Andreia Mota, 41 anos, já era mãe de um rapaz quando se viu envolvida numa relação abusiva. A viver fora do País, Andreia, que trabalha como secretária, era constantemente atacada pelo companheiro, que também maltratava o próprio filho. “Estava numa relação tóxica, a verdade é essa”, recorda Andreia à MAGG, que acabou por encontrar conforto nas conversas virtuais com Miguel, um homem que vivia em Portugal e que conheceu através de uma rede social.

Depois de muitas horas de trocas de mensagens, Andreia e Miguel conheceram-se pessoalmente. “Vim a Portugal e ficámos cara a cara. Ele também estava a passar um mau bocado, tinha acabado de sair de um relacionamento sério e estava bastante em baixo. E a partir do minuto em que nos conhecemos, não nos largámos mais”, conta Andreia, que pegou no filho de 2 anos, deixou tudo e voltou para Portugal para viver com Miguel, que acolheu a criança como sua.

Passado algum tempo, Andreia e Miguel trocaram alianças e, mais tarde, tiveram a sua primeira filha em comum. Mas sete anos depois o casamento implodiu. “O Miguel é chef de cozinha, trabalhava imenso e eu passava muito tempo sozinha com os miúdos”, relata Andreia, que considera que nenhuma relação consegue resistir à monotonia e à indiferença. "Andávamos os dois para lados diferentes quando surgiu alguém na minha vida. Essa pessoa começou a dar-me atenção, carinho, tudo o que eu não estava a receber do Miguel, e a desempenhar o papel que o meu marido não conseguia cumprir”.

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Admitir a traição aumenta as hipóteses de o casal se manter unido

De acordo com um estudo de opinião da Eurosondagem, 58% dos portugueses afirma ser fiel, mas as traições estão presentes em muitos relacionamentos e casamentos. De acordo com a psicóloga clínica Beatriz Matoso, este é “um sintoma de que a relação amorosa está doente, doença que muitas vezes se manifesta pela infidelidade, frequentemente acompanhada de mentira”.

Apesar de existir a noção pré-concebida de que as mulheres perdoam mais facilmente uma traição (muitas vezes devido à preocupação com os filhos, quando estes existem), a psicóloga Beatriz Matoso afirma que não é possivel afimar que o sexo feminino é mais permissivo nestas circunstâncias.

“Cientificamente falando, não podemos provar que as mulheres perdoam mais facilmente uma traição e que os homens se sentem mais feridos no seu orgulho próprio. Contudo, o ser humano é influenciado pela mentalidade característica do contexto sociocultural em que se insere, a qual influencia o seu sentir”, afirma a especialista.

A especialista relata à MAGG que, nestas circunstâncias, a pessoa traída (seja homem ou mulher), “começa geralmente por se sentir insuficiente e humilhada”, agravando-se o caso quando existe também uma mentira. “Se a traição é acompanhada de uma farsa, a pessoa traída também se sente enganada e desrespeitada, o que gera sentimentos de revolta, raiva, ciúme e vergonha”, acrescenta Beatriz Matoso.

No caso de Andreia Mota, o marido acabou por descobrir que existia uma segunda pessoa na vida da mulher, a relação esfriou e o casal acabou por se divorciar. Mas a psicóloga clínica afirma que uma relação tem mais hipóteses de sobreviver se a verdade for admitida pela pessoa que foi infiel: “É mais ‘fácil’ resolver positivamente uma situação destas quando a verdade é descoberta pela boca do parceiro e este se confessa sinceramente arrependido, com desejo de renovar e dar continuidade à relação”.

Recuperar a confiança perdida é complicado — mas possível

Após o divórcio, Andreia e Miguel mantiveram uma relação cordial. O chef de cozinha percorria 300 quilómetros a cada dois fins de semana para visitar as crianças, tanto a sua filha biológica, como o filho da anterior relação de Andreia.

“Mantivemos esta dinâmica durante cerca de três meses, até que pensámos em voltar a tentar. E o que pesou muito nesta decisão foi o quanto o meu filho estava a sofrer com a situação, mais até do que a nossa filha em comum. Sentámo-nos, falámos, pesámos os pontos a favor e os contra e chegámos à conclusão que os prós eram a maioria. E assim foi, ficámos juntos outra vez”, recorda Andreia.

Na opinião de Beatriz Matoso, é realmente possível superar uma situação de traição, mas apenas se existir confiança e diálogo. “O casal tem de recuperar a confiança mútua, através de uma atitude de diálogo construtivo que exige a identificação das fragilidades do vínculo conjugal”, salienta a especialista. É necessário e aconselhável “pedir apoio a um terapeuta de casal que os ajude a compreender profundamente o que se passou para se reajustarem nos objetivos que pretendem atingir, transformando o sofrimento no gosto de partilhar”.

Acho que quando é o homem a trair e existem filhos envolvidos, as mulheres têm tendência a desculpar para não prejudicar as crianças.”

A psicóloga clínica afirma que é este trabalho do casal que “vai ajudar a recuperar a confiança perdida, se ambos se empenharem, com responsabilidade, na reconstrução da relação, pelo valor que ela representa na sua vida”. Para Beatriz Matoso, só vale a pena investir num recomeço “quando ambos os parceiros reconhecem um no outro qualidades que admiram, as quais facilitam trocas afetivas que trazem alegria e sentimento de realização”.

Os filhos não devem ser o único motivo para a relação se manter

Carolina (nome fictício), 48 anos, estava casada há apenas dois meses quando descobriu que o marido (com quem já vivia há algum tempo) a tinha traído. Mãe de três filhos, sendo a filha mais nova fruto da relação com o companheiro, a empresária separou-se mas, ao final de um ano, voltou para o marido.

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“Acho que quando é o homem a trair e existem filhos envolvidos, as mulheres têm tendência a desculpar o que aconteceu para não prejudicar as crianças”, conta Carolina à MAGG. “Mesmo que não seja isso o que a pessoa realmente deseja, a maternidade fala mais alto e as mulheres acabam por aturar as situações mais bizarras em prol dos filhos”, salienta a empresária.

Carolina esteve nove anos casada, embora admita que a confiança nunca foi recuperada após a traição: “Eu exigia muito do meu marido, mas não admitia que ele me exigisse nada a mim. Tínhamos muitas discussões e durante muito tempo não me apercebi do quão mal esta relação me estava a fazer. Continuei casada pelos meus filhos mas não estava feliz e, com o tempo, a minha própria relação com eles estava a ressentir-se”.

Há um ano, Carolina e o marido divorciaram-se. A empresária admite que foi a melhor decisão que podia ter tomado. “Cheguei à conclusão de que os meus filhos são importantes, mas é igualmente importante eu estar bem. E precisava de estar bem para ser uma pessoa resolvida. Aceitei isso e, hoje em dia, a minha relação com os miúdos está melhor do que nunca e sou feliz de verdade”, conclui.

Beatriz Matoso também não tem dúvidas de que os filhos não devem ser envolvidos nas crises conjugais, nem devem os pais sacrificar-se e ficar juntos por causa das crianças. “Ao fazê-lo, colocam nos filhos, consciente ou inconscientemente, a responsabilidade da resolução dos seus conflitos, o que é uma carga demasiado pesada e impossível de suportar”, afirma a psicóloga, acrescentando que, quando tal acontece, “é inevitável a danificação do vínculo de filiação, com outras consequências graves de carácter emocional para a vida dos filhos”.

*Texto publicado originalmente em 2018, mas agora atualizado.

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