Ricardo Pereira, 44 anos, é um ator e apresentador português que é estrela de novelas no Brasil mas também protagonista da série espanhola "Eva & Nicole", onde dá vida a Omar, que será lançada a 2 de junho na plataforma de streaming Atresplayer e, posteriormente, em horário nobre na Antena 3 TV.

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Há 24 anos, tornou-se o primeiro protagonista estrangeiro numa novela da Globo, em “Como uma Onda”, que marcou o início da sua carreira internacional e da sua vida no Brasil. Desde então, já integrou o elenco de "Deus Salve o Rei", "Éramos Seis" e o vilão de "Cara e Coragem". Em Portugal, o seu último protagonista foi Romeu Santiago, um cantor de música popular na novela "Amor Amor", na SIC.

À MAGG, conta quais são as maiores diferenças enquanto ator de produções brasileiras e portuguesas e entre ser uma figura pública em Portugal e no Brasil. Ainda, revela o que se pode esperar sobre o cargo de produtor criativo da Netflix, função que assumiu em 2023.

Ricardo Pereira tem três filhos, Vicente, 12, Francisca, 10, e Julieta, 6 anos, fruto do casamento com Francisca Pereira, juntos há mais de 17 anos. À MAGG, revela como é conciliar o facto de ser um workaholic com a família.

Leia a entrevista.

Em março, esteve no Festival de Cinema de Málaga, onde foi apresentada a série espanhola “Eva & Nicole”, da qual é protagonista. O que nos pode adiantar sobre a sua personagem e sobre este projeto?
A série foi apresentada no Festival de Málaga, que é já desde há muito tempo o grande lugar onde as séries espanholas fazem as suas apresentações, o conceito da série, o processo das filmagens, atores que entram, as histórias, e é o lugar onde encontramos o que é que vai ser, digamos, as grandes apresentações e as grandes estreias do ano. “Eva & Nicole” é uma série que rodámos no ano passado durante cinco meses entre Madrid, Sevilha e Marbella. A história é ambientada em Marbella nos anos 80 para 90, quando as primeiras discotecas começaram a surgir e Marbella se tornou completamente no núcleo central, onde circulavam estrelas internacionais de cinema, pessoas que eram conhecidas do jet set internacional. Na pesquisa que nós fomos fazendo ao longo do processo da série, digamos que foi um dos primeiros lugares onde se encontravam estas pessoas e onde se uniam para celebrar e viver a vida, entre festas, apresentações artísticas, culturais, muita envolvência da noite. Fala um bocadinho deste surgimento de Marbella como esse ponto central do encontro de grandes figuras muito conhecidas mundialmente: desportistas, realizadores de cinema, atores, figuras das casas reais de vários países.

A série está ambientada muito nessas histórias que se foram cruzando, as rivalidades que surgiam. Paralelamente às noites, às festas e encontros culturais, havia também a criação de muitos negócios paralelos e a série aborda, de uma forma obviamente dramatúrgica e ficcionada, o tráfico de joias, diamantes, armas, o poder que vem de um mundo paralelo. A história é abordada muito entre duas personagens e eu sou um dos protagonistas. Eu sou quase um irmão de sangue da personagem que é interpretada pela Hiba Abouk, que faz a Eva, porque crescemos juntos, vivemos juntos em França e em França ela tem uma rivalidade com uma outra mulher que acaba por condicionar a vida dela para sempre. A história é, sem dúvida, alicerçada entre pilares da rivalidade, da concorrência e de um submundo que corre com várias histórias paralelas.

O meu personagem chama-se Omar, sou o grande irmão desta Eva, temos uma grande rivalidade com a personagem da Nicole, que é a Belén Rueda que faz e é uma atriz extraordinária, porque ela no passado acabou por condicionar as nossas vidas. Nós vimos mesmo com o apelo de abrir uma discoteca e acalmar as nossas vidas depois de termos passado por muito. Temos finalmente o poderio económico para nos estabelecermos, fazermos e criarmos uma discoteca, porque ambos no passado trabalhámos na noite e tínhamos o sonho de ter a nossa discoteca e, de certa forma, fazer uma concorrência à grande discoteca que já existia da qual a Nicole é a dona. Só que, como em todas as histórias na vida, aparecem outros lugares que nos levam a repensar naquilo que, de verdade, fomos fazer e, normalmente, o que tem grande força sempre é o amor e o amor aparece de uma forma muito intensa tanto na vida dela [da Eva] como na minha, o que acaba por condicionar todo o nosso trajeto.

O Omar era um homem completamente determinado, marcado pela vida, com um passado muito marcado, porque teve uma orientação sexual que na sua vida não o permitia viver na sua plenitude, então ele acaba por poder viver na sua plenitude ali. O Omar tem um arco dramático brutal. Ao mesmo tempo que se vê um homem super militar, porque foi militar durante muito tempo, muito observador, frio e calculista, também se vê ele a construir uma história de amor com uma outra pessoa muito bonita, sincera e, ao mesmo tempo, quase muito inocente, porque não sabia que era possível conseguir apaixonar-se tanto assim. É uma série que eu acredito que vai funcionar super bem em Espanha. Foi feita para a Antena 3, que é o canal de mais audiência em Espanha, e também para o streaming deles, que é o Atresplayer. Deverá ser lançada este ano, isso já foi falado e afirmado.

Há 24 anos, tornou-se o primeiro protagonista estrangeiro numa novela da Globo, na “Como uma Onda”, que marcou o início da sua carreira internacional e da sua vida no Brasil. Que balanço faz destes anos?
Eu acho que a maturidade nos vai dando um olhar muito interessante sobre aquilo que nós fizemos por várias razões. Quando olho para a minha carreira, eu tive a oportunidade de estar e trabalhar como ator e em várias linguagens diferentes, tanto no teatro, como no cinema, como ator de dramaturgias longas, neste caso de novelas, como ator de dramaturgias curtas, como no caso das séries, e tenho passado pelas mãos de tanta gente, de tantos realizadores, de tantos autores, tenho trabalhado com tantos colegas brilhantes. É engraçado, porque eu tenho revisitado o passado nestes últimos tempos, porque acho que a maturidade faz isso, até mesmo para entenderes o que fizeste e como o fizeste. Eu acredito sempre que no nosso percurso, e 24 anos já são bastantes anos, nós entregamo-nos sempre na nossa totalidade, mas em cada momento temos determinadas ferramentas e experiências de vida. Isso, naturalmente, tem uma influência muito grande no trabalho que apresentas e é giro olhar para trás e perceber o trajeto e o caminho, como encaraste determinado desafio e personagem, como a fizeste e como é que estás hoje, as ferramentas que tens hoje para encarar os desafios.

Passou demasiado rápido e eu sinto-me um privilegiado, porque de facto tive a oportunidade de navegar em várias formas e exercitar várias formas de linguagem na minha profissão e, quando revisito o passado e olho para o meu presente, sinto que tenho tanta coisa ainda por fazer, tanta coisa que ainda não fiz, tanta gente que eu admiro e com quem ainda não tive a oportunidade de trabalhar. Tenho vivido experiências incríveis, mas sinto que hoje também estou mais disponível e tenho ainda mais vontade e determinação para querer fazer coisas mais diferentes. Tudo o que seja fora da caixa e mais desafiante é aquilo que me prende, é o que me apaixona. Quando me convidam para fazer uma série, um filme ou uma peça de teatro, a primeira coisa que eu quero é ler o texto e perceber em que ponto é que aquele personagem me vai conseguir desafiar, surpreender e levar-me a um lugar onde eu ainda não estive. São 24 anos de muitas realizações, diria que um caminho espetacular, com muitos acertos, mas também com muitos erros, eu acho que isso faz parte da trajetória de todos nós, e muito disponível para receber novos projetos e trabalhar com novas pessoas.

Ricardo Pereira
Ricardo Pereira Ricardo Pereira na novela brasileira "Como Uma Onda". créditos: Globo

Desde então, já integrou o elenco de várias novelas brasileiras, como “Prova de Amor” e “Cara e Coragem”, e portuguesas, como "Alma e Coração" e "Amor Amor". Quais considera ser as principais diferenças enquanto ator de produções brasileiras e portuguesas?
Eu tenho um grande carinho, e eu já fiz ao todo entre novelas portuguesas e brasileiras cerca de 30 projetos, o que demonstra o carinho e a minha entrega a esse universo da dramaturgia longa. Todos os atores e atrizes, todos os realizadores e realizadoras e todos os produtores e produtoras falam nisso: quem trabalha numa novela, é um exercício de muito foco e de muita concentração, é muito, muito, muito exigente, porque é um exercício diário de muitas horas de gravação, de muitas cenas gravadas, de muitas emoções vividas em cada dia e, muitas vezes, na maioria dos casos, com uma continuidade muito alargada. Não é feito por ordem cronológica, nós às vezes gravamos uma cena do episódio 1, depois no mesmo dia uma do 20, uma do 30, principalmente quando as obras – e a novela é uma obra aberta – têm muitos episódios abertos. Naturalmente, para rentabilizar, muitas vezes fazemos com um grau de afastamento dos episódios as mesmas cenas, porque são no mesmo decor, no mesmo dia. É preciso uma disciplina gigante de todos os intervenientes que fazem dramaturgia longa. Eu falo sempre das novelas com muito carinho e dou muito valor a todos os profissionais desse género, porque é um trabalho mesmo muito exigente e é preciso estar bem fisicamente, descansar, porque às vezes chegas a casa ao fim de dez, 11, 12 horas de gravação e tens a tua vida, como todos nós temos, e além disso tens de preparar mais cenas porque o dia seguinte continua. É preciso estar durantes x meses só focado naquilo. Tens de te cuidar, tens de comer bem, dormir bem, fazer desporto para não ires abaixo. É um trabalho que me dá muito prazer fazer e que é extraordinário.

Quando eu fui para o Brasil fazer “Como Uma Onda” e assumi a responsabilidade, eu não tinha noção que nunca tinha um estrangeiro protagonizado uma novela no Brasil e o Brasil é o país das novelas. Culturalmente, é o género mais assistido, mais visto. A novela chega, em prime time, a ter uma audiência, muitas vezes, de 90 milhões de pessoas. Estamos a falar de um projeto que tem muita visualização, portanto é uma grande responsabilidade. Na altura, eu era muito novo, estava rodeado de pessoas extraordinárias, muitas delas estavam a começar e hoje são grandes atores e realizadores hoje em dia no Brasil, também tinha pessoas que já tinham muita estrada e muita história com as novelas, então foi um conjunto de pessoas que me ajudou, de certa forma, a tornar aquela história especial, a desempenhar um personagem e a superar o desafio que me foi colocado da melhor maneira. A novela foi um sucesso, é a minha primeira apresentação enquanto artista e ator no Brasil que me fez ficar lá e o meu trajeto no Brasil já leva 20 anos e começou naquela novela.

Desde aí que comecei a perceber a dimensão do género no Brasil, até porque a Globo era, na altura, a terceira maior televisão do mundo, portanto estamos a falar de uma dimensão gigante e, naturalmente, comparar o mercado brasileiro com o mercado português é a grande diferença. A escala permite ter outros orçamentos, outros meios para fazer as novelas. No dia a dia, diria que é muito semelhante como se faz, as horas que se trabalha, o jeito de fazer. Naturalmente, as histórias são ambientadas noutra realidade, noutra cultura, têm também outra forma de atuação, porque os atores têm as formas de atuar que são características de cada país. Há uma grande diferença que eu acho que é muito interessante: no Brasil, à medida que se vai escrevendo uma novela, os atores não têm, normalmente, mais do que 20 capítulos na mão. Aqui, em Portugal, se calhar temos 60/70, o que permite ao produtor programar e gravar do um ao 70, então a nossa cronologia está mais aberta, tem de se estar por dentro de 70 episódios. Lá andamos mais em cima da ação, temos um controlo maior sobre as emoções do personagem.

"É a coisa mais espetacular do mundo quando alguém te vem falar sobre um personagem"

Quão diferente é ser uma figura pública no Brasil e em Portugal?
Tem muito que ver com aquilo que disse há pouco. No Brasil, as pessoas são mais extrovertidas, embora em Portugal, com o desenvolvimento enorme dos nossos projetos e com o carinho que os portugueses têm hoje em dia por uma novela, um filme ou uma série, leva os portugueses na rua a virem mais, a serem mais extrovertidos, a virem falar. É a coisa mais espetacular do mundo quando alguém te vem falar sobre um personagem. Do meu ponto de vista, os atores e artistas trabalham para um público, seja no teatro, no cinema, na televisão ou numa apresentação. Nós artistas gostamos e acho que só fazemos sentido se tivermos um público, portanto quando alguém vem ter contigo na rua e te fala de um determinado personagem, trabalho ou história, é a coisa mais fantástica do mundo.

Para comparar, eu diria que no Brasil o fenómeno da televisão e, neste caso, da novela, tem um impacto muito grande no dia a dia. Se estiveres a fazer um vilão, as pessoas zangam-se contigo na rua. É como se vivessem intensamente as histórias que lhes estamos a contar e isso é brutal. Também são, sem dúvida, mais extrovertidos. Aqui em Portugal eu diria que as pessoas, hoje em dia, estão um bocadinho assim também, o que é muito bom. É também o reflexo do trabalho dos muitos anos que nós já levamos na nossa área a fazer projetos, mas também do carinho com que os projetos hoje são recebidos, seja em dramaturgia de novelas, em séries ou no próprio cinema português. É por isso também que a nossa produção tem aumentado.

Em Portugal, o seu último protagonista foi o cantor de música popular Romeu Santiago, em “Amor Amor”, uma novela que o levou a vencer o Globo de Ouro de Melhor Ator de Ficção. Como foi fazer este projeto, sendo que além de representar também tinha de cantar?
Eu sou um inquieto, gosto realmente de tudo aquilo que supostamente não é fácil – e não é mesmo – ou tudo aquilo que é inesperado. Nunca fui uma pessoa de arrumar as coisas nas gavetas. Nós todos somos orgânicos, não sei se é essa a palavra, mas nós todos somos únicos na nossa forma de ser. Eu gosto de acreditar que nós todos temos capacidades e potencialidades que devem ser questionadas, apresentadas, descobertas e redescobertas. Nós só temos de, às vezes, clicar em determinadas coisinhas que temos dentro de nós. Eu odeio estereotipar pessoas, coisas, eu não sou de padronizar pessoas nem comportamentos, nós temos um bocadinho de tudo dentro de nós, portanto isso leva-me sempre a dizer ‘porque não?’ quando alguém me desafia para alguma coisa. Eu gosto muito de ter conhecimento, sou um estudante eterno. Se eu não sei alguma coisa vou procurar, vou estudar sobre isso, vou ter aulas, vou procurar alguém que saiba. Eu preocupo-me muito e, para eu desempenhar um determinado papel, eu tenho de estar minimamente ancorado, seguro do que vou fazer.

Esse projeto foi o exemplo disso. Na altura, lembro-me que me foram apresentados dois projetos e este era, sem dúvida, o mais inesperado, diferente, o que me fazia sair completamente e mandar-me para fora de pé, o que me ia levar a um lugar onde nunca tinha ido. E foi o que quis fazer. Obviamente que contei e procurei logo desde início ajuda. Era extraordinário poder viver a realidade de um cantor popular e brincares, viveres a história. Era um cantor popular que sofria imenso e tinha imensas questões, mas ao mesmo tempo tinha bom coração, era um amante da sua família e tinha uma família bem intensa, digamos assim. Era a minha oportunidade de poder juntar o acting com o cantor. O Toy foi fundamental na preparação deste personagem, não só como diretor musical do próprio projeto todo, mas fundamental na criação deste personagem. Fui à procura de vários exemplos, andei aí a consumir horas e horas de documentários e séries de cantores latinos, vi tudo o que se possa imaginar. Acompanhei ensaios, gravações de discos, tours de cantores em Portugal, e isto por mim. Eu faço sempre este trabalho paralelo, é o meu próprio trabalho, sinto que é a minha obrigação enquanto ator, o levar um ator já cheio de conteúdo. O Romeu Santiago de “Amor Amor” era muito isso, desde o tique do ombro que eu tirei de um amigo meu. Muitas coisas no caminho foram ficando e foram deitadas fora, outras coisas foram agarradas e aproveitadas. Depois também tivemos preparadores de elenco brutais, então foi uma junção de fatores, tive um professor de canto do conservatório que me acompanhou, o João Henriques, ao longo da novela toda. Este trabalho era, sem dúvida, um trabalho desafiante, ao ponto de eu ter acabado a cantar ao vivo em programas de televisão e eu ir a programas de televisão e pedir para não me tratarem por Ricardo, porque já que eu ia completamente em Romeu Santiago não fazia sentido. Foi fixe sentir isso, foi algo que eu nunca tinha feito.

Gosto destas experiências, acho que elas te levam a explorar lugares diferentes, seja a nível físico, de cérebro, emocional, dão muito background para futuras produções e criações. Este personagem fez-me dar ainda mais valor, e eu tenho muitos amigos do mundo da música, ao trabalho super exigente que têm. É bem, bem, bem difícil. Este personagem foi tão querido, também foi numa altura em que as pessoas precisavam e gostaram deste projeto. Ele entrou em casa das pessoas e animou todas as gerações, nós sentimos que era um projeto transversal a todas as idades. É muito gratificante teres a oportunidade de teres um projeto assim tão porreiro e um desafio tão porreiro. Espero que o meu próximo desafio em dramaturgia longa seja também assim tão cheio de características e tão bom para se poder compor um bom personagem.

Ricardo Pereira
Ricardo Pereira Ricardo Pereira deu vida a Romeu Santiago de "Amor Amor", na SIC. créditos: SIC

"Depois da Globo surgiu este convite muito interessante, não só porque continuaria a trabalhar como ator e a dar os primeiros passos como realizador, mas também ter a oportunidade de trabalhar numa outra função como produtor criativo"

No ano passado, assumiu a função de produtor criativo da Netflix e o seu contrato também inclui trabalho como ator e realizador. Em que consiste esta função e o que se pode esperar desta parceria?
Em primeiro lugar, continuar a trabalhar como ator e dar os primeiros passos como realizador. É algo que eu quero muito fazer, mas não me vão ver a fazer e a realizar uma coisa da noite para o dia. Já comecei a fazer o que entendo que serão os primeiros passos, tenho estado a acompanhar alguns amigos realizadores, a tentar perceber um bocadinho mais o que é, embora eu tenha trabalhado com tantos e tantos. Ainda não estou na parte técnica, estou muito na parte conceptual, da ligação que eles e elas têm com os atores e as atrizes. Quero muito entender e tenho estado mais atento a esse trabalho de quem está atrás das câmaras. Acho que esse é o primeiro passo para depois, eventualmente, começar a estagiar com um realizador e depois começar a acompanhar, fazer uma equipa pequenina e poder fazer algumas cenas. Passará também por, um dia, realizar uma curta, eventualmente corealizar também com alguém. Acho que passa muito por aí. É um trabalho que vai continuar a ser desenvolvido em vários projetos.

Vou continuar a trabalhar como ator. Depois da Globo surgiu este convite muito interessante, não só porque continuaria a trabalhar como ator e a dar os primeiros passos como realizador, mas também ter a oportunidade de trabalhar numa outra função como produtor criativo, fazendo parte de uma equipa que, de certa forma, procura encontrar projetos que sejam interessantes para serem trabalhados no mercado espanhol, português e brasileiro. Fazendo parte dessa equipa, o que é que essa equipa faz? Basicamente, recebe ideias, projetos e guiões, o que significa muita leitura, muitas reuniões, conhecer muitas pessoas, continuar a ver muitas coisas. Hoje em dia passa por ler muita coisa que me chega e, de certa forma, direcioná-las junto com a equipa para perceber se esse projeto pode ganhar uma green light [“luz verde” em português] para ser produzido. É um trabalho minucioso, muito exigente, não há uma fórmula certa. Nós queremos encontrar boas histórias e é isso que temos vindo a fazer.

O que me fascinou com este convite para me juntar a uma equipa e a uma empresa tão grande que tem feito um trabalho gigante no mundo e que nos tem trazido tantas histórias boas, é também a oportunidade de, ao trabalhar como produtor criativo, acompanhar mais o processo criativo e de me juntar mais ao processo criativo. Isso era algo que eu queria desde há muito tempo. Eu buscava isso como ator, quero continuar a trilhar o meu caminho, mas sentia que queria estar mais por dentro do processo criativo. No futuro, gostaria de estar a acompanhar mais a criação das histórias. Para isso, é muito importante acompanhar autores e autoras, tentar perceber como é que o processo criativo ocorre. Claro que era um desafio extraordinário poder estar tão próximo do processo criativo.

O streaming tem crescido cada vez mais, com séries portuguesas a chegar à Netflix e a serem vistas em vários países.
Nos últimos anos, demos um salto tremendo na produção de conteúdos. Há muitas janelas hoje em dia onde os conteúdos podem ser exibidos, então isso faz com que haja, naturalmente, uma produção maior de conteúdos. Eu acho que, para todas as pessoas envolvidas do meio e não só para os atores e atrizes, aumentarmos a produção de conteúdo vai fazer com que o mercado cresça e isso é fundamental para todos os que fazem parte desse mercado.

O Ricardo já afirmou ser um workaholic. Como é que concilia esse seu traço com o facto de ser marido e pai de três filhos?
Eu sempre pus as coisas de uma forma muito clara e, para mim, isto só faz sentido assim. Eu sou um workaholic, adoro trabalhar, passo a minha vida a dedicar-me. Se eu estou a trabalhar, estou de facto ali. Tento tirar o máximo dali, tento focar-me ao máximo ali. Para quê? Para depois também poder ter o meu tempo familiar, que é fundamental para mim. O meu bem-estar e a minha capacidade para o trabalho vêm do facto de eu conseguir ter tempo para mim, para a minha família, para os meus amigos, para os meus filhos, para a minha mulher, para todos. Sem dúvida que temos de estar bem familiarmente e pessoalmente para depois estarmos completamente prontos e bem para o nosso trabalho. Para mim só faz sentido desde que exista um equilíbrio entre estas duas vertentes da minha vida. É fundamental. Se não existisse equilíbrio, eu sei que também não conseguiria dar o máximo no meu trabalho. É uma questão de organização, de pensar dentro do universo de ser um workaholic aquilo que dá e o que não dá para fazer. Nós temos todos também o nosso limite físico, temos que nos respeitar também a nível de descanso, se queremos ter vidas mais longas.

A sua relação com a Francisca, com quem está há mais de 17 anos, é muito querida pelo público, assim como toda a família. É fácil esta gestão da família entre Portugal e Brasil?
Nada na vida, quando andamos sempre de um lado para o outro, é assim tão fácil. Vem muito da organização, somos mega companheiros um do outro, a Francisca também trabalha imenso e em vários lugares diferentes e, portanto, acabamos sempre por dar a mão um ao outro. Quando não está um, está o outro e é assim mesmo que tem de ser. Nós somos muito organizados, mas obviamente que temos sempre de pensar um bocadinho à frente do nosso tempo, por causa da nossa realidade, por sermos uma família do mundo. Isso faz-nos ter de planear e pensar um bocadinho mais nas coisas, organizar, para que essas mudanças e essas vidas no mundo sejam prazerosas e que aconteçam da melhor maneira. O que tiramos daí enquanto família são as experiências que vamos tendo. Nós estamos, de certa forma, a preparar-nos todos para, ao fim do dia, termos uma bagagem cultural muito diversa. Quanto mais experiências, mais observações, mais vivências tivermos, mais preparados estamos. Parece fácil, mas não é. Eu diria que é sempre pensar do depois do amanhã, porque o amanhã é já aí.