INÊS APENAS (assim mesmo, em maiúsculas) faz 25 anos esta quinta-feira, 9 de março. A prenda de aniversário chegou mais cedo, no sábado à noite, dia 4 de março, com a passagem à final do Festival da Canção 2023. Inês Oliveira, nascida em Paris, filha de pais portugueses, vive em Leiria. Pianista de formação, só no segundo confinamento, em 2021, despertou para o canto e decidiu que ia começar a fazer música pop.
O final de uma relação foi o início de INÊS APENAS, o nome artístico que escolheu e que, através do concurso de livre submissão da RTP, chegou ao palco da segunda semifinal do Festival da canção. "Fim do Mundo" está entre as 13 candidatas a representar Portugal na Eurovisão 2023, que acontece em maio, em Liverpool. A final do Festival da Canção acontece no próximo sábado, 11 de março.
Em entrevista à MAGG, a artista de 24 anos fala-nos de como despertou para a música pop e do caminho até ao Festival da Canção. Recorda ainda a mãe, que morreu há um ano, e a quem dedicou esta conquista.
A passagem à final foi um presente de aniversário antecipado?
(risos) Por acaso foi, já tinha pensado nisso, que gostava de estar nos ensaios para a final. Vai ser precisamente no meu dia de anos. Foi um presente antecipado muito, muito bom.
Estava à espera de passar?
Eu tinha plena noção de que estava numa semifinal fortíssima. Sabia que a minha canção era forte e estava confiante mas, de facto, tudo pode acontecer. Então estava com medo de não passar, confesso.
O que é que sentiu fisicamente naquele momento?
Estava super nervosa e, quando passei, os nervos desapareceram logo. Foi uma avalanche de emoções positivas e fiquei muito feliz. Fiquei um bocado excitada, na verdade.
Já deve ter recebido feedback do mundo inteiro, através das redes sociais, sobre a sua atuação. O que é que já leu?
Do que li, pareceu-me tudo positivo. A canção já tinha sido analisada por Portugal, estrangeiro, em todo o lado, e o feedback já tinha sido muito positivo. Acho que isso mantém-se. Em relação à performance, houve pessoas a dizer que foi a surpresa da noite e isso, para mim, marcou-me imenso. Claro que houve ali pormenores que temos de ajustar, mas o feedback que tenho tido é também de surpresa, também em relação ao outfit e das coisas que levei para palco. Do que foi possível fazer, acho que correu bem. Os nervos são muitos, as pessoas nem imaginam o pânico que é estar lá à espera para atuar.
Porquê pânico?
Para mim é tudo muito novo. Estou nisto há muito pouco tempo, então é um desafio ultra difícil estar num palco tão grande como o do festival. Já tive muitas situações de pressão na minha vida e sou boa a lidar com a pressão, mas o Festival da Canção é outro nível.
A sua música foi uma das escolhidas entre as candidaturas de livre submissão. Porque é que quis concorrer ao Festival?
Foi um desafio do meu manager e de alguns amigos, que me diziam 'tens de concorrer ao Festival'. Na minha cabeça, o festival ainda era uma coisa muito longínqua e nunca esperei que acontecesse tão cedo. Mas, quando escrevi esta música, tinha em mente o Festival da Canção. Nunca pensei que pudesse acontecer mas, quando a escrevi, pensei 'esta música foi feita para o palco do Festival'. Tem muitas dinâmicas diferentes, mudanças de ritmo e é um pop um bocadinho diferente.
"Os artistas portugueses estão a mexer-se cada vez mais. Há cada vez mais música portuguesa"
Porquê INÊS APENAS, em maiúsculas?
É um bocado um contrassenso. Parece que estou a diminuir-me. INÊS APENAS, sou só eu que estou aqui, a fazer a minha música, no meu cantinho. Porque sou eu que faço tudo, componho, escrevo as letras, toco e canto. Veio um bocadinho daí e, porque não queria usar nenhum dos meus apelidos, ficou essa brincadeira do INÊS APENAS. Eu queria ser só INÊS e percebi que o APENAS começou a ficar presente na cabeça das pessoas e a maiúscula é só para tornar visualmente mais impactante.
Como é que música surge na sua vida?
A música sempre esteve muito presente. Os meus pais sempre me colocaram muita música para eu ouvir, desde criança, música francesa principalmente. É das memórias de infância que mais tenho presente. Comecei com a guitarra e, depois, fui para o Conservatório de Música de Leiria, onde aprendi piano clássico. Ganhei uma paixão enorme pela música e, depois, foi sempre a subir. Fui fazer a licenciatura em piano clássico no Porto, na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo. Na realidade, eu sou pianista. Não sou cantora em lado nenhum (risos)! A parte do canto veio muito recentemente. Estudei canto jazz durante três anos, enquanto estava a fazer a licenciatura, então agora conciliei os dois, o que sempre fez muito sentido para mim. A INÊS APENAS surgiu no final de 2021.
Quando é que decide que não vai só tocar, que vai cantar e fazer música pop?
Resposta sincera: estava a sair de um relacionamento que não correu muito bem e senti que tinha de deitar coisas cá para fora e que não podia ser só através do piano. Comecei o INÊS APENAS, que foi um bocadinho uma libertação. Compus muita música na pandemia. Para resumir, foi no confinamento que a INÊS APENAS surgiu com muita letra, com muita música diferente e com o objetivo de criar um pop alternativo mas não deixando de ser, ao mesmo tempo, mainstream.
Na sua semifinal, exibiu um rádio com a frase "nem 30%", uma forma de protesto contra o fim da obrigatoriedade das rádios terem playlists com, pelo menos, 30% de música portuguesa.
Caiu-me muito mal essa notícia porque o timing foi terrível. Estávamos em plena semifinal do Festival e, no dia a seguir, surge uma notícia que corta os pés aos artistas portugueses. Achei muito importante [fazer esse protesto], primeiro porque eu vim da livre submissão. Sou uma artista independente, como muitos outros neste País, que fazem música todos os dias. E como é que é possível haver quem diga que não há música e produção suficiente em Portugal? Acho que os 30% é o mínimo. Acho que não falei só por mim, falei por muitos amigos e artistas que sei que concordam com isso. Foi um abanão, do género, 'estamos aqui a fazer um festival cheio de música portuguesa e sai esta notícia que parece do outro mundo?'. Achei importante porque os artistas portugueses estão a mexer-se cada vez mais. Há cada vez mais música portuguesa. Acho que nunca houve tanta. O que eu quero passar é que criar espaço para mais não é retirar espaço a ninguém. Enquanto artista independente foi essa a mensagem que eu quis passar.
"A minha mãe partiu há um ano e foi mesmo importante para mim dedicar-lhe esta passagem à final"
Após passar à final, dedicou essa conquista à sua mãe, através de um story no Instagram.
A minha mãe partiu há um ano e foi mesmo importante para mim dedicar-lhe esta passagem à final. Foi uma pessoa que sempre me apoiou e que me continua a apoiar. E a toda à minha família, no fundo, que está cá para mim. Nos momentos mais desafiadores, e o Festival da Canção é um momento muito importante para mim, e sem dúvida que eu senti a minha mãe quando estava no palco.
Como é que se lida com essa perda, sendo tão nova, e estando a construir uma carreira, uma vida?
Acho que é nos momentos piores, em que perdemos tudo, que temos de lutar por nós. No meu caso a minha mãe é e sempre foi a minha força. Acho que a perda faz-nos acreditar mais em nós e faz-nos criar os nossos próprios momentos mais felizes. Tudo passa a ter um outro significado e, de facto, às vezes nós não sabemos a força que temos. Fazer tudo isto, nestes últimos anos, que foram muito difíceis para mim, e estar onde estou, foi porque é preciso acreditar na nossa própria força. E porque há muito amor em tudo o que eu faço.
Quem são as suas influências musicais?
Oiço muita coisa diferente. E acho que a minha música é uma mescla de coisas. Oiço muita música portuguesa, oiço Cláudia Pascoal, MARO, Salvador Sobral mas também oiço Lena d'Água, Rui Veloso. Mas depois também oiço Drake, Rihanna, Rosalía. O pop sempre esteve dentro de mim mas, depois, também oiço Chico Buarque ou Tom Jobim.
Porque é que escolheu aquele visual para o Festival?
Eu queria uma roupa impactante. O styling foi da C'est Fantastique, a Sara Soares, o designer que trabalhou connosco foi o Luís Capelo, e eles trabalharam em conjunto para criar um mood um bocadinho alienígena, fora deste mundo. Queria que fosse uma coisa impactante, com luz, com uma cor impactante também. Não queria uma coisa escura nem queria vermelho porque não consigo vestir vermelho. De facto, aquele verde foi uma cor que me tranquilizou e, ao mesmo tempo, que me remetia para um universo diferente. Acho que, com a atuação, ficou lindíssimo, porque tem uma cor que se destacou bastante. Mas, ao mesmo tempo, com um design com força, quase parecia um Power Ranger em palco.
Se não for a INÊS, quem gostava que ganhasse?
Tenho que dizer que, se a Cláudia Pascoal ganhasse, era muito merecido. Primeiro, com toda a história que ela tem em relação à Eurovisão, acho que ela encontrou a estética dela e a mensagem que quer passar é extremamente forte. Não é só por ser minha amiga. Acho que tem um à vontade em palco absolutamente único e se ela ganhasse, ficaria muito feliz. Se não fosse ela, acho que a Mimicat está a arrasar com tudo. Das duas, acho que sim.
E se for a INÊS, como é que vai ser?
Se for eu é muito complicado, é uma loucura. Nem consigo processar essa pergunta porque também ainda não aconteceu a final e estamos todos muito nervosos. Se for eu, seria uma honra enorme representar Portugal e ficaria mesmo fora de mim, ia prometer uma atuação incrível em Liverpool, com outro staging. Acho que a letra da minha canção é muito forte também. Acho que ia levar essa mensagem o mais longe possível.