Passou um ano desde o início da pandemia, altura em que a equipa do Serviço de Medicina Interna do hospital de Santa Maria, em Lisboa, percebeu que era essencial avançar com uma investigação clínica sobre a forma como o novo coronavírus se manifesta nos doentes com cancaro. O resultado acabou de ser publicado na revista científica "The Oncologist" e revela que os doentes oncológicos produzem anticorpos independentemente da gravidade do cancro.
A investigação contou com 72 pacientes (destes, 19 eram doentes oncológicos e infetados com COVID-19). Entre os pacientes com cancro, mais de metade (57.9%) mostraram uma forte resposta serológica, face a 42.1% que tiveram uma resposta mais fraca. O estudo aponta como motivo para a fraca resposta o facto de os doentes terem sido submetidos a tratamentos de quimioterapia 14 dias antes da infeção.
"O tratamento quimioterápico recente pode estar associado a fracas respostas serológicas entre os doentes com cancro. Os doentes com cancro têm uma resposta de anticorpos mais fraca em comparação com os que não têm cancro", pode ler-se nas conclusões da investigação.
Já Miguel Esperança Martins, interno de oncologia médica a estagiar no Serviço de Medicina Interna que fez parte do estudo, destaca outro resultado revelador. "Em relação à positividade foi o de que, independentemente da capacidade de produção de anticorpos e dos níveis de anticorpos destes doentes, não existiram diferenças na sua evolução clínica, o que é um resultado muito interessante, mas que deve ser interpretado com cautela, atendendo ao facto de termos uma amostra relativamente pequena", disse ao "Diário de Notícias".
O estudo incluiu um espectro de gravidade de doenças oncológicas variado. Foram escolhidos para a investigação "doentes com sintomas ligeiros e com sintomas mais graves", cujas amostras foram recolhidas "em dois momentos diferentes, na altura da admissão e ao fim de sete dias", revela Catarina Mota, especialista em Medicina Interna que ajudou a montar o projeto, ao mesmo jornal. Este método permitiu ter "amostras biológicas de doentes numa fase ligeira da doença e já numa fase gravíssima, porque alguns evoluíram para cuidados intensivos", continua.
A colheita dos dados para o estudo começou a 15 de março de 2020 e foi feita até 17 de junho do mesmo ano, altura em que os dados seguiram para o laboratório da equipa de Marc Veldhoen, coordenador da investigação científica e investigador principal do Laboratório de Regulação do Sistema Imunitário do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM), que trabalhou em colaboração com as equipas médicas portuguesas, que incluíram médicos internos de oncologia e de medicina interna.