Um livro pode muito bem ser um amigo, e não só pela companhia que nos faz – também pede tempo e muita dedicação. Mas o YouTube e o TikTok são mais rápidos, e as séries, assim como assim, também contam uma história. Pôr os miúdos a ler pode ser difícil, e até já foi mais fácil fazê-lo com os adultos. Para nos ajudar com esta tarefa, recrutámos uma mãe, uma psicóloga e uma professora de Português.
Sónia Morais Santos, autora do blog "Cocó na Fralda" e mãe de quatro filhos, acredita que "há livros que não podem passar ao lado de certas idades", e que ninguém vai ler "Os Cinco" aos quarenta anos. Ao perceber que, para além de terem crescido num ambiente em que os livros não são (nem nunca foram) estranhos, os filhos não pegavam num livro por iniciativa própria, tomou uma atitude – criou um "clube de leitura" em casa.
Todos têm de ler um livro por mês (os pais também), e todos os meses há uma tertúlia em que cada um faz uma apresentação do livro que leu – e não, não pode ser um resumo encontrado no Google. Quanto aos livros, num mês escolhem os pais, noutro escolhem os filhos. Tudo para evitar "escolhas duvidosas".
Quem não ler o livro do mês, fica sem acesso a tablets, computadores e telefones, no mês seguinte. A questão da obrigatoriedade da leitura não preocupa a blogger, que acredita que este tipo de leituras "pode começar como uma obrigação, mas acabar por derivar num prazer". Deu, como exemplo, o filho mais velho, que já toma a iniciativa de procurar livros, e cada vez mais complexos.
Para Rita Castanheira Alves, a história não é bem assim. A psicóloga clínica infanto-juvenil e de aconselhamento parental disse à MAGG que "ler por obrigação pode resultar, mas só até uma certa idade", e que os hábitos de leitura deverão ser incutidos de forma gradual, sem exigências nem imposições, uma vez que obrigar as crianças a ler pode impedir o desenvolvimento do gosto pela leitura.
Mas há uma distinção a fazer: uma leitura que resulte, não de uma imposição, mas de uma negociação com os pais, pode derivar num gosto real pela leitura. É importante que ela esteja associada a memórias e momentos bons, e por isso mesmo, um castigo terá sempre menos sucesso, se o objetivo for o de fazer dela um hábito.
Os livros devem entrar na vida das crianças mesmo antes de elas saberem ler
A "Psicóloga dos Miúdos" sugere que se coloquem livros adequados a cada faixa etária (desde sempre) perto das crianças, começando com os indicados para os mais novos, com poucas palavras e muitas ilustrações – é importante que os livros não sejam um objeto estranho. Mais tarde, o momento da história para adormecer também é crucial, mas tem de haver um envolvimento da criança com a leitura – uma leitura interativa, em que se dá atenção não só ao que está escrito, mas também às imagens, e em que se fazem perguntas sobre a história.
Para os mais crescidos que não tenham adquirido hábitos de leitura, também há soluções: ler revistas, artigos de jornal, visitar bibliotecas e livrarias ou falar sobre livros. Os pais têm um papel preponderante – podem ajudar na escolha dos livros, tentando sempre ir ao encontro dos interesses dos filhos, e dando-lhes a conhecer livros que eles próprios tenham gostado naquela idade.
Salomé Carvalho, professora de Português do primeiro ciclo do ensino básico (num colégio), disse à MAGG que, no que toca a incentivar as leituras, o professor da língua materna tem um papel determinante, mas "não há nenhuma fórmula. Era bom que houvesse".
Antes de começar a ler um livro, será uma boa estratégia explorá-lo enquanto objeto. Tal como Rita Castanheira Alves, a professora acha importante que o livro não seja algo estranho. Por isso, deve perder-se tempo a explorar a capa, as ilustrações, o título e nome dos capítulos. Fazer de tudo para que haja interesse pelo livro, mesmo antes de se iniciar a leitura.
Depois, também a família pode ser um excelente facilitador de leitura. É boa ideia que haja leituras em conjunto, feitas em voz alta, e a terminarem precisamente naquele momento em que toda a gente quer saber o que vem a seguir. Tal como nas séries, é também isso que nos mantém presos: a curiosidade.
No que toca à escolha dos livros, Salomé Carvalho avançou que "quando queremos pôr alguém a ler, é importante escolher o livro certo. Se estivermos a falar de crianças, devemos ter sempre em mente que elas continuam a ser crianças, e a adorar clichês".