Catarina Moreira andava há meses à procura de casa. Assinou todos as newsletters, accionou todos os alertas mas, mas a verdade é que eram poucas as propostas a caírem no email.

Chegou a ter zero resultados quando procurava T0 ou T1 até 550€ e mesmo quando alargou o budget até aos 650€, muitas vezes conseguia apenas duas casas, "e autênticos buracos", conta à MAGG.

De repente, dias depois de o País ter entrado em estado de emergência, começou a receber notificações de que estavam mais casas no mercado. "Fui aos sites aos quais habitualmente ia — Imovirtual, Idealista, Sapo Casa e Expresso Imobiliário — e, em vez das dez casas que costumavam aparecer, agora eram mais de cinquenta".

Ainda chegou a enviar emails a algumas, até que rapidamente percebeu que todas aquelas casas estavam disponíveis apenas por alguns meses.

"Contratos de 3 até 6 meses", "contrato até outubro", "arrendamento máximo a um ano e mínimo de 3 meses", "este imóvel está disponível para arrendamento por períodos de um mês, renováveis". São estas algumas das mensagens que os proprietários ou as agências imobiliárias deixam na descrição dos apartamentos. E porquê? Porque estas eram casas habitualmente usadas para alojamento local (AL) mas que agora, à falta de turistas, voltaram ao mercado de arrendamento tradicional.

Fizemos o teste e telefonamos para saber mais informações sobre um T1 na Rua de São Marçal a 600€. Tinha como indicação que o arrendamento seria de 9 meses, de maio a fevereiro, e que tinha sido retirado do alojamento local.

"É possível arrendar por mais tempo?", arriscamos. "À partida não. Os proprietários têm a expectativa de que brevemente as coisas vão voltar ao normal", explica-nos Clara Ferreira Marques, agente imobiliária da World Land Real Estate.

No entanto, a agente imobiliária não acredita que o turismo volte a ser fonte de rendimento este ano. "O clima é de incerteza total e penso que só quando houver uma vacina é que tudo voltará ao normal", diz à MAGG.

Aproveitamento dos locais ou reeinventar-se em tempos de crise?

Clara Ferreira Marques considera que esta mudança de estratégia dos proprietários não é mais do que uma necessidade de reeinventar a fonte de rendimento.

"Muitas pessoas começaram a viver do alojamento local e alguns deles estão endividados com a compra de imóveis e precisam de ter fonte de rendimento", refere. E, ainda assim, sabem que vão perder dinheiro. "Esta casa, por exemplo, agora está a 600€ por mês, mas facilmente era arrendada a 100€ ao dia quando estava no mercado de alojamento local".

Só na empresa na qual trabalha, estão cerca de 15 casas na situação de contrato, mas limitado no tempo. Mas, no geral, acredita que atualmente 90% das casas disponíveis em Lisboa são de antigas situações de alojamento local.

Esta é uma situação que Romão Lavadinho, presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses, esperava que um dia viesse a acontecer.

Mas, ao contrário dos agentes imobiliários, não vê isto como uma reinvenção do mercado. "É oportunismo", refere à MAGG.

O responsável lembra que tudo começou em 2012 quando, em plena crise, as pessoas começaram a arrendar um quarto ou mesmo a casa toda para ter o rendimento que perderam depois dos despedimentos em massa. "Em pouco tempo, ficou fora de controlo. Deixou de ser uma forma de safar uma situação temporária para ser uma fonte de rendimento".

Até ao final do ano passado, a lei ditava que o proprietário que desistisse do alojamento local para o tradicional, teria que pagar ao estado as mais-valias cobradas quando um imóvel deixa de estar afeto ao regime de AL. Mas no novo Orçamento do Estado, ficou decidido que esta regra deixava de abranger quem passe para o mercado do arrendamento de longa duração, ou seja, aqueles que põe o imóvel no “arrendamento tradicional” por, pelo menos, cinco anos consecutivos.

No entanto, os proprietários que vemos pôr as casas no mercado, querem fazê-lo apenas por alguns meses. "Isto é ilegal, mas também é ilegal arrendar uma casa sem contrato de arrendamento e é o que mais se vê por aí".

Romão Lavadinho pede que estes casos sejam denunciados e que os lisboetas não aceitem este tipo de arrendamento de curto prazo. "Daqui a uns meses, voltam a ser expulsos para dar lugar aos turistas", avisa.