Vanessa Martins e Marco Costa estão juntos há quase seis anos e formam um dos casais mais acarinhados pelo público português. Ela é atriz que virou influenciadora digital e empresária, com uma revista e um site, ele é um pasteleiro bem-sucedido com várias lojas e figura presente em muitos programas de televisão.
Os filhos estavam nos planos mas a dificuldade em engravidar era uma constante. Numa crónica escrita na sua revista, “Frederica”, Vanessa Martins revelou sofrer de endometriose, doença que a fez adiar o sonho de ser mãe. A influenciadora revelou que, depois de perceber a dificuldade para engravidar, decidiram passar às consultas e exames para perceber se estava tudo bem. Os resultados vieram inconclusivos e o casal decidiu recorrer à inseminação artificial. “Estávamos muito esperançosos. Mas não ‘pegou’”, relembrou Vanessa na sua publicação.
Pelo meio ainda viriam a juntar-se sintomas como dores abdominais fortes, vómitos e sensações de desmaio. Terá sido nessa altura que o diagnóstico de endometriose chegou e também a razão pela qual era tão difícil ter filhos. “Foi detetada endometriose na zona pélvica. Possivelmente, é essa a razão para não engravidar”, explicou a influenciadora portuguesa.
Vanessa Martins está longe de ser a primeira figura pública portuguesa a expor a doença e confessar que sofre de endometriose. Em 2018, Raquel Strada explicou que sofria desta e de outra doença no programa “Queridas Manhãs” e que isso tornaria complicado engravidar. “Mesmo que eu quisesse ter filhos não era fácil para mim engravidar. Eu tenho endometriose, tenho hipotiroidismo. Só que eu lido bem com isso, sou uma pessoa super bem-disposta e positiva”, disse na altura.
Terá sido Raquel Prates a primeira figura pública a falar publicamente da doença, numa entrevista que deu à plataforma “Capazes”. A empresária deparou-se com um diagnóstico tardio (terão sido precisos cerca de 15 anos para se chegar à conclusão que sofria da doença) e com a infertilidade causada pela doença. À MAGG, explica que foi exatamente a dificuldade em engravidar que a levou a fazer exames específicos que determinaram que sofria da doença.
“Na minha altura, julgo que não existia na comunidade médica uma sensibilidade grande em relação à doença”, diz. “A doença foi piorando, tendo em conta que é uma doença crónica, e tirou-me qualidade de vida em muitos momentos”.
Mas o que é na verdade a endometriose? “A endometriose é uma doença que consiste na presença de tecido endometrial fora do local habitual: a cavidade uterina”, explica à MAGG a ginecologista Fátima Faustino do Hospital Lusíadas Lisboa. Este tecido vai até os ovários, intestino e outros órgãos pélvicos e abdominais e, sempre que a mulher menstrua, esses focos de tecido também sangram. “O sangramento conduz a uma reação inflamatória que desencadeia a formação de tumores”. Apesar de serem benignos, têm consequências graves.
“Alteram a anatomia da cavidade pélvica, conduzem à formação de aderências entre os órgãos, por exemplo, entre os ovários e as trompas — uma das causas de infertilidade. E desencadeiam mecanismo de dor”, explica.
Dor. O sintoma mais evidente da endometriose
Raquel Prates esclarece que, antes de ser diagnosticada, tinha muitas “queixas”, mas que eram confundidas com os sintomas de uma menstruação normal. “Tenho hemorragias gigantes, nalguns casos quebras de tensão, diarreias, inchaços”. E foi numa dessas vezes em que o inchaço era de tal ordem, que a imprensa pôs a hipótese de a empresária estar grávida. “Eu não estava grávida, eu estava na crise de endometriose”, recorda.
Para além destes sintomas, existe outro importante que deve ser levado em conta: a dor. Este sintoma pode aparecer de várias formas, mas é essencial que seja levado em conta. “Pode ser uma dor que surja durante a menstruação, a chamada dismenorreia. É normal que as mulheres tenham alguma dor menstrual, mas não é normal terem uma dor tão intensa que não passa com os analgésicos comuns e que se prolonga por toda a menstruação”, alerta a ginecologista. “Depois há mulheres que têm dor quando têm relações sexuais, que é uma dor muito característica, dor a urinar, queixas de infeções urinárias de repetição com análises sempre negativas”.
“Há mulheres com um quadro de cólon irritável durante anos e no fundo o que têm é uma endometriose intestinal. Há várias apresentações da doença mas sempre referidas à dor”, explica a médica, acrescentando que a infertilidade é também uma das manifestações mais frequentes.
Para a especialista, o mais importante é perceber a história da paciente e detetar alguns sintomas à priori. “Se tivermos uma história de dor que vem desde a primeira menstruação, e que ao longo do tempo se tiver agravado, será um sinal de alarme. Ou então as mulheres que tomaram a pílula durante muitos anos e que quando quiseram engravidar pararam e a dor aumentou. Pode ser outro sinal de alarme”, refere.
“Primeiro devemos ouvir a história da paciente, depois observá-la”. E será nessa observação que o especialista deverá estar atento para encontrar sinais da doença, nomeadamente “um útero que dificilmente se mobiliza, dor durante a observação ginecológica, pequenos nódulos na vagina”. Estes são alguns sinais que podem chamar a atenção para a doença mas a ginecologista alerta que as ecografias normais que são feitas em consultas ginecológicas de rotina não excluem a doença. Por isso, para além das alterações acima descritas, o diagnóstico de endometriose deverá incluir uma ecografia pélvica com sonda vaginal e uma ressonância magnética sendo que o diagnóstico só será definitivo depois de uma análise histológica dos fragmentos dos tecidos.
A médica alerta que a análise desta doença deverá ser muito “individual”. “Não podemos pensar que temos a mesma resolução para todos os casos. Daí que chamemos à doença a doença das mil faces, porque há várias formas de apresentação”.
Um diagnóstico de endometriose significa infertilidade?
Fátima Faustino explica que não. “Mulheres com endometriose podem engravidar espontaneamente. Só existe infertilidade num terço dos casos”, explica. A doença afeta uma em cada dez mulheres em período fértil e apenas um terço delas sofrerá de infertilidade devido à doença.
E mesmo neste caso “não é impossível” gerar uma criança. “Tudo depende dos sintomas”, explica a ginecologista à MAGG. Se os principais sintomas forem a infertilidade, podem realizar-se técnicas que ajudem a engravidar, mas se além da infertilidade as mulheres experienciarem a dor referida acima, é necessário recorrer a uma cirurgia.
“A única solução nas mulheres que associam a dor e infertilidade é uma terapêutica cirúrgica que permita restabelecer a anatomia pélvica, ou seja, libertar as tais aderências, colocar os ovários no local certo, libertar as trompas”. Depois desse tratamento espera-se que as doentes engravidem num curto espaço de tempo. Caso a dificuldade permaneça, será necessário recorrer a “técnicas de procriação medicamente assistida”.
No caso de Raquel Prates, a doença ficou-lhe com a vontade de ter filhos. “Obviamente que isto tem de ser passo a passo. Não vou dizer que inicialmente foi de ânimo leve. Achei que era uma situação injusta”, diz à MAGG. “Mas depois aceitei e vivo normalmente. As crises às vezes fazem relembrar-me essa situação, mas para mim é um assunto arrumado”. Sobre o facto de ser um rosto público no que toca à endometriose, a empresária quer chamar a atenção para a doença e sensibilizar as pessoas.
“Só queria mesmo chamar a atenção no sentido de haver uma maior atenção ao diagnóstico, porque pode-se prevenir não só a progressão da doença, mas também muito sofrimento. Todo o processo é de sofrimento. No meu caso foi. Tudo isto poderia ter sido antecipado com o diagnóstico precoce”.