Quando se pergunta a um vegano qual o produto mais difícil de abandonar ao adotar uma alimentação sem produtos de origem animal, a resposta costuma ser unânime: queijo. Talvez por isso, sejam cada vez mais as marcas, criadas quase sempre por quem sente a falta destes produtos, a oferecer opções vegetarianas semelhantes ao queijo, com variações que vão desde o básico flamengo até ao chèvre ou ao parmesão.
E quem diz queijo, diz fiambre, ou até mesmo mortadela, paio e até alheiras.
Estes novos produtos são consumidos por vegetarianos e veganos, mas também por quem tem intolerâncias alimentares à lactose, por exemplo, ou simplesmente por quem quer seguir uma alimentação mais saudável. Mas será esse caminho realmente o mais saudável? Nem sempre.
"O problema da maioria das pessoas que deixam de comer produtos de origem animal é o facto de tentarem encontrar substitutos semelhantes aos originais", refere Catarina Lopes. A nutricionista explica à MAGG que mais importante que a imagem ou o sabor semelhantes, o importante são os valores nutricionais do alimento e para ter a certeza do que está a comer, nada como ler os rótulos.
Pegamos então numa marca vulgar de fiambre de perna extra e comparamos com a versão vegetal. Por cem gramas, a de carne tinha 101 calorias, 16 gramas de proteína, 3,2 gramas de gordura e 2,4 de sal. Já a versão vegetariana, tinha 161 calorias por 100 gramas, 15 gramas de gordura, cinco de proteína e 2,1 de sal. Ou seja, mais calorias, menos proteína e bastante mais gordura.
Quanto ao queijo, tudo depende da marca. Existem aquelas que, ao retirar os produtos lácteos, acrescentam demasiados conservantes e corantes, que tornam o produto final pouco saudável. Mas as que optam por bases feitas de frutos secos, soja ou tofu, por exemplo, ficam claramente a ganhar. Também não é difícil, tendo em conta que dos 22 gramas de uma fatia de queijo flamengo tradicional, quase sete são de gordura, num total de 79 calorias.
"Quanto mais parecido é o sabor, mais corantes e conservantes lhes foram adicionados", garante Catarina, deixando até uma alternativa. "A levedura nutricional, apesar de não ter uma textura nada semelhante ao queijo, tem um sabor semelhante e é rico em B12, um nutriente muito importante para os veganos, uma vez que normalmente chega ao nosso organismo apenas através do consumo de produtos de origem animal".
De qualquer forma, nada como ler tudo com atenção e saber que o açúcar pode tomar as mais diversas formas. E sim, há acúçares adicionados à maioria dos queijos, fiambres e enchidos vegetarianos à venda nos supermercados. "Quando ler amido, frutose, dextrose ou outro ingrediente acabado em 'ose' é açúcar", refere a nutricionista. E uma vez que os ingredientes surgem na lista por ordem descrescente, ou seja, do que está em maior quantidade para o menor, se um destes nomes estiver num dos três primeiros, o melhor mesmo é não comprar.
Não queremos com esta informação desencorajar os veganos a seguir uma vida longe da carne e do queijo e é por isso que damos alguns exemplos de marcas — umas mais próximas dos ingredientes naturais que outras — que recentemente se lançaram no mercado com opções de charcutaria adaptadas a quem tem uma alimentação mais alternativa. Temos é a certeza que vai ler isto com olhos de quem sabe que o selo "vegano" não carimba uma vida mais saudável.
Alheiras vegetarianas feitas no Minho
Ninguém esperava que o Alto Minho se tornasse uma espécie de meca para os vegetarianos deste país, mas a verdade é que Paredes de Coura tem contribuído para abrir horizontes a uma terra que, por natureza, não vive sem um belo naco de carne.
Todos os restaurantes da vila têm pelo menos uma opção sem carne e peixe e é lá que se organiza todos os anos um congresso dedicado ao vegetarianismo. Também é de lá que saem as alheiras vegetarianas mais famosas do país.
Laurentino Alves estava habituado a produzir e vender alheiras de carne, até que começou a ser desafiado para criar uma versão vegetariana que agradasse a este público novo.
Em casa, fez 15 unidades e deu a provar aos amigos. “Todos gostaram muito e eu pensei: ‘Se calhar há aqui potencial’.
Dessa pequena amostra caseira passou logo para a produção de 300 alheiras para serem servidas no congresso do ano passado. A partir daí, Paredes de Coura deixou de ter fronteiras.
Atualmente, os Enchidos Agramonte deixaram de se focar tanto na carne e a produção vegetariana chega às 500 alheiras por mês, vendidas por encomenda ou em lojas e restaurantes espalhados um pouco por todo o país.
Criou a versão sem glúten e está prestes a certificar a versão biológica. Os ingredientes serão os mesmos que os que usa atualmente — pimento, azeitona, cebola, alho, azeite, pão (com ou sem glúten) e cogumelos shitake —, com a certeza de que a sua origem é biológica.
Preço: 11,5€/kg (vegetarianas), 16€/kg (vegetarianas sem glúten)
Onde vendem: Por encomenda e em lojas e restaurantes por todo o país
Ingredientes: pimento verde e vermelho, azeitona verde e preta, cebola, alho, azeite, pão (com ou sem glúten), cogumelos shitake e especiarias
Queijos e enchidos para petiscos veganos
Quando começaram a namorar, Jorge era o único vegetariano do casal. Agora, não só Ana se rendeu a um dia a dia sem carne, como deu um passo à frente e largou, não só a carne, como o peixe, ovos, e todos os derivados. Enquanto vegana, percebeu que não havia muitas alternativas saudáveis àquilo que costumava pôr no pão para uma sandes ou como petisco para entreter enquanto o prato principal não estava pronto. "Charcutaria vegan já existe, mas, ao contrário do muito que se vê por aí, eu prefiro usar produtos mais naturais para chegar ao resultado final", explica Ana.
Fez workshops, pesquisou na internet, leu livros e enfiou-se na cozinha numa lógica de tentativa-erro. Mas a verdade é que erros houve poucos. "Demos a experimentar a alguns amigos e todos aprovaram", contam à MAGG. Chamaram à marca "Petisco Vegan" e, entretanto, Ana conseguiu chegar já à fórmula mágica do queijo flamengo, com ou sem papikra; de um com tomate e manjericão; mozzarela; parmesão; mortadela e paio. Há sempre quem não aprecie o toque de mostarda que dá ao flamengo ou até quem não consiga comer a mortadela por ter um sabor demasiado real. "Sim, isto já aconteceu", admitem, entre risos.
Perceberam que havia mercado e começaram a vender através das redes sociais, ainda que a ideia seja passar também a ter disponível em lojas e restaurantes. "É que ao contrário do Jorge que, apesar de vegetariano, se for a uma pizzaria pede a pizza com queijo, eu não. Era bom que começasse a haver mais opções veganas em restaurantes comuns".
Preço: de 3 a 9€
Onde vendem: Facebook e Instagram
Ingredientes: queijo flamengo (a título de exemplo): agua, óleo de coco, soja não geneticamente modificada, amido de mandioca, vinagre, carragenina, sal, levedura nutricional, mostarda e cebola. A lista de ingredientes de cada produto é enviado ao cliente no momento da encomenda.
Quando o caju se transforma em queijo
A holandesa Karo Tak percebeu que queijo é talvez a última coisa que os vegetarianos abandonam até se tornarem veganos.
Quando, a meias com a alemã Lisa Dickmann decidiu abrir em Lisboa o Foodprintz, um restaurante 100% vegano, onde também acontecem aulas de ioga e workshops de comida e mindfulness, decidiu investir também numa marca de queijos feitos de modo artesanal e com ingredientes do mais naturais possível, a que deu o nome de GoPal.
Existem versões para barrar, outras para cortar às fatias e, consoante o sabor escolhido, podem ter como ingredientes base tofu, caju, pinhões, tomate, arandos, alperces e figos secos. Nós dissemos que eram mesmo do mais natural possível. Além disso, têm sempre nomes originais como "Smooth Creaminal" ou "Holy Chèvre".
Os queijos podem ser comprados para levar para casa — estão à venda no Foodprintz e na loja Rise Clan —, mas também são servidos no restaurante, normalmente numa tábua e acompanhados com pão caseiro e frutos secos.
Preço: entre 6 e 9 euros
Onde vendem: Foodprintz (Rua Rodrigo da Fonseca 82a) e Rise Clan (Avenida Duque de Loulé, 103, Lisboa)
Ingredientes: tofu, caju, pinhões, tomates e frutas secas
Fatiados vegetarianos ou uma espécie de fiambre
Pensar em Nobre é pensar em salsichas e fiambre. Ponto. Mas talvez os mais atentos tenham já percebido que a marca tem vindo aos poucos a adaptar a sua oferta a uma clientela cada vez mais exigente. Já existem salsichas de soja e de tofu, por exemplo, às quais se juntam agora outras opções vegetarianas.
"Não são apenas as pessoas intolerantes ao glúten que compram os produtos isentos, nem tão pouco são os vegetarianos os únicos a fazer refeições sem carne", explica à MAGG Cátia Costa, gestora da marca. Mesmo assim, a marca assegura que estes são produtos adequados a celíacos e intolerantes à lactose. Os fatiados desta gama são feitos à base de clara de ovo, sem glúten, lactose, soja ou corantes artificias e podem ser comprados com estas três variações de sabor: legumes, ervas aromáticas e espargos.
A textura, cor e formato assemelha-se ao fiambre e a marca sugere que sejam usadas para fazer sanduíches, saladas ou tartes salgadas.
Preço: 2,19€ (valor que pode variar consoante o supermercado)
Onde: super e hipermercados
Ingredientes: a base é feita de clara de ovo, água, óleo de girassol, sal, especiarias, espessantes, açúcares e corantes alimentares.