Não foi fácil marcar mesa para ir experimentar o Comoba. Não pelas filas à porta — isto porque fomos numa manhã de dia de semana, caso contrário, bem que teríamos que esperar — mas porque o trio que assegura este novo espaço no Cais do Sodré é pouco dado à ribalta. "Preferimos que seja a comida a falar por nós", explica Greg, assim que o convencemos a sentar-se connosco para nos contar mais sobre este novo espaço do Cais do Sodré.
Greg Martin, Marlon Lipke e Francisco Amaral são sócios e, acima de tudo amigos. "Ah, e todos nós temos esta preocupação com o comer bem, o que também ajudou a unir forças para criar este espaço", explica Marlon, que apesar do nome estrangeiro, nasceu no Algarve, filho de pais alemães que, em 1993, escolheram Lagos para viver e montar uma surfcamp.
Era mais que inevitável que Marlon se tornasse surfista, profissão que o fez viajar mundo à procura de ondas e onde aprendeu a comer bem para alimentar um corpo que se quer sempre no ativo. "Optava sempre por restaurantes de comida orgânica, explorei muito os pratos feitos com superalimentos e, quando decidi parar um pouco por Portugal, desta vez em Lisboa, percebi que ainda não havia cá um restaurante com essa preocupação". Uniu forças a Greg, produtor de cinema com quem já trabalhava há muitos anos e, já em dupla, juntaram-se a Francisco, advogado, que tinha o espaço ideal para abrir o restaurante do sonho dos três.
Aqui funcionava uma antiga farmácia e, ao contrário do que normalmente acontece com a passagem de um negócio para outro, não destapou chãos, paredes e tetos. "A ideia foi exatamente a contrária. Tiramos o que estava a mais e, se repararem, temos tijolos e tubagens à mostra e o chão também é o original", salientam.
O Comoba está aberto das 7h30 às 19h30 e durante essas 12 horas a única regra é comer bem. "Não dividimos o menu por pequeno-almoço, almoço ou lanche", explica Greg. E, de facto, basta um passar de olhos pela carta para perceber que há uma secção para a comida e outra para a bebida. Pronto.
Dentro da comida, as opções podem ser aquelas que à partida identificamos mais com o início do dia como as panquecas (9€) ou a smoothie bowl de spirulina (9€), mas não faltam pratos salgados, como o burrito (11€) ou os tacos (11€).
Orgânico e sustentável
Seja qual for a opção, a certeza é que tudo o que vem para o prato é orgânico, desde os legumes ao café. "Há quem ache o nosso café caro [1,40€] e, de facto, não é ao preço de uma bica num qualquer outro espaço da vizinhança, mas a qualidade também se paga e o nosso vem de uma torrefação londrina e a diferença do sabor justifica o valor", explica Marlon.
Ao bem servir, este trio juntou também a questão da sustentabilidade e do cuidado com a origem dos produtos. "Mas atenção que não queremos ser daqueles cafés todos hippies", avisa Greg. "Queremos sim que tudo o que venha para o prato tenha benefício para a saúde", acrescenta Marlon.
Todos os produtos usados para a confeção dos pratos são de produção biológica. Além disso, recusam-se a comprar algo que seja produzido a mais de 50 quilómetros de Lisboa. "Preferimos apoiar o comércio e a produção local, além de que damos sempre prioridade aos legumes e frutas da época", referem.
Estão ainda a lutar para acabar com todo o plástico que possa estar a ser usado no restaurante e, ainda na lógica do desperdício zero, os guardanapos são de pano, "feitos à mão por uns artesãos que conhecemos cá em Lisboa", explica Greg.
Tivemos que provar as panquecas verdes
Era impossível sair daqui sem pedir um café americano. Já Marlon e Greg, que representam o grupo, tendo em conta a ausência de Francisco, optam por um latte. "Queres provar?", pergunta Marlon, com Greg já a chegar do balcão com uma chávena na mão. "Acabou agora mesmo de ser feito", garante. Aliás, reparo agora que um dos funcionários espreme para um jarro o líquido resultante do triturar das amêndoas. "Tudo o que servimos aqui é feito por nós", esclarece Marlon, "o pão, as bebidas vegetais de aveia ou amêndoa e o creme de caju das panquecas". Creme de caju e panquecas na mesma frase? Venham elas.
Assim que chegam à mesa, percebemos o hype de um café que só se dá a conhecer pelas fotos dos clientes que não resistem a partilhar nas redes sociais os pratos cheios de cor. Se a smotthie bowl de spirulina é azul, as panquecas são verdes, por causa da matcha usada na lista de ingredientes. Por entre as várias panquecas empilhadas está o tal guloso creme de caju, intercalado com mirtilos, amoras e framboesas.
São 9 euros de panquecas e dois euros por um café americano, o que pode parecer exagerado quando o dia ainda está a começar. Mas a verdade é que depois daquele café não fomos capaz de, naquele dia, nos aventurarmos num expresso banal, cuja probabilidade de saber a queimado é normalmente acima dos 80%. E quanto às panquecas, bem, são a prova de que, de facto, no Comoba não há horas para a comida. Aquela torre comida às 10 da manhã alimentou-me quase até à hora do jantar. Abençoada matcha.