Está prestes a completar 21 anos, aniversário que coincide com o lançamento do seu novo single "Ou Não". Mas, dois dias antes da celebração, Bárbara Bandeira tem outro motivo para festejar: é a artista portuguesa escolhida para fazer parte do programa EQUAL da Spotify neste segundo trimestre de 2022.
A iniciativa da plataforma de audiostreaming foi criada há um ano e tem por objetivo promover a igualdade género e o igual acesso a oportunidades para as mulheres da indústria da música. A escolha de Bárbara Bandeira, explica Melanie Parejo, teve que ver com a filosofia do programa EQUAL. “Para nós, a Bárbara é uma representante perfeita do que pode ser uma artista pop neste espaço. Parece-nos ser uma pessoa que não se censura, que não se cataloga demasiado rápido. Tem um músculo desenvolvido para a aventura, para experimentar sonoridades novas”, explica a responsável do Spotify para o sul da Europa.
Aos 20 anos, é a mais jovem artista portuguesa a ser escolhida para integrar esta iniciativa, embora, como explica Melanie Parejo, esse não tenha sido um fator de peso, mas sim conceder ao público um “espectro amplo de toda a possibilidade de representatividade da mulher na indústria”.
À MAGG, Bárbara Bandeira confessou não estar à espera de fazer parte da iniciativa EQUAL, que já contou com artistas portuguesas como Áurea, Carolina Deslandes, Ana Moura ou Mariza. “Achava que havia uma fila enorme de gente antes de chegar a mim. Fiquei muito lisonjeada, ainda para mais por ter sido iniciativa do Spotify convidar-me”, confessa. Ainda que à distância, Bárbara vai ver o seu rosto numa das mais icónicas praças do mundo, por onde passaram milhares de pessoas por dia, a Times Square, em Nova Iorque. “Estamos num país tão pequenino como Portugal e, às vezes, não pensamos que algum dia isso pode acontecer. Através do Spotify isso é possível e eu estou muito contente por isso”, salientou a intérprete de êxitos como "Onde Vais?" ou "Larga-me Essas".
Questionada sobre o apoio e entreajuda que existe entre artistas femininas da sua geração, a artista enaltece a importância desta união, que vai além do plano profissional, uma vez que é amiga de cantoras como Carolina Deslandes ou Bárbara Tinoco. “O facto de sermos todas unidas, de nos apoiarmos, de quando sai o trabalho de alguma, partilharmos, é consequência do facto de termos consciência de que cada uma tem o seu papel e o seu lugar. E que juntas conseguimos chegar muito mais longe do que uma para cada lado. Havendo uma amizade, ainda melhora a situação”, salienta.
“Eu comecei há quase sete anos e, quando comecei, não conhecia mulheres na indústria. Era tudo completamente diferente. Sentíamos que fazia muita falta mulheres, representatividade feminina. É por isso que, hoje em dia, nem sequer damos hipótese para ser de outra maneira!”. Bárbara Bandeira compara este apoio entre artistas femininas portuguesas a “uma bola de neve”. “Às tantas, foi ficando tão grande que ninguém a consegue parar".
A cantora explica ainda que esta união entre artistas femininas serve de incentivo às que estão a iniciar uma carreira. "O facto de as miúdas que estão agora a começar verem artistas como eu ou a Carolina a conseguirem faz com que elas sejam destemidas. E é o facto de serem destemidas que as torna ousadas e, automaticamente, não há ninguém que as pare. Tanto a Carolina, como a [Bárbara] Tinoco, a Carminho, a Ana Moura, a Nenny, eu acho que são peças fundamentais para nós conseguirmos olhar para o cenário atual e sentirmo-nos representadas”.
Questionada sobre se, no início da carreira, sentiu algum tipo de dificuldade ou entrave por ser mulher, Bárbara Bandeira diz que sim e revela um detalhe curioso. “Por muito estranho que pareça, a dificuldade começa no público. Como o público que consome música, que vai mais aos concertos, é maioritariamente feminino, eu sinto que sempre houve uma facilidade maior para que as mulheres se apaixonassem, idolatrassem os artistas homens. E eu acho que não é tão fácil para uma mulher idolatrar outra mulher da mesma maneira que idolatram homens. A única maneira de isso acontecer é se as mulheres se sentirem representadas, se existir um ponto de encontro, e há uma data de fatores que fazem com que isso aconteça”.
Oiça a playlist EQUAL Portugal
A cantora recorda o seu percurso, que começou no programa da TVI “Uma Canção Para Ti”, em 2010, quando tinha apenas 9 anos. “Eu era a miúda novinha que tinha um sonho e acabei por representar as meninas mais novas que também têm algum tipo de objetivo”. A filha do também cantor Rui Bandeira confessa que, nos primeiros anos, tinha dificuldades em provar “que estava a fazer isto mesmo a sério”. “Por ser nova e por ser mulher, sempre tive aquele preconceito por parte de pessoas que já estão na industria há muitos anos, maioritariamente homens, que me desvalorizavam muito. ‘Ah, a miúda está aqui um ou dois anos e depois ninguém se lembra dela’”, relembra a cantora. “Só o facto de haver esse preconceito logo à partida é algo que me entristece, mas que, ao mesmo tempo, acho que já não acontece da mesma maneira. Isso deixa-me muito feliz”.
Por conquistar estão lugares atrás dos microfones, como o de produção, um desejo que Bárbara gostava de ver cumprido. “Eu adorava ter um álbum produzido por uma mulher! Adorava! E nunca tive a oportunidade de trabalhar com nenhuma, infelizmente”.
"As mulheres têm um poder muito grande de lançar artistas para o estrelato"
Criado há um ano, o programa tem tido um impacto notável em Portugal. De acordo com os dados cedidos pelo Spotify, verificou-se um aumento de 38% de artistas femininas nas playlists da plataforma em relação ao anterior, e uma subida de 50% de artistas a estrearem-se nas listas musicais. “Isso enche-nos de orgulho. É a nossa forma de fazer parte da solução, de trabalhar a visibilidade que, no fundo, é o objetivo do programa”, garante Melanie Parejo, embora saliente que ainda há muito caminho para fazer, uma vez que, a nível global, apenas um em cada cinco artistas dos tops é mulher.
De acordo com o o relatório anual sobre a indústria da música, “Inclusion in the Recording Studio?”, levado a cabo pela Escola de Comunicação e Jornalismo da USC Annenberg, da Califórnia, no que toca a autoria e a produção musical, as mulheres continuam em franca minoria. O estudo analisou uma amostra de 1522 créditos de produção no espaço de 10 anos, dos quais 2,8% eram de mulheres e 97,2% de homens. Uma realidade que, de acordo com a Head of Music para o sul da Europa da Spotify , é transversal a vários mercados, nos quais se incluem Portugal e Espanha.
Tal como Bárbara Bandeira salientou, em Portugal assistimos a uma união informal entre cantoras, que utilizam as suas plataformas e sucesso já conquistado para darem projeção a outras profissionais do sexo feminino. Melanie Parejo afirma que, no país vizinho, essa “sororidade” também existe, e dá os exemplos de artistas como Amaia, Aitana e Rozalén.
A responsável do Spotify realça ainda um aspeto importante, relacionado com o poder do público feminino. “As mulheres têm um poder muito grande de lançar artistas para o estrelato. As mulheres têm a capacidade de fazer estrelas e, por isso, é tão interessante que haja propostas femininas. Porque há um ponto de empatia, de identificação, que é o que, no fundo, queremos com o programa EQUAL”.
Ao nível corporativo, Melanie Parejo diz que, para atingir a igualdade de género, é necessário “dar visibilidade e normalizar”. “Assumir que é normal que haja mulheres em posições de tomada de decisão, tal como existem homens. Que haja um maior acesso das mulheres aos estúdios de gravação, nas bandas que fazem as digressões, que haja mulheres produtoras. Porque é que não há mulheres produtoras?”, questiona a responsável do Spotify, lamentando o facto de ser extremamente difícil encontrar mulheres que se dediquem à produção musical, uma área quase exclusivamente masculina, à semelhança do que acontece, por exemplo, na área das ciências.
A responsável do Spotify explica ainda que o programa EQUAL é muito mais do que uma playlist. “É uma ambição. A nossa ideia é que haja cada vez mais mulheres nas playlists, que haja cada vez mais representatividade. Mas parte deste programa inclui o EQUAL Board, uma organização que criámos dentro do Spotify, onde existem organizações dedicadas às mulheres na música, que se reúnem a cada trimestre para discutir temas”. Parejo revela ainda que a plataforma de audiostreaming tem também um diretório EQUAL, uma base de dados com profissionais da indústria, mulheres e não binários, de todo o mundo.