João Barbosa, mais conhecido por Numeiro, tem 25 anos e é um dos youtubers mais conhecidos em Portugal. A 22 de dezembro vai estrear-se como lutador de boxe no combate Duel Boxing, frente ao pugilista húngaro Kalin Simeonov, no Campo Pequeno, em Lisboa. Os bilhetes estão à venda.

Depois do youtube, os ringues. Numeiro estreia-se no boxe (e já há primeiro combate marcado)
Depois do youtube, os ringues. Numeiro estreia-se no boxe (e já há primeiro combate marcado)
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O evento foi criado e organizado pelo youtuber, que se tem vindo a preparar há cerca de dois anos para este combate, tendo feito um investimento de "meio milhão de euros" para o fazer acontecer. Em entrevista à MAGG, contou quais são as expectativas para esta luta, se se vê a combater internacionalmente e porque não quis associar marcas ao evento nem ter patrocínios.

Além disso, o Youtube desativou o seu canal, que já contava com 450 mil subscritores, e Numeiro revelou como foi lidar com isso. Ainda, falou sobre os seus objetivos profissionais para o futuro, que podem passar pelo Dubai, e sobre as polémicas em que já esteve envolvido, nomeadamente em 2022, quando foi acusado de participar num alegado esquema de compra e venda de criptomoeda, ou em 2021, em que foi acusado de fraude em apostas desportivas através da sua consultora, Dynasty Bet Consulting, que acabou por encerrar.

No dia 22 de dezembro vai estrear-se como lutador de boxe no combate Duel Boxing. Quais são as expectativas e como se tem preparado?

Esta preparação começou há cerca de dois anos e foi intensificando cada vez mais. À medida que o tempo foi avançando fui percebendo que isto era, cada vez mais, uma possibilidade e chegou a uma altura em que eu pensei: ‘isto não só é uma possibilidade, como eu também vou criar o meu próprio evento’, porque de outra forma estava complicado. Eu estava basicamente a treinar, enquanto me preparava para o possível acontecimento. Como o acontecimento demorou a chegar, decidi ser eu a criá-lo. Foi este o processo. Estou a treinar há cerca de dois anos e há mais ou menos um ano comecei a pensar seriamente na produção deste evento.

As expectativas estão elevadas. Eu estou mesmo a pôr tudo, tudo, tudo o que está ao meu alcance na produção deste evento, tanto a nível de investimento, seja ele monetário ou de tempo. Parei com todas as minhas outras atividades, reduzi tudo a 90% e foquei-me 100% nisto, porque acredito que isto tem um potencial gigantesco não só para o boxe nacional como também para a minha carreira. Eu já tenho o percurso delineado das próximas duas ou três lutas, a estratégia do que eu quero que aconteça. Tendo em conta que é uma coisa muito ambiciosa, eu sei que tenho de ter um impacto gigante agora na primeira edição deste evento.

Foi o Numeiro a trazer para Portugal este evento de competição de alto nível com a chancela da Federação Portuguesa de Boxe, já que a oportunidade de combater nunca surgiu, ao contrário do que tem acontecido com outros youtubers internacionais. Porque é que quis trazer este evento para o País?

Sim. Como toda a gente está ciente, isto está a explodir pelo mundo todo. Trazer o boxe para o mundo digital é uma coisa que ia acontecer aqui [em Portugal], era só uma questão de tempo. Está completamente viral no mundo todo, está a revolucionar o desporto em si e está a trazer uma atenção muito mediática para esta área. Eu percebi e percebo já há alguns anos que as tendências que ocorrem lá fora mais cedo ou mais tarde vão ser adotadas por nós também e adiantei-me. Eu acredito que com isto consigo trazer uma projeção e uma exposição gigante para o boxe a nível nacional, porque nós temos atletas muito bons e muito dotados de altas capacidades, mas que, infelizmente, devido ao cenário que o desporto tem aqui em Portugal, não conseguem ter remuneração sequer para se dedicarem totalmente a isto. É raro o atleta que consegue ser só pugilista. Alguns atletas que eu conheço são muito bons, têm muito potencial e podiam brilhar lá fora, representando Portugal neste desporto, mas não têm capacidade para o fazer, porque não têm patrocínios, não há exposição, visibilidade. Eu acredito que consigo revolucionar muito isto.

Em cima disto, eu tenho uma audiência de centenas de milhares de jovens aqui em Portugal e acredito que eles olham para mim, pelas mensagens que eu leio e pela maneira que eles me seguem, sei que se inspiram muito em mim e tentam fazer aquilo que eu faço, querem ser igual a mim. Se eu puder usar essa influência para os pôr a praticar um desporto que eu acredito que não só tem os benefícios que qualquer desporto tem, como tem outros benefícios extra como a disciplina, a periodicidade com que tem de ser trabalhado um desporto destes e uma habilidade destas. É diferente de qualquer outro desporto. Se eu puder ter esse impacto na comunidade que me segue e que gosta de mim ainda melhor.

Pretende então continuar com estes eventos. Vai continuar a participar nos combates ou vai convidar outros youtubers e pugilistas? E com que frequência se irão realizar?

Basicamente é esta a minha estratégia: eu tenho o segundo e terceiro combates planeados, muito ambiciosos e que eu percebo que vou ter de trabalhar muito. São figuras internacionais 100 vezes maiores do que eu a nível de exposição. É lá que eu pretendo chegar, mas eu percebo que primeiro tenho de fazer uma escadaria e tenho de ir passo a passo. Estes eventos não têm de todo o objetivo de tirar a seriedade do boxe, mas eu entendo perfeitamente que 90% das pessoas que vão assistir a este evento vão ver porque sou eu e não pela modalidade em si. Tendo em conta isto, eu gostava, mas eu não posso simplesmente criar uma gala onde exponho logo oito lutadores amadores ou profissionais em Portugal que tenham muito potencial, porque as pessoas não iam mostrar interesse e não iam gostar.

Eu vou criar esta gala, que se repararem é uma gala artística no geral [com as atuações do comediante Alexandre Santos e do músico Greg Ferreira], não será só de desporto, e vou puxar o entretenimento em primeiro lugar e, lentamente, edição após edição, introduzir o boxe. As pessoas têm de ganhar o gosto primeiro, têm de ver quem elas gostam a lutar para depois gostarem do desporto em si e poderem dar visibilidade, assistir e acompanhar este desporto em Portugal.

Também depende da dimensão do evento. Nós começámos agora com um recinto com capacidade até 9 mil pessoas e eu pretendo continuar a escalar a nível de investimento, de exposição, a nível de recinto. Dependendo do quão ambiciosa será a próxima edição, poderá ser uma coisa que acontece duas vezes num ano ou quatro vezes num ano. Certamente que é uma coisa que se vai repetir e que vai continuar a acontecer sem sombra de dúvidas.

Que outros nomes de youtubers portugueses ou internacionais poderemos ver a combater? Os eventos podem estender-se ao sexo feminino?

Como expliquei há bocado, este evento, para chamar a atenção, tem de ser 50% de entretenimento, que é o que as pessoas gostam, e 50% daquilo que é benéfico nós promovermos: o desporto, o boxe e essas causas mais nobres em geral. Lá está, uma tem de estar aliada à outra para gerar interesse nas pessoas, senão não funciona. Por alguma razão o boxe em Portugal não tem muito andamento, as pessoas não se entretêm a ver isso. A nível de pessoas mediáticas da Internet e não só youtubers, porque eu não quero restringir isto só a youtubers, e de nomes para gerar interesse, é um tema que é sensível ao tempo. Eu vou pegar nas celebridades ou nas figuras públicas que se enquadrem nessa fase do evento que eu esteja a produzir.

Vamos supor que existe um desacato qualquer entre duas pessoas bastante conhecidas. O meu objetivo, e eu sei que isso gera uma audiência gigante, dispara as vendas quando existe este atrito, é uma coisa humana, é tentar conciliar isso com uma resolução de problemas amigável dentro do ringue. Vai gerar bastante audiência, é uma fórmula testada e comprovada, não estou a inventar agora, estou só a trabalhar com as cartas que eu tenho. A nível profissional, existem alguns atletas aqui muito bons que eu gostava de ter presentes. Lá está, primeiro [tenho de] trabalhá-los a nível de exposição, de passarem mais tempo comigo para lhes dar mais visibilidade e começar a construir essa parte de redes sociais e imagem deles até sentir que eles estão prontos e que têm mediatismo suficiente para os colocar num cartaz assim.

Se não conseguir construir essa plataforma para eles não me importo de a dar na mesma, mas acredito que se consegue fazer de uma maneira orgânica, inicialmente, de forma a que as pessoas, na altura em que chegar essa gala, possam ver esse atleta porque já o conhecem, já o viram comigo, no meu Instagram, nos meus vídeos do Youtube, já o viram num documentário meu. Assim já têm interesse pela pessoa em si e acredito que isso é mais respeitoso para a pessoa. Há uma coisa que acontece lá fora e não gostava nada que acontecesse nos meus eventos que é: temos seis lutas alinhadas durante uma noite, das 19 horas à meia-noite, e as pessoas aparecem todas às 22 horas, porque só querem ver as últimas duas lutas. Eu acredito que isso é uma grande falta de respeito para com o atleta, mas a culpa não é do atleta nem do público, é de quem faz a organização destes eventos e não tem a cautela suficiente para perceber como dar a volta a isto e como agilizar uma coisa mais respeitosa para todo o elenco desse evento.

Podem estender-se ao sexo feminino, claro que sim. É uma coisa em que podemos englobar todas as idades ou sexos se for vantajoso para o boxe e para o desporto. Acredito que o desporto é vantajoso tanto para homens como para mulher, por isso não vejo qualquer obstáculo nesse sentido.

Vê-se a combater internacionalmente?

Sim, como eu disse já tenho um plano mais ou menos estruturado. Se eu for muito ambicioso, a minha segunda luta ou, se eu for um bocado mais cauteloso, a terceira luta que eu tenho em mente é contra uma superestrela internacional, das pessoas mais conhecidas no mundo do entretenimento a nível mundial. Já tive algumas conversações com a parte da equipa que faz o management [“a gestão” em português] desta pessoa em específico e há interesse da outra parte. Estávamos em conversações e eu, por vontade própria, decidi pará-las, porque não tinha a certeza de qual iria ser o desfecho e pensei, há seis meses atrás: ‘ora bem, eu neste momento estou a negociar sem moral nenhuma. Se eu criar um evento megalómano e depois entregar as provas, aqui já tenho outra capacidade de negociação, tanto a nível de fazer acontecer como a nível de termos e condições, percentagens, vou com outro peito para esta conversação com estas pessoas’. Ia ser uma coisa internacional.

Eu gostava muito de dar mais detalhes e estou a tentar não tropeçar, porque se eu disser duas ou três palavras as pessoas vão chegar a quem me refiro facilmente, mas tenho esse sonho e acredito que vai acontecer. Se não for pela exposição e pela criação de eventos que estou a fazer, tenho sempre uma segunda alternativa que é pela qualidade do boxe. Idealmente focar-me-ei nas duas, mas vou tentar fazer o possível para que aconteça de uma maneira ou de outra.

"Tenho este perfil em que gosto de arriscar, mesmo de forma às vezes quase estúpida"

Revelou no seu Instagram que fez um grande investimento para criar este evento, de meio milhão de euros, e que não quer associar “qualquer marca” ou patrocinador? Porquê?

Normalmente quando uma pessoa faz um negócio tem a clara intenção de reaver algum dinheiro e lucrar claramente. Eu não sou diferente, mas a minha estratégia aqui está mais definida no longo prazo. Eu estou a investir muito neste evento e não é propriamente para ganhar muito com este evento, mas para ter um projeto que possa apresentar a pessoas do futuro. Neste caso, eu fiz isto sozinho, sem equipa, sem ninguém, produzi este evento gigante com tudo o que vocês possam imaginar, com todos os detalhes limados na perfeição e fi-lo com um atleta que ninguém conhece, sem exposição nenhuma, que me foi cedido por um match maker, eu não fiz nada de especial. Imaginem o que eu faria se fosse com outra celebridade, de Portugal, dos Estados Unidos, do Brasil...

O investimento que eu estou a fazer não é para reaver já neste momento e eu até posso salientar um fator importante: há pessoal que ainda não percebe como é que o investimento pode chegar a esse valor, mas ainda não está revelado tudo acerca deste evento. Vou aqui a falar pela primeira vez em público: no início de dezembro tenho uma coisa que vai chocar completamente. Eu tenho todo um time stamp cronológico das ações que eu quero fazer. Quando fiz o giveaway do carro sabia que no dia a seguir ia anunciar os bilhetes e ia usar isso para impulsionar, sabia que na semana a seguir ia estar a fazer entrevistas a rádios, televisões e revistas, a seguir a essa tenho os convites a sair para os influencers todos que vão continuar a divulgação, tenho tudo isto planeado até ao dia anterior do combate, em que é a conferência de imprensa e que também tenho alguns truques na manga planeados para gerar ainda mais exposição e mediatismo.

Mas pronto, não posso revelar já tudo, porque senão ia perder a piada, mas esse investimento vai fazer sentido à medida que eu for revelando tudo aquilo que planeei. Para já ainda parece um número um bocado fora da verdade, porque ainda não está tudo cá fora, mas com o tempo as pessoas vão perceber. Acredito que vai correr bem, se não quem está lixado sou eu.

Tenho este perfil em que gosto de arriscar, mesmo de forma às vezes quase estúpida. Os meus amigos estão a tentar meter-me a mão na cabeça, tipo: ‘Numeiro, o que é que estás a fazer? Numeiro, tem cuidado’. Na primeira vez que eu tomei este tipo de risco foi quando trabalhava numa fábrica e me despedi para começar a fazer vídeos. Não tinha dinheiro, não sabia o que ia fazer, não tinha por onde pegar, mas tive um instinto em que tinha de me despedir, pegar nos 600€ que tinha de lado, comprar uma câmara e um micro e começar a gravar vídeos. E correu bem, por isso a partir desse dia ganhei mais respeito pelo meu instinto e ouço-o mais a ele do que às vezes à minha lógica ou à dos que me rodeiam.

De onde vem esta “paixão antiga” pelo boxe?

Eu sempre tive um grande respeito pelas artes marciais em si, sempre tive um grande respeito por quem as praticava e por qualquer atividade, não só artes marciais, que envolvesse muita disciplina. Eu tive interesse, como já referi em vários sítios, em ir para as Forças Armadas. É mais o gosto que estas atividades envolvem e não pela atividade em si, o gosto pela atividade em si veio mais tarde com a prática e com o tornar esta prática numa rotina. Mas o gosto a sério desenvolveu-se há dois anos e tem vindo a desenvolver-se cada vez mais, cada vez que treino gosto mais ainda de treinar, e espero que continue assim no futuro.

O Numeiro é um dos youtubers portugueses mais conhecidos, contando com 536 mil seguidores no Instagram e 450 mil subscritores no seu canal de Youtube, canal este que foi desativado pela plataforma. O que aconteceu e como é, de repente, ficar sem ele, sem os subscritores e sem os vídeos lá publicados?

Nós estávamos a gravar vídeos todos os dias, eu lancei mais vídeos este ano do que em todos os anos como youtuber. Nós fomos para o Dubai e estávamos num parque aquático, onde gravámos vídeo, e eu tive a infeliz ideia, porque não sabia que ia contra os termos e condições do Youtube, de fazer isto [simula um apalpão] na mama da miúda que estava comigo. Então o Youtube decidiu que aquilo tinha natureza sexual. Não tinha nada de mal, foi uma brincadeira num escorrega, foi uma coisa de meio segundo e nem foi algo explícito em câmara. Eu não tinha onde agarrar a boia, então fiz isso. Achei que ia ser engraçado, mas o Youtube não achou a mesma coisa. Eles deram-me um aviso para eu não repetir isto, só que depois houve um erro da nossa parte, na edição, em que nós íamos reaproveitar esse vídeo sem essa parte. Também houve falha minha de não rever o vídeo antes de o meter no ar e ele foi outra vez com esse excerto. Foi por um pequeno erro. O canal também já estava flagged [“sinalizado” em português] no máximo e depois recebi um e-mail a dizer que o canal ia ser terminado, ainda tentei por todos os meios reavê-lo, com contactos, telefonemas, os meios tradicionais de enviar para o suporte, mas não tive sorte.

Fiquei muito mal. Foi estranho, porque eu fiquei no fundo de um poço durante uma semana, mas depois do dia para a noite digeri a ideia e nunca mais olhei para trás. Até há pessoal que me pergunta se eu continuo a tentar recuperar o canal de Youtube, mas simplesmente a minha vida está a um passo tão rápido que eu não tenho tempo de olhar para trás. Aconteceu o que aconteceu, criei um canal novo, já está praticamente com 50 mil subscritores e ainda só meti lá três vídeos, que estão com as mesmas visualizações, porque as pessoas quando veem o vídeo lá nos sugeridos sabem que é meu e veem na mesma. Felizmente estou protegido por esse interesse das pessoas. Eu voluntariamente já tinha decidido parar com os vídeos quando começasse o meu estágio no campo de treinos para o combate, porque não conseguia fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Então decidi: ‘três meses antes do combate eu vou só treinar de manhã até à noite para me preparar o máximo possível e vou parar de fazer vídeos’. Não é que no dia em que eu começo o estágio de treino acordo às 7 horas com o e-mail a dizer que o meu canal foi apagado? Eu até fiquei sem palavras. No dia em que eu voluntariamente disse que ia parar de fazer vídeos o meu canal foi apagado. Fiquei mesmo muito mal, foi triste e foi uma semana muito cinzenta, não conseguia dormir, acordava com pesadelos a meio da noite. Isto aliado a treinos intensivos é muito complicado. Uma pessoa que não consegue descansar no dia seguinte não consegue treinar, não está focado. Quanto maior a frequência com que estas coisas acontecem na vida, mais uma pessoa ganha capacidade de as digerir. Eu acredito que foi isso que aconteceu para eu, magicamente, depois de uma semana, conseguir dormir bem.

Quando criou o seu canal e começou a publicar vídeos alguma vez pensou que um dia iria fazer disso vida?

Pensei e acreditava que podia fazer uma vida profissional disto, senão não me tinha despedido, mas nunca pensei que pudesse chegar ao patamar em que as coisas se encontram hoje. Nunca pensei, sempre fui muito ambicioso, tinha objetivos que partilhava com a minha família quando tinha 18/19 anos, em que eles diziam que eu era completamente maluco, e objetivos que eu queria atingir quando tivesse 30 anos e que acabei por atingir aos 21. Fiquei sem palavras, fiquei perplexo, mas muito contente e feliz. A pressão continua, a vontade de fazer mais. Eu achava que chegava a um certo ponto e pensava: ‘ok, agora posso aproveitar um bocadinho a vida’, mas tenho sempre este bichinho na cabeça de fazer a próxima coisa e de me querer superar face ao ano passado ou ao mês passado ou ao dia de ontem. Se for controlado, acaba até por ser saudável, dá-nos uma razão para viver.

Recentemente viveu com outros youtubers, Windoh, Tiago Paiva e Imauppa, numa mansão em Lisboa. Quais são os principais objetivos destas casas? E os maiores contras?

É uma fórmula comprovada, mais uma vez, que as pessoas criam mais interesse num grupo, numa comunidade, do que numa pessoa só, não só por sentirem que fazem parte, mas também porque são personalidades diferentes e podem identificar-se mais com umas do que com outras. O objetivo principal aqui é aumentar os números de todos em simultâneo. Há trocas de público e há o nascimento de conteúdos espontâneos que não aconteceriam caso as pessoas estivessem a criar conteúdos sozinhos. Estes são os prós. Ao conviver com pessoas do mesmo meio de trabalho vai trocar ideias, vai poder pedir opiniões e vai poder crescer mais rapidamente dentro da área. Este é outros dos prós associados além da exposição.

De contras, quando passamos muito tempo com uma pessoa, gostamos mais das coisas que gostamos sobre elas, mas as coisas que nos irritam mais ao fim de um certo tempo de convivência são complicadas, seja com um irmão, às vezes com os pais ou com um amigo. São pessoas com idades diferentes, gostos diferentes. Partilhamos uma profissão, mas por vezes o resto não tem nada a ver. É um contra quase inexistente, porque se não fosse este o caso nem teríamos estas ideias nem o teríamos feito dez vezes como fizemos. Já morámos em montes de casas com pessoas diferentes e já temos planos para o fazer novamente no futuro. É uma coisa muito boa, muito vantajosa e acredito também que o público goste muito de ver.

"Eu adoro Portugal mas há muitos fatores que não deixam os jovens em geral crescerem"

Nas suas redes sociais, o Numeiro exibe um estilo de vida luxuoso, a nível de casas, carros, viagens. A ostentação atrai o público?
Certamente atrai, da mesma maneira que eu me atraio por pessoas que vivem o estilo de vida que eu quero viver. Eu vivo um estilo de vida bom, mas há pessoas que vivem dez ou cem vezes melhor, e são essas pessoas que eu sigo para me motivar, para ganhar inspiração e, sobretudo, para aprender como fazer. Eu acredito que se for apenas uma ostentação oca e só para se sentir superior aos outros não tem nenhum conteúdo, mas para inspirar e para dar motivação acredito que é uma coisa sempre nobre. Para além do mais, existem muitos casos que o fazem, que não é o meu, mas para mim acaba por ser o meu estilo de vida, eu não faço nada fora do comum da minha vida para ostentar. A minha casa é a minha casa, o meu carro é o meu carro, as viagens que eu faço são as viagens que faço. A minha profissão implica que eu grave tudo.

Eu sei que há pessoas que se ofendem um bocado com isto, mas é o meu estilo de vida e eu só o gravo. Agora sou contra também pessoas que fingem ou mentem sobre um estilo de vida que não têm para os fins que elas bem entendam, não acho isso genuíno e eu sou muito contra qualquer coisa que não ache genuíno. Aliás, isso é a base dos meus vídeos. Eu acordo de manhã, começo a gravar, as pessoas sabem quem é a minha mãe, o meu pai, que eu sou alérgico a nozes, sabem o meu número de calçado, sabem tudo sobre a minha vida. Não há filtros, não há de todo este cuidado. Eu tenho vídeos no Youtube a fazer todo o tipo de caras, não tenho a preocupação de estar feio nem bonito.

Recentemente esteve no Dubai e falou num vídeo sobre a possibilidade de comprar lá uma casa. O seu futuro pessoal e profissional passa por viver ou investir nesse país?

Acredito que sim. Eu adoro Portugal, adoro as pessoas, o clima, a gastronomia, mas há muitos fatores em Portugal que não deixam um jovem e os jovens em geral crescerem. Há muitos fatores que condicionam o sucesso jovem, que impossibilitam que as pessoas mais ambiciosas consigam “voar”. O Dubai oferece muitas oportunidades a esse nível. Eu vou para lá contra a minha vontade pessoal e a favor da minha vontade profissional, é a melhor maneira que eu tenho de explicar isto. Há mais mentes lá, pessoal do mundo todo que têm mais sucesso nas áreas que me interessam e que me interessam conhecer para continuar a expandir os meus negócios e a minha imagem estão lá presentes, cada vez mais se mudam para lá, e quem não se adapta morre e eu percebi isso desde muito cedo. É por isso que eu tenho que fazer isso, não por vontade pessoal, mas por vontade profissional.

Quais são os seus objetivos profissionais futuros?

Um dos meus maiores objetivos, agora que peguei nisto a 100%, é continuar a evoluir o panorama nacional do boxe e, consequentemente, a minha qualidade tanto a nível de produção dos eventos como de técnica a jogar boxe. Outros objetivos profissionais que tenho são, neste momento, continuar a aumentar a infraestrutura de pessoas que tenho à minha volta e abrir negócios nas áreas em que possa meter os meus pais responsáveis por esses negócios. Eu trabalho muito com o digital e os meus pais já têm alguma idade e não se adaptariam bem nesta área. Há algumas coisas que eles não dominam, por exemplo o meu pai começou a usar um smartphone há poucos meses e, apesar da minha mãe estar um bocadinho mais avançada, também não é muito a área dela. Eu gostava de criar negócios, nomeadamente na área do imobiliário.

Eu já tenho vários investimentos, mas gostava de expandir, criar projetos maiores, de forma a que eu possa dar uma ocupação aos meus pais e que seja mais saudável. Eles já são pessoas com uma certa idade, eu sei que eles não querem parar de trabalhar, porque senão já podia ter tratado disso, mas eu sei que há outras áreas que eles gostam mais. Neste momento eles trabalham na têxtil e, por mais que eles me digam que estão bem, eu sei que é só para me tirarem as preocupações de cima. Eu sei que eles seriam mais felizes a trabalhar noutras áreas e, se eu puder criar outro negócio nessas áreas, nem que seja só para eles se divertirem, poderem desfrutar mais da vida, ganhar mais dinheiro e ter mais tempo livre, eu gostava de o fazer. É esse um dos meus maiores objetivos.

"Assim como há pessoas que gostam muito de mim, há pessoas que me odeiam"

Também não se inibe de dar as suas opiniões, muitas vezes polémicas, face a vários assuntos, como a identidade de género, inclusive esteve recentemente no podcast “Trava Paiva que é a descer”, do Tiago Paiva, onde proferiu algumas delas. Estas opiniões são as do João Barbosa, do Numeiro ou dos dois? Há muita gente que tem essa dúvida.

Eu não sou de ter duas personalidades diferentes, sou muito real com aquilo que acho e penso e não seria capaz de criar uma persona para defender a minha imagem ou a minha vida profissional. Não iria ficar tranquilo à noite nem ficaria bem comigo próprio se estivesse a defender as teorias, que às vezes até são as defendidas pela maioria, e não fosse genuíno. Eu transpareço tudo cá para fora e gravo os meus dias de manhã à noite. Se eu algum dia tentasse defender uma ideia, tese ou teoria que não fosse minha, mais cedo ou mais tarde, num vídeo qualquer, sem querer, iria sair a verdade para fora. Eu sempre fui muito do contra desde miúdo, mas nunca me inibi de expressar as minhas opiniões.

O facto de expor essas opiniões faz com que muitos o critiquem e até o considerem machista ou homofóbico.

Claro que sim. Eu compreendo esses rótulos, mas acredito que são rótulos preguiçosos de pessoas que não estão dispostas a explorar mais um tema, que não estão dispostas ao debate ou à troca de ideias. Se nós quisermos parar um discurso, deixar um discurso a meio, a maneira mais fácil é estampar um rótulo e acabar com a conversa. Se nós dedicarmos tempo, se tivermos interesse e curiosidade em saber não só a opinião da pessoa, mas o que é que faz a pessoa a pensar assim, não só temos um ponto de vista diferente, como enriquecemos a nível de debate, a nível argumentativo e de conhecimento em geral.

Como lida com as críticas que recebe? E o seu núcleo mais próximo, como a família e os amigos?

A nível de pessoas à minha volta não tenho problema nenhum, porque já sabem as minhas opiniões e já sabiam como sou muito antes delas serem públicas. Quem está à minha volta já sabe bem como sou. No que toca à parte da Internet, eu percebo e tenho consciência que isto vai sempre dividir os grupos. Assim como há pessoas que gostam muito de mim, há pessoas que me odeiam. Eu percebo que ao expressar uma opinião firme, seja ela contra ou a favor de algum tema, vai ter sempre muitas pessoas que gostam e que odeiam. Eu acredito que quem não tem inimigos acaba a ser inimigo de si próprio, ou seja, quem se dá bem com toda a gente é porque está a esconder alguma coisa. Eu prefiro uma pessoa que tenha um ponto de vista exatamente oposto do meu do que uma pessoa que diga: ‘opah, não sei bem, fico ali no meio’.

As críticas não me afetam em si. Não vou mentir, há alturas em que solto algumas coisas cá para fora porque sei que vão criar o caos. Se for uma coisa que eu sei que vai gerar polémica, mas que, ao mesmo tempo, é inofensiva, não tenho problemas em soltar e fico a rir-me a ver as respostas. Às vezes vejo as pessoas muito chateadas e entretenho-me um bocadinho também.

O Numeiro já se viu envolvido em algumas polémicas, nomeadamente em 2022, quando foi acusado de participar num alegado esquema de compra e venda de criptomoedas (Bitcoin), ou em 2021, que foi acusado de fraude em apostas desportivas através da sua consultora que acabou por encerrar. Que impacto é que estes escândalos tiveram para si e de que forma influenciaram a sua imagem?

Honestamente, tiveram mais impacto na imagem pública do que em mim. Isto já se passou há cerca de dois anos e meio e, quando estas coisas acontecem, as notícias saem cá para fora a toda a velocidade e com uma palavrazinha que faz a diferença toda, que é o “alegadamente”. Qual é o problema? É que passado dois anos e meio e depois de serem abertos os supostos inquéritos de investigações e não haver nada a apontar, não voltam a sair notícias a dizer que o “alegadamente” estava errado e a dizer que não há nada a apontar. E, de facto, não havia nem nunca houve. Foi feito grande escândalo também porque outras pessoas estavam envolvidas, mas isso não me diz respeito, e uma coisa alimentou a outra. No que diz respeito a mim, era literalmente um grupo onde se dava palpites de apostas desportivas e eu cobrava a mensalidade que eu entendia, as pessoas pagavam a mensalidade que eu cobrava, os resultados foram bons numas alturas e maus nas outras. Quando foram bons as pessoas ficaram contentes, quando foram maus pronunciaram-se e era isto, era aquilo, era tudo.

A nível pessoal, tocou-me no aspeto em que eu percebi que, mesmo não havendo nada de mau ou maléfico acerca de um negócio destes, é preciso ter cuidado quando existe uma opinião pública muito grande. Uma coisa é certa: se formos à Internet encontramos 20 mil grupos de palpites de apostas de futebol num dia. Qual é o problema e que foi o meu erro em não analisar isto? É que nenhum desses grupos tem por trás uma pessoa que tenha alguma atenção no mundo digital. E não é só a atenção, este é que é um fator importante. Se fosse tudo feito da mesma forma, mas eu não tivesse o estilo de vida que tenho, ninguém queria saber. Ninguém queria saber se não houvesse um estilo de vida associado. Eu percebo que este estilo de vida motiva umas pessoas, mas irrita outras e faz comichão a outras pessoas.

Nos meus primeiros dois/três anos de Youtube, eu sempre fui uma das pessoas mais adoradas da Internet, literalmente, até o meu trabalho dar frutos e eu começar a gerar alguma receita deste meu trabalho. A partir deste momento, foi a primeira vez na vida em que eu comecei a sentir as pessoas a olhar-me de lado e com opiniões negativas. Até aí era o Numeiro que fazia vídeos na rua, vídeos de rir, toda a gente adorava, toda a gente gostava muito de mim, era o maior e ia a todo o lado. A partir do momento em que existiu algum fruto deste trabalho e esse fruto se traduziu em bens e em coisas do género notei logo uma mudança de atitude. Pensei que isto pudesse ser um problema meu, da maneira como apresentei as coisas ao público ou da maneira como falei, mas já vi este caso a acontecer com outros amigos meus, que trabalharam muitos anos e que se calhar ao fim de dez anos tiveram sucesso e puderam comprar o carro de sonho deles, e a partir daí caiu-lhes tudo em cima.

Obviamente que quanto maior for a exposição do estilo de vida maiores são estas críticas. Se isso for uma parte necessária para continuar a ter a vida que eu sempre quis e ambicionei, cá estou para levar com essa parte também. Acho que é um bocado ingénuo... não é ingénuo, mas é um bocado imaturo nós acharmos que podemos ter tudo aquilo que sempre quisemos na vida sem levar com algumas partes más ou com alguns testes. Se eu percebo que fui abençoado com aquilo que sempre quis e que continuo a alcançar os objetivos que eu sempre quis, isso não pode vir de forma fácil. São estas pequenas barreiras, estes pequenos obstáculos, que às vezes me põem à prova e que me fazem provar que eu mereço mesmo. Se eu me deixasse cair nestas críticas e nestes obstáculos, que são recorrentes, era uma prova de que eu não era feito para estar aqui. Se alguns caíram pelo caminho, pronto, está tudo dito.

Claro que estas polémicas têm um impacto que é difícil, às vezes, de mostrar o contrário. Só com o tempo e com as ações que uma pessoa vai fazendo. Teve algum dano [na imagem pública], mas quem me conhece e quem gosta de mim é realmente quem mais me importa. Eu sou uma pessoa um bocado diferente, dizem sempre que vou dividir opiniões. Já lutei muito contra isso, já passei muitas noites sem dormir, certamente, já deixei que isto entrasse mais na minha cabeça, mas hoje em dia percebo que são ossos do ofício.