A decisão era prevista para as 14h30, mas começou a ser lida alguns minutos depois e demorou mais de duas horas a ser comunicada. O juiz Ivo Rosa, responsável por decidir o novo rumo da Operação Marquês, anunciou esta sexta-feira, 9 de abril, que todas as acusação de corrupção, feitas pelo Ministério Público (MP), foram derrubadas e não seguiram em frente.

Num despacho que contava já com mais de seis mil páginas, a grande dúvida incidia sobre que tipo de caminho tomaria o juiz que sempre foi muito crítico do trabalho do MP na investigação da Operação Marquês. A partir do Campus de Justiça, em Lisboa, na qual estiveram presentes jornalistas, advogados dos arguidos, dois procuradores e o próprio ex-primeiro-ministro, José Sócrates, Ivo Rosa anunciou a decisão instrutória.

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A primeira decisão anunciada passou pela queda dos crimes de falsificação de documentos que eram imputados pelo MP a José Sócrates e Carlos Santos Silva, por erros legais cometidos por Carlos Alexandre que não tinha competências para autorizar a diligência junto do Banco de Portugal.

Isto significa que as escutas do processo Face Oculta não poderão ser usadas como objeto de prova.

"Têm de cair neste momento", explicou Ivo Rosa, por estar em causa uma "violação das regras de competência do tribunal", uma vez que cabia ao Tribunal da Relação de Lisboa, e não ao Tribunal Central de Instrução Criminal, a autorização do levantamento de justiça sobre os documentos em causa.

A queda das acusações de corrupção a José Sócrates

No que toca às acusações que recaíam sobre o ex-primeiro-ministro, Ivo Rosa declarou que caem as acusações de corrupção que envolvem José Sócrates e o Grupo Lena — muito porque o crime já estava prescrito na altura em que os arguidos foram considerados suspeitos e detidos.

"Este crime já estava prescrito por altura da detenção, e da acusação, dos arguidos. A acusação não prima pelo rigor necessário para que, com base nela, se extraim as consequências jurídicas", explicou o juiz.

Foi a primeira acusação corrupção passiva, a envolver José Sócrates, a cair. Quanto ao concurso do TGV, Ivo Rosa é assertivo, desconstruindo a acusação ponto por todo, dizendo que há uma "total falta de prova" de que Sócrates tenha tido interferência. Caem, assim, os crimes de corrupção no TGV e no Parque Escolar, porque, segundo Rosa, "nada resulta que este arguido tenha instrumentalizado os seus poderes", mas também porque nenhuma das testemunhas em casa neste processo diz ter recebido instruções do ex-primeiro-ministro.

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Sobre a relação entre o Grupo Lena e Sócrates, Ivo Rosa garante que "não se mostram os elementos constitutivos da acusação de corrupção" e, por isso, "os arguidos José Sócrates e Carlos Santos Silva não poderiam ser pronunciados pela prática deste crime". Nesse sentido, o juiz considera que o milhão de euros transferidos do Grupo Lena para a empresa de Santos Silva não constituiu um suborno  ao ex-primeiro-ministro.

Ivo Rosa diz que Sócrates não recebeu dinheiro de Salgado

No que toca à acusação de que José Sócrates terá sido corrompido com Ricardo Salgado, Ivo Rosa anunciou que o crime tinha prescrito em 2015 e, portanto, também cai.

Também sobre a relação entre os dois, o juiz fala numa mera "especulação" feita pela acusação, argumentando ainda que o ex-primeiro-ministro não recebeu dinheiro — mais especificamente, 12 milhões de euros — de Ricardo Salgado.

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Por considerar que a acusação não pode presumir que a totalidade do dinheiro de Carlos Santos Silva pertencia, na verdade a Sócrates, foi derrubada mais uma acusação de corrupção que lhe era imputada. De igual forma, também Ricardo Salgado se livra da acusação de corrupção ativa.

Duas horas depois do início da sessão desta sexta-feira no Campus da Justiça, a terceira acusação de corrupção, no âmbito do caso Vale do Lobo, também prescreveu e José Sócrates não será julgado corrupção passiva, anunciou Ivo Rosa.

Assim, José Sócrates será julgado apenas por seis crimes de branqueamento de capitais e de falsificação de documentos. Carlos Santos Silva, amigo de longa data, será julgado pelos meses seis crimes.

José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates, também não vai ser julgado por branqueamento de capitais por considerar que os aquilo que a acusação descreve não constitui crime. Hélder Bataglia será julgado, mas por menos crimes do que aqueles que era acusado — tendo de responder apenas por fraude fiscal. Os restantes oito crimes caem.

Rui Mão de Ferro, acusado de um crime de branqueamento de capitais e quatro de falsificação de documentos, também não vai ser julgado.