ver os concertos.
- Ou somos ninjas.
O que é que preferem?