O mais recente convidado de "Conta-me", o programa de conversas francas da TVI, foi Nuno Santos. O atual diretor da CNN Portugal, que também já foi diretor de programas e diretor-geral da TVI, esteve à conversa com Manuel Luís Goucha na véspera do lançamento do novo canal do grupo Media Capital.
Numa conversa sempre pautada por traços intimistas, e emitida este sábado, 20 de novembro, Nuno Santos falou abertamente sobre o desafio que tem pela frente e do que isso poderá significar para o futuro da informação em Portugal. Mas houve tempo e, acima de tudo, espaço, para que a conversa se expandisse para lá disso, passando pela sua infância e alguns dos momentos que marcaram a sua vida e carreira.
A propósito do lançamento da CNN Portugal, o seu diretor-geral descreve estes tempos de preparação como tempos "quase sem sono". "Nestas fases é assim e não pode ser de outra maneira. É avassalador, entusiasmamente e mobilizador para as equipas. Temos as melhores expectativas e achamos que o público também as tem em relação àquilo que podemos fazer. Temos de pensar que o mais importante são as pessoas. Não só em casa, mas as que vêem na televisão, nos telemóveis e nos iPads", diz.
Face a este projeto, que descreve como sendo o mais importante da sua vida, até porque está associado a uma marca gigante, Nuno Santos acredita que a essência do jornalismo não mudou. Ou seja, "a curiosidade, a capacidade de contar boas histórias e de procurar a verdade" continuam a ser os pontos basilares do que deve ser o jornalismo."
"A maneira como se produz hoje o jornalismo e os meios que existem é diferente", concretiza.
Nuno Santos descreve Emídio Rangel como "uma força transformadora nos media em Portugal"
Quando questionado por Manuel Luís Goucha sobre o que poderia pensar Emídio Rangel — o seu mentor, um dos rostos mais importantes dos media em Portugal e ex-diretor da SIC, que morreu em 2014 vítima de cancro —, Nuno Santos começou por descrever a sua relação com o antigo diretor.
"Sou um cético que crê e um crente que duvida. É uma relação tensa, mas acho que o Emídio gostaria deste projeto. Trabalhei muito próximo com ele, tínhamos uma forma muito parecida de olhar para a vida, no sentido de olhar para as soluções e não tanto para as dificuldades. Foi uma força transformadora nos media em Portugal. Tive a sorte de, num certo momento, aparecer na vida dele ou de ele ter olhado para mim e ter visto que aquele miúdo de 20 e poucos anos era alguém em quem acreditava e a quem ia dar responsabilidades", refere o diretor-geral da CNN Portugal.
Ao longo da conversa, Nuno Santos falou também da "capacidade de dar a máxima de liberdade e pedir toda a responsabilidade" de Emídio Rangel.
"Foi assim que trabalhámos em vários projetos. Ele não tinha medo do risco. Arrisca-se menos agora e ele sabia que não se ganhava sempre, mas tinha uma visão estratégica sobre a televisão e sobre a rádio", continua.
O conflito entre os dois foi público quando, em 2001, Nuno Santos se demitiu enquanto diretor de informação da SIC Notícias na sequência de um desentendimento com Rangel, na altura, diretor-geral de conteúdos da SIC, que acusou de deslealdade no final de uma auditoria realizada à redação.
Desse conflito, que quem assistiu diz ter sido violento em estilo e forma, resultou um afastamento que durou cerca de dez anos.
"Estivemos dez anos sem nos falarmos", admite Nuno Santos recordando uma "zanga muito dura". "No momento em que ela acontece, e nisso sou implacável, cortei a direito e combati-o com todas as minhas forças. E voltaria a fazê-lo. Senti-me injustiçado e reagi. Mas depois, ficou uma mágoa", lamenta.
Dez anos depois, os dois voltaram a reencontrar-se. Na altura, Nuno Santos era diretor de informação da RTP e Emídio Rangel assumia funções de comentador do canal. "Tivemos uma noite eleitoral que nos correu muito bem [referindo-se à RTP] e fui dar os parabéns a todos os comentadores, inclusive a ele."
A isso, seguiu-se um encontro em que ambos disseram "tudo um ao outro". "Acho que morreu cedo demais. Faz-nos muita falta e tenho pena de o ter perdido", diz Nuno Santos.
A morte do pai, que descreve como "um bom crítico" e "um bom espectador"
Uma das maiores referências de Nuno Santos é o pai, que morreu quando este tinha 26 anos. Ainda que o descreva como "um bom espectador" e "um bom crítico", não tem dúvidas de que "perdeu alguns dos melhores anos" da vida de Nuno Santos.
"E eu perdi uma pessoa central da minha vida. Era um pai não muito dado aos afetos, mas foi muito importante na minha formação, nas conversas que teve comigo, mas também nos silêncios. Houve um dia em que se levantou e caiu para o lado. Foi o maior choque da minha vida."
"A minha mãe é uma mulher de armas, porque nem isso a impediu de continuar a ser firme em relação à sua vida, em relação aos filhos e os netos. Não refez a sua vida amorosa dela. Isso diz muito sobre o amor deles, mas também de um tempo [em que viveram]. Demorou uns anos até voltar a ter um certo brilho no olhar", recorda o diretor da CNN Portugal.
Sobre como será a sua vida logo após a próxima segunda-feira, 22, altura em que a CNN Portugal iniciará a sua emissão, diz que provavelmente será como tem sido até aqui: de manhã à noite nos estúdios. Mas haverá uma altura em que se possível voltará a retomar a sua vida. "Vai chegar o momento em que nós teremos uma velocidade de cruzeiro, mesmo num projeto de informação que é exigente e implica estar sempre ligado, e vai ser possível ter uma parte da minha vida de volta, até porque tenho uma filha de nove meses e quero vê-la crescer", diz.
Além disso, admite ainda que quer ter tempo para si próprio, para "ler e para viajar". Ou até "para não fazer nada".
"Portugal e o mundo vão estar aqui a partir da próxima segunda-feira. É um bom sinal para a indústria da televisão, porque mostra que somos um país interessante. E o jornalismo também precisa de dar um salto. O que nós vamos fazer aqui, e é bom para o mercado todo, é investir no jornalismo", refere.
Sobre se irá dar a cara, Nuno Santos admite uma vontade.
"Não sei a forma, nem como, mas sinto essa vontade. Hoje podia ser um dos principais pivôs dos noticiários em Portugal. Acho que teria qualidades, mas fiz uma escolha, determinada pelas circunstâncias, de passar para trás das câmaras. Gosto desse lado de gerir equipas, embora seja mais pesado porque todos os dias há problemas para resolver. Às vezes penso que gostava 'só' de ter um jornal para apresentar."
Apesar disso, Nuno Santos, atualmente com 53 anos, diz que, nesta fase, ainda que lhe faltem "dar muitos passos" para se sentir realizado, essa realização de que fala circunscreve-se à vida pessoa.
"Faltam-me cumprir mais etapas para a minha realização pessoal do que profissional", conclui.