Em 2018, Andre Peart deixou a Penitenciária Bare Hill, em Nova Iorque, nos Estados Unidos. Tinha 27 anos, estava finalmente em liberdade depois de cumprir uma pena de prisão de quase seis anos, mas não tinha para onde ir. Não tinha casa nem emprego e ninguém para contactar. E mesmo que tivesse, não tinha forma de o fazer.

Com 40 dólares no bolso (cerca de 35,20 euros) e um bilhete de autocarro, sabia que não podia ir longe, mas não tinha noção do quão difícil seria reerguer a vida a partir daquele momento. Peart viveu em abrigos locais durante cerca de um ano, ganhou dinheiro a recolher lixo e a fazer manutenção num ginásio. Mas não era, de todo, o que tinha idealizado.

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"Lembrou-me a prisão", afirmou o empresário, agora com 31 anos. "Queria florescer e fazer mais para poder sair". Sabia que não ia ser fácil, diz, mas garante que não tinha noção do desafio que estava prestes a enfrentar.  Afinal, era jovem, tinha uma licenciatura e formação em jornalismo. O que é que faltava? Segundo as entidades patronais a quem recorreu: um cadastro limpo. 

Entretanto começou a candidatar-se freneticamente a empregos, sempre sem sucesso. A necessidade de conseguir um emprego não era apenas financeira. Era uma exigência da liberdade condicional, juntamente com outros requisitos, como completar um programa de gestão da raiva, que Peart não sabia onde encontrar. 

Ficou fascinado com o LinkedIn, até perceber que nem as boas referências se sobrepunham à informação de que já teria estado preso. Quando percebeu que o estereótipo de "ex-presidiário" era o único entrave, decidiu mudar o panorama digital tanto para si como para todos os que se encontravam na mesma situação.

"Achei que [o LinkedIn] poderia ser muito poderoso, se houvesse uma ferramenta para homens e mulheres como eu", começou por dizer, em declarações à CNN. "E como não havia nada parecido, decidi criá-la."

Foi assim que, em 2020, nasceu a ConConnect, uma plataforma digital exclusivamente dedicada a empregos para ex-presidiários. E o objetivo é simples: retirar o efeito surpresa da equação. Quem recorre à ConConnected já sabe, à partida, que todos os candidatos que está prestes a encontrar cumpriram pena de prisão. E está disposto a aceitá-los.

"A minha visão é conectar estas pessoas a empregos, recursos de reinserção, cursos, organizações sem fins lucrativos, empregadores de segunda oportunidade, agências de saúde mental e abuso de drogas e toda uma comunidade que pode dar apoio, tudo num único sítio", explicou Peart. "Quero oferecer a outras pessoas o acesso imediato a recursos e oportunidades que eu não tive – ou não sabia como obter."

O site também inclui mais de 220 parceiros, 40 empregadores e oferece 60 serviços diferentes. Peart afirma que a ConConnect deverá ter 1000 anúncios de emprego publicados até este verão, com três a cinco anúncios publicados por semana.

"Quero oferecer trabalhos acima do salário mínimo"

"Muitas pessoas que saem da prisão não estão a par da tecnologia mais recente", explica Peart, com a ressalva de que, exatamente por isso, criou uma plataforma fácil de usar e simples de navegar.

Antes de qualquer outra coisa, os utilizadores têm acesso gratuito e respondem a um questionário sobre os seus antecedentes criminais para criar um perfil. E, a partir daí, podem interagir com as pessoas da comunidade de reinserção através de um feed na "rede social", criando conexões à medida que constroem uma rede.

Sendo que terão também acesso a três secções: empregos, cursos e serviços. As empresas também podem iniciar sessão e publicar trabalhos e recursos através do pagamento de uma taxa de subscrição.

"Quero oferecer trabalhos acima do salário mínimo. Empregos de liderança, altamente qualificados e criativos. O estigma não pode ser maior do que as nossas competências e o nosso cérebro", garante o criador.

Na ConConnect, as empresas podem filtrar candidatos com base nas suas sentenças criminais. No entanto, Andre Peart garante estar a trabalhar no sentido de conquistar a confiança das empresas, para que nenhuma informação relativa ao cadastro dos candidatos seja um entrave à ascensão  profissional.

O fundador admite que existem leis restritivas para antigos presidiários, mas acredita que, na maioria dos casos, é o estigma que os impede de conseguir os empregos que desejam.

Mais de três quartos dos reclusos que saem em liberdade são presos novamente dentro de cinco anos, segundo um estudo do Instituto Nacional de Justiça, que data de 2018. Aproximadamente 44% regressam antes do primeiro ano fora da prisão e cerca de 68% dos 405 mil reclusos libertados foram presos por um novo crime no espaço de três anos.

Por isso mesmo, mais do que ampliar a rede de ofertas profissionais para ex-reclusos, Andre Peart avança que quer combater um sistema imperfeito.