Antes de começarmos, alertamos que este texto contém alguns spoilers sobre o primeiro episódio da série "House of the Dragon".

Pronto, vamos admitir: o título é clickbait. E é, ao mesmo tempo, verdade. Sei o essencial sobre a saga "A Guerra dos Tronos", não só por obrigação profissional mas também... Nah. É só mesmo por razões profissionais. Em abril de 2012, quando estreou a segunda temporada da saga criada por George R.R. Martin (e o mundo estava numa verdadeira histeria coletiva, de dragões e batalhas sangrentas), aventurei-me a ver um episódio. E logo ali concluí que aquilo não era para mim.

Dragões, terras imaginárias, mortes, violações, tudo passado num sítio onde parece que está sempre de noite. Chamem-me básica mas este género de série não é mesmo a minha praia. Violência por violência, deem-me a crueldade do terrorismo e da tortura de "Segurança Nacional" ou a intriga política que acaba com jornalistas atirados para a linha do metro de "House of Cards".

Mas isso não quer dizer que, 10 anos depois, a minha opinião não tenha mudado. Eu mudei. Já não sou quem era. O mundo mudou. Será que a prequela de "A Guerra dos Tronos", "House of the Dragon", me poderá fazer mudar de ideias? Será que é possível sequer ver esta nova série sem estar familiarizado com o universo de dragões e batalhas pelo poder? Fui testar.

Então, no arranque do episódio sou logo informada de que estamos no fim do primeiro século da era Targaryen (nomes complicados, estes). A família real é poderosa porque tem 10 dragões (deve ser o equivalente, à época, a ter três Porsches, dois Ferraris e cinco Lamborghinis na garagem). Há uma batalha pela sucessão, o que nos faz lembrar logo outra série bem conhecida, também da chancela HBO.

Informação paralela, mas não menos interessante. Rhys Ifans, o ator que dá vida a Otto Hightower, o braço direito do rei, é o mesmo que interpretou o alucinado Spike no filme "Notting Hill". Estamos em choque.

house of the dragon rhys ifans

Isto ainda nem aqueceu e já a princesa Rhaenys Targaryen (Eve Best) é chutada do trono por, claro, ser mulher. Começamos bem.  A história de "House of the Dragon" passa-se 127 anos antes do nascimento da Daenerys que, se bem me lembro, é moça protagonista da saga "A Guerra dos Tronos". E, ao fim de alguns minutos, lá aparece o primeiro dragão. Sou só eu que acho que estes bichos criados digitalmente são muito fracotes? Não quero parecer velha do Restelo, mas até os dinossauros do "Jurassic Park" (o primeiro, de 1993) pareciam mais reais.

Quem vem a conduzir o dragão é a princesa Rhaenyra Targaryen (Milly Alcock, em jovem e Emma d'Arcy em adulta). Rhaenyra não aparenta ter idade para ter carta de condução mas já anda de dragão. #slayfuturequeen.

Vem aí "House of The Dragon". Prepare-se para a estreia neste escape room de "A Guerra dos Tronos"
Vem aí "House of The Dragon". Prepare-se para a estreia neste escape room de "A Guerra dos Tronos"
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"A Guerra dos Tronos" passa-se numa espécie de Idade Média mas com dragões e pessoas jovens com o cabelo prematuramente branco e impossivelmente liso. Há muito homem façanhudo e de armadura, muito castelo, muita aia e muitas disputas intestinas por poder. Ah, e sangue. Muito sangue. Diversas formas de sangue.

Percebe-se que Rhaenyra tem pelo na venta porque, enquanto a mãe, a rainha Aemma, gravidérrima, lhe diz que está condenada a ter "útero real", a princesa comunica que o que quer ser é cavaleira. #yougodragongirl.

Depois de andar a servir vinho ao pai, o rei, e respetivos conselheiros, que estão em ânsias por saber se o útero real traz lá dentro um rapaz ou um rapaz, a princesa vai ter com o tio Daemon (Matt Smith) que, surpresa, é, ao mesmo tempo, o príncipe Filipe de "The Crown" e também um clone do assustador Vigo, The Carpathian, de "Caça Fantasmas 2".

matt smith game of thrones

Socorro-me do Google para saber que língua é esta que se fala na Casa do Dragão, e graças à amiga Wikipédia, descubro que é High Valyrian (soa vagamente a estónio ou finlandês). Se forem cromos das línguas como eu, visitem a página da Wikipédia, que vale bem a pena.

Durante uma trivial conversa entre o rei e a rainha, esta profere a única frase que, ao longo de mais de uma hora, me faz ter um esgar remotamente parecido a um sorriso. "Nada fará com que cresça uma pila ao bebé se ele já não tiver uma". Épico.

Começam as cenas de pancadaria, tortura e esfaqueamento, comandadas pelo tio Daemon. Ainda não passou meia hora, e já estão a castrar a frio um desgraçado. Há mãos decepadas, uma cabeça também. Daemon gosta de matar pessoas mas, pelo que dizem as más línguas, não aprecia a arte do bunga bunga com mulheres. Por falar em bunga bunga, cá está novamente o tio Daemon a tentar dar à espada, desta vez em cima de uma concubina. Sem sucesso.

Um plano aberto de uma arena faz-me lembrar o filme "Coração de Cavaleiro", com saudoso Heath Ledger. Só que, em vez de cenas divertidas e romance há pancadaria da velha e sangue às litradas.

Enquanto a rainha Aemma está aos gritos a tentar parir uma criança, o resto da corte diverte-se num torneio onde, mais uma vez, o tio Daemon, vai andar à batatada. Há mais violência completamente gratuita e, uma cena em particular, em que se vê uma cara toda esmagada depois de levar com um machado, faz-se agradecer ter visto isto no ecrã do telemóvel e não numa televisão 4K. Qual é mesmo o objetivo? Por a malta a vomitar?

house of the dragon
créditos: HBO

Todas as cenas de violência são demasiado gráficas mas nada nos prepara para o momento absolutamente horroroso que acontece a seguir. Confesso que tive de passar à frente. Uma tragédia acontece (não vou fazer spoilers) e o rei vê-se novamente em apuros. O final do primeiro episódio é benfazejo para a princesa Rhaenyra e estamos a sentir umas reminiscências de "Elizabeth".

house of the dragon

Algumas conclusões:

  • se "A Guerra dos Tronos" era isto, uma orgia de violência gratuita, ainda bem que não vi;
  • Esta obsessão pelo incesto, pela recriação de romances entre homens mais velhos e personagens com a aparência de crianças (embora interpretadas por adultas), é mesmo necessária?;
  • Só há um dragão no primeiro episódio e faz uma participação especial de poucos segundos. O "Jurassic Park" era bem melhor;
  • resumo do primeiro episodio: violência, sexo, orgias, sangue, membros decepados, mulheres abusadas, mais sexo, mulheres desapropriadas de poder. É isto. São gostos. Eu passo.

Veredicto: "House of the Dragon" é super interessante para quem viu e é fã "A Guerra dos Tronos". Quem nunca viu, como eu, e não esta a par da história, fica a apanhar do ar e tem de se socorrer do Google e da Wikipédia para perceber a história.