O mundo já está a revisitar Oz com "Wicked", o filme de fantasia protagonizado por Ariana Grande e Cynthia Erivo. Em Portugal, o projeto estreia a 5 de dezembro e promete transportar o público para as origens das personagens de "O Feiticeiro de Oz", abordando temas como empoderamento feminino e a importância de não julgar pelas aparências – mesmo quando se trata de uma pele verde.

Baseado no sucesso homónimo da Broadway, que tinha Kristin Chenoweth e Idina Menzel no elenco – e que, por sua vez, teve como inspiração a obra "Wicked: The Life and Times of the Wicked Witch of the West", de Gregory Maguire –, o filme é, essencialmente, uma prequela de "O Feiticeiro de Oz", de 1939, focando-se na vida de Glinda e Elphaba. Esta dupla de bruxas tem um papel de destaque no clássico com mais de 80 anos.

Trocado por miúdos, a personagem principal, Dorothy Gale, interpretada por Judy Garland, é transportada por um tornado da sua casa no Kansas para o mágico mundo de Oz. Lá, embarca numa jornada para encontrar o Feiticeiro, que acredita ter o poder de a ajudar a regressar a casa. Pelo caminho, Glinda (Billie Burke), a Bruxa Boa, guia-a e oferece proteção, enquanto a Bruxa Má do Oeste (Margaret Hamilton) tenta detê-la, por causa de uns sapatos de rubi.

Deste sucesso resultaram êxitos como "Over the Rainbow", assim como números intemporais. Porém, nem tudo é tão mágico quanto parece. Apesar das cores vibrantes e da nostalgia que o filme nos faz sentir, os bastidores de "O Feiticeiro de Oz" foram marcados por abusos, negligências e acidentes que prejudicaram a vida de alguns dos atores que integravam o elenco – especialmente por ter sido produzido numa época em que os padrões de segurança e os direitos dos atores eram rudimentares.

Embora "Wicked" seja quase uma celebração das personagens que começaram nesta obra-prima que revolucionou o cinema, uma vez que se muniu de Technicolor, um processo que trouxe cores altamente saturadas e vibrantes, marcando um ponto de viragem na indústria, houve quem pagasse um preço bastante alto pela participação no filme. Nós dizemos-lhe de que forma.

Judy Garland sofreu por causa da aparência

judy garland
judy garland créditos: Reprodução

A atriz Judy Garland tinha apenas apenas 16 anos quando as filmagens de "O Feiticeiro de Oz" começaram, tendo um ano a mais no fim do projeto. Contudo, a personagem que encarnava tinha entre 12 e 14 anos, pelo que foi alvo, durante todo o processo, de uma rigorosa vigilância no que diz respeito à sua aparência.

A Metro-Goldwyn-Mayer, o estúdio responsável pela produção do filme, queria que a atriz não perdesse os traços infantis, pelo que a forçou a perder peso drasticamente – e a dieta utilizada para o efeito era de bradar aos céus. Esta passava por comer apenas canja, café e 80 cigarros (sim, diários), de acordo com o "Irish Independent".

Já a "Rolling Stone" acrescenta que a artista ficou viciada em sedativos e anfetaminas durante as gravações, estas últimas para controlar o apetite. Como se isto não bastasse, Judy Garland ainda sofreu abusos psicológicos devido à sua aparência, bem como de cariz sexual, especialmente vindos de atores que interpretavam os habitantes de Munchkinland.

As consequências foram devastadoras: a atriz desenvolveu dependência de drogas e álcool, resultando num declínio mental e físico que culminou na sua trágica morte aos 47 anos. Judy Garland, que tentou suicidar-se diversas vezes, morreu a a 22 de junho de 1969, em Londres, devido a uma overdose acidental de sedativos, segundo o "Los Angeles Times".

Margaret Hamilton ficou queimada (e não foi a única)

margaret hamilton
margaret hamilton créditos: IMDb

Um dos aspetos mais marcantes da Bruxa Má do Oeste, interpretada por Margaret Hamilton, é o facto de aparecer e desaparecer quando quer, através de uma explosão de fogo e fumo. Uma vez em que, há mais de 80 anos, os efeitos especiais estavam longe de ser uma realidade, todos estes truques de magia tinham de ser concretizados com efeitos técnicos.

Por isso, durante uma das famosas cenas em que a bruxa desaparece, um erro técnico fez com que o fogo fosse acionado demasiado cedo. O resultado? O rosto e a mão direita da atriz foram afetados, tendo sofrido queimaduras de segundo e terceiro graus, de acordo com o site Slash Film.

A tinta verde que cobria a cara e as mãos da atriz era à base de cobre, algo que é altamente inflamável, fazendo com que as queimaduras fossem mais graves, acrescenta o "Daily Mail". A artista acabou por ficar afastada do projeto durante seis semanas e, mesmo depois de regressar, não conseguiu usar maquilhagem na mão devido às dores, tendo acabado por usar luvas.

Também Betty Danko, uma mulher que fez de duplo de Margaret Hamilton, sofreu lesões graves aquando da rodagem do filme. Isto porque, segundo a publicação britânica, um tubo de fumo ficou preso à vassoura, fazendo com que esta explodisse. A artista também ficou queimada nas pernas e sofreu danos permanentes em alguns órgãos.

O fato do Leão Cobarde era uma tortura

leão cobarde
leão cobarde créditos: Reprodução

Bert Lahr deu vida ao Leão Cobarde de Oz, que Dorothy encontra na sua jornada até ao Feiticeiro e a quem se junta, visto que este também tinha um pedido para fazer ao mágico: ter mais coragem. Interpretar esta personagem parece ter sido um pesado – é que o fato do artista era feito de pelo real de leão e pesava 45 quilos, de acordo com a "Marie Claire".

Como se isto não bastasse, o ator morria de calor não só por tê-lo vestido, mas porque as temperaturas nos estúdios eram altíssimas. Isto tudo por causa das luzes intensas e necessárias para o processo Technicolor, que faziam com que o interior das vestes se tornasse insuportável. Todas as noites, precisava de ser lavado por duas pessoas e seco numa máquina industrial.

A par disto, de acordo com a publicação brasileira, a prótese que Bert Lahr usava era um constrangimento gigante à sua alimentação. Isto porque, devido ao facto de ter algumas partes feitas com papel, podia desfazer-se enquanto mastigava alimentos sólidos. Por esse motivo, o artista só pôde alimentar-se de líquidos durante a rodagem do filme.

O Homem de Lata e a crise de alumínio

homem de lata
homem de lata créditos: IMDb

Buddy Ebsen foi o ator escolhido originalmente escolhido para o papel do Homem de Lata, com quem Dorothy Gale também se cruza na sua jornada. Contudo, o papel acabou por ser entregue a outro ator (já lá vamos), uma vez que a primeira escolha sofreu uma reação alérgica grave ao pó de alumínio puro usado na maquilhagem da personagem, diz a "Time".

Este pó, que é altamente tóxico, foi inalado durante as filmagens, tendo acabado por revestir os pulmões do artista e impedindo-o de respirar corretamente. Nove dias depois de ter começado a rodar, Buddy Ebsen acabou por ser hospitalizado e posto numa câmara de oxigénio.

Como não estava a melhorar suficientemente depressa, os realizadores contrataram Jack Haley para ser o Homem de Lata. Este último teve mais sorte, já que o pó de alumínio foi substituído por uma pasta, mas isso trouxe um novo problema de saúde: uma infeção ocular, que deixou o substituto temporariamente incapacitado. 

A neve falsa era feita de uma substância altamente cancerígena

neve
neve créditos: Reprodução

Todos conhecemos a cena em que Dorothy acorda num campo de papoilas coberto de neve, depois de ter sido encantada por Glinda, certo? Bem, parece algo bastante idílico, mas, na verdade, é um autêntico atentado à saúde. Isto porque a neve falsa era feita de amianto, um mineral tóxico e altamente cancerígeno, diz o "The Star".

O crisótilo, uma espécie branca de amianto, era algo comum na época – e até bastante utilizado em decorações de Natal. Esse material, que também era usado em telhados, acabou por ser utilizado na famosa cena das papoilas, visto que, na altura, não havia efeitos especiais que conseguissem replicá-la.

De acordo com o site "Tua Saúde", a exposição ao amianto pode causar asbestose, cancro do pulmão e mesotelioma. A asbestose é a formação de cicatrizes no tecido pulmonar, o cancro do pulmão resulta de inflamação crónica desse mesmo órgão e o mesotelioma é um cancro agressivo que também afeta os pulmões e órgãos vitais. Todas as doenças estão associadas à inalação prolongada de fibras de amianto.