No Kitchen Dates não há especialidades. E não, não é que seja tudo mau, mas Rui Catalão e Maria Antunes só usam produtos da época e aqueles que os agricultores conseguem colher. "O menu está sempre em mutação", explica à MAGG Rui Catalão. Por isso, o que encontra este sábado poderá não encontrar no próximo. Há produtos que se mantêm o ano inteiro, como é o caso da amêndoa, vinda de Trás-os-Montes, que dá origem ao queijo curado de amêndoa, um dos poucos pratos que está sempre na ementa. Mas, no geral, não pode esperar sempre o mesmo.
O conceito de cozinha sustentável não é recente. Com o aumento da preocupação com o meio ambiente, os espaços que promovem a comida sustentável têm vindo a aumentar. Mas a ideia do Kitchen Dates não é de agora. Nem ontem ou anteontem. O novo espaço, que abriu esta quinta-feira, 24 de outubro, em Lisboa, nasceu na Holanda, quando Rui e Maria decidiram mudar os hábitos alimentares e passaram a surpreender todos na empresa com as suas marmitas originais.
Mas recuemos um pouco nesta história. Rui tem 31 anos e foi para a Holanda para tirar um mestrado em gestão do desporto. Maria tem 32 e foi lá ter um ano mais tarde, quando perceberam que não podiam viver um sem o outro. Viviam juntos e, como qualquer casal, faziam compras a dois. Só que um dia pararam para ler o rótulo de um pão e a sua respetiva lista de ingredientes. Naquele momento, tomaram consciência da quantidade de produtos dispensáveis que estavam presentes em algo tão simples como um pão. Até açúcar tinha.
Rui e Maria passaram a questionar tudo aquilo que andavam a comer: começaram por cortar nos produtos processados e progressivamente eliminaram o consumo de produtos animais e de derivados. Hoje, guiam-se por uma dieta 100% vegetal, que é a base do Kitchen Dates. Mas já vamos falar mais sobre este espaço, ainda nos faltam as marmitas e o nascimento do Kitchen Dates enquanto página de Instagram.
Quando deixaram de vez a carne e o peixe, Rui e Maria começaram a levar para a empresa onde cada um trabalhava as marmitas alternativas que cozinhavam em casa. "Todos os dias perguntavam-nos o que trazíamos, chegava a ser aborrecido", conta. Decidiram então criar uma página de Instagram onde partilhavam as refeições do dia a dia. "A página chamava-se Kitchen Dates porque eram as fotos do que comíamos no ao jantar em nossa casa".
Da página de Instagram saltaram para a realização de um brunch em casa. "Começámos com quatro pessoas, depois seis e depois oito, até que já não estávamos contentes com o modo de vida em Amesterdão e voltámos para Portugal". A ideia de continuar o negócio não era o motivo deste regresso, mas com alguns seguidores na página de Instagram, o casal começou a organizar o mesmo evento em Campo de Ourique, em Lisboa. Mais uma vez, foi um sucesso e o casal foi organizando também encontros apetitosos noutras cidades.
Do brunch em casa para o Kitchen Dates em Telheiras
O espaço em Telheiras só veio mais tarde. E caso se esteja a questionar, não lhe chamamos restaurante porque os donos não o veem assim. "Não queríamos abrir um restaurante no sentido tradicional da palavra porque aquilo que nós estávamos a proporcionar às pessoas era uma experiência, que precisa de tempo para ser desfrutada e para conhecer as outras pessoas", explica. Por isso, no Kitchen Dates só há uma mesa corrida e 20 lugares. A ideia não é que leve a família, até porque só pode fazer reserva para um máximo de quatro pessoas. O objetivo é mesmo que as pessoas se conheçam umas às outras.
Os produtos são todos biológicos e há limite na distância a que se encontram os produtores. Por isso, não espere encontrar cacau ou bananas (ainda que sejam um produto nacional), porque são produtos que se encontram acima da distância definida. Em alguns casos, o próprio casal fez parte da plantação do produto e conhece a terra, mas este não é o único cuidado: "Se há um produtor em Espanha, a 300 quilómetros, que tem o mesmo produto do que outro em Trás-os-Montes, a 400 quilómetros, damos preferência ao espanhol porque a pegada de carbono será menor".
O mobiliário também se rege pelas regras da casa: a mesa foi feita com retalhos de madeira, os talheres doados e as cadeiras são em segunda mão. Mas há mais: o espaço não tem caixote de lixo, apenas uma compostora elétrica chamada Eva. O nome vem do filme da Disney, "Wall-E", onde Eva se ocupa de procurar sinais de vida num mundo aparentemente deserto.
E é essa a função da Eva. Com os restos das refeições e da preparação na cozinha, a compostora opera num "ciclo de 24 horas para transformar toda a matéria orgânica em composto". O composto é entregue aos produtores e usado na agricultura, especialmente nas hortofrutícolas. A ideia é trabalhar no sentido de uma economia circular, "porque no fundo nada se perde aqui".
Quanto ao horário, há horas definidas. Para já só estão a funcionar os brunches aos sábados, domingos e feriados. As reservas são obrigatórias e devem ser feita através do site. Custam 30€ por pessoa. A partir de 8 de novembro, pode visitar o espaço nos dias abertos, todas as sextas-feiras, onde há petiscos e bebidas para experimentar, entre os quatro e os 12€.
No final de novembro, passam a haver também jantares todas as quartas e quintas-feiras, pelas 20 horas. São 35€ por pessoa e a ideia é que cheguem todos à mesma hora para que se conheçam e "desfrutem da refeição como um família". Se quiser alguns destes produtos em sua casa, o espaço também tem uma despensa aberta de todas as quartas a sextas-feiras, das 13 às 20 horas, e aos sábados e domingos a partir das 15 até às 18 horas.
Última nota: o valor é pago na reserva para que haja um compromisso da parte de quem marca. Não só se evita o desperdício de alimentos encomendados aos produtores, como também o desperdício de comida preparada. Afinal, aqui não se quer nada no lixo — até porque ele nem sequer existe.