"Se a sua vida está uma monotonia que pretende ver quebrada, tente o 'All You Need is Love', venha ao nosso bar. Mas se está separado de alguém que deseja muito, não fique de braços cruzados. Tudo é possível, se vier ter connosco." Através de um telefone fixo "da rede de Lisboa", o programa da SIC, canal que tinha nascido há dois anos, prometia ser em 1994 aquilo que hoje em dia as aplicações de encontros como o Tinder ou o Bumble fazem: juntar pessoas solteiras. O bar do "All You Need is Love" era apenas um dos segmentos do programa mas também o mais polémico. Mas já lá vamos.
Produzido pela Endemol [a mesma produtora que traria para Portugal, seis anos mais tarde, o "Big Brother"] o programa estreou-se na SIC em 1994. A primeira temporada foi apresentada por Lídia Franco, as duas seguintes por uma jovem estreante em televisão chamada Fátima Lopes.
À MAGG, Lídia Franco relembra o convite feito por Emídio Rangel, diretor de programas da SIC à época. "Ele chamou-me, muito entusiasmado, disse que acreditava que eu seria a pessoa ideal, pelo meu poder de comunicação. Mostrou-me uma cassete daquele programa, que existia noutros países. Eu fui ver, disse 'não sei se sou capaz'. Não era propriamente a minha praia. Depois eles disseram-me qual seria o cachê, que eu nunca tinha ganho em toda a minha vida de atriz. Os atores ganham um décimo do que nesses programas (risos)!", recorda a atriz que, na altura, tinha 50 anos, e tinha acabado de participar na novela da RTP "A Banqueira do Povo".
A atriz não se lembra do valor mas tem a certeza de que nunca tinha sido tão bem paga. "Dei o meu máximo, aprendi imenso. A produtora Endemol, que também estava há pouco tempo, foi absolutamente impecável. Aprendi a todos os níveis, também humanamente, que é importante, ao sentir as emoções das pessoas que fui encontrando por esse País fora", recorda.
Num País que tinha vivido três décadas apenas com dois canais (a RTP2 nasceu em 1968), tudo o que acontecia na primeira estação privada tinha um impacto social difícil de imaginar nos dias de hoje, em que as polémicas se esvanecem à velocidade de um tweet. Lídia Franco recorda um episódio em particular, durante uma gravação de exteriores. "Houve uma situação em particular no Norte, em que tivemos de fugir. O entusiasmo da multidão era tal que tivemos de fugir para não sermos esmagados!", conta a atriz. "Não foi nenhuma tragédia, aquilo era uma novidade".
A novidade de "All You Need is Love", como aponta Lídia Franco, era a sua parecença com o que mais tarde viríamos a designar por reality shows. Pessoas anónimas a exporem as suas histórias de vida, os seus sentimentos, amores, que podiam ou não ser correspondidos, perante um País (que, ao contrário do que acontece agora, só tinha três canais de televisão). "Eram os encontros que se faziam, era o chamado reality show".
Lídia Franco saiu a meio do contrato "de forma o mais amigável possível". "Aquilo não era propriamente a minha praia, de modo que fui muitíssimo bem substituída pela Fátima Lopes, que passou a ser a alma do 'All You Need is Love'".
O bar do "All You Need is Love" e os insultos nos jornais
Um dos segmentos que mais polémica causou na altura era o chamado bar "All You Need is Love", no qual acontecia uma espécie de speed dating. No programa anterior, era exibido um vídeo de um solteiro (ou solteira), no qual demonstrava interesse em procurar parceiro e, no episódio seguinte, eram proporcionados encontros no bar do programa.
Depois de conversas com os candidatos, o proponente escolhia um, ou uma, e o par recém-formado recebia o envelope "All You Need is Love", que proporcionava um jantar romântico. Os rejeitados tinham direito a um copo de champanhe.
Lídia Franco recorda a polémica gerada por este segmento, "coisa que hoje em dia é o mais simples que há". "Proporcionávamos o encontro de duas pessoas que, depois, se quisessem, era-lhes oferecido um jantar, e eles eram livres de aceitar ou não. Por causa disso, fui insultada nos jornais por grandes cabeças desta terra". A atriz, que preferiu não nomear os cronistas em causa, relembra as críticas de que foi alvo. "Diziam que o que eu estava a fazer era uma coisa imoral, não era próprio de mim, Lídia Franco. Eram duas pessoas que eu considero ao máximo mas que, enfim, reagiram daquela maneira", relembra a atriz.
O sururu causado pelo programa sentia-se não só na estrada, em que o público se entusiasmava cada vez que via a carrinha de exteriores do "All You Need is Love" mas também na sociedade. "Foi um sururu na medida em que nunca tinha havido um programa daquele género em Portugal. Aquilo foi ao ponto de ter sido confundido com outra coisa de que me acusaram essas duas pessoas".
Nem tudo era paixão e corações e havia momentos constrangedores, como no episódio que pode ver abaixo, em que a jovem Ana Paula expôs na televisão nacional a sua paixão por Renato, que conheceu durante as férias no Algarve. Quando confrontado com o vídeo, Renato parece claramente desconfortável com a declaração de amor, além de aparentar nem sequer se lembrar bem de quem a jovem era.
"All You Need is Love" servia também de espaço para pedidos de desculpas entre cônjuges. Um dos segmentos mais emocionantes proporcionava a reunião de pessoas que mantinham relações à distância. As surpresas (como cantar uma música romântica ao parceiro) também eram um dos pontos altos do programa da SIC.
A música, com convidados especiais como Laura Pausini (que era a estrela musical do momento) estava muito presente no formato. O momento da atuação servia de banda sonora a uma verdadeira matiné, com pares (heterossexuais, claro), que se formavam no momento e eram constituídos por elementos da plateia, a dançarem agarradinhos no set do programa.
"All You Need is Love" foi o segundo projeto televisivo de Fátima Lopes, logo a seguir a "Perdoa-me". "As histórias que me marcavam mais eram as histórias dos reencontros. Naquela altura não existiam telemóveis, havia muitas situações que não têm nada que ver com os dias de hoje. Cada vez que havia um reencontro, um casal que já não se via há algum tempo, aquilo era uma choradeira pegada em estúdio, mas era qualquer coisa de muito especial. Os reencontros faziam-nos perceber que o mundo era muito mais distante do que agora achamos", explicou a apresentadora no programa das manhãs da SIC "Casa Feliz".
Como vai ser o novo "All You Need is Love" ?
O que sabemos sobre este novo "All You Need is Love"? Estreia-se este domingo, 9 de outubro, com uma emissão especial em horário nobre, logo após "Isto é Gozar com Quem Trabalha", e junta duas gerações de apresentadores, Fátima Lopes e João Paulo Sousa. A MAGG contactou a estação de Paço de Arcos, que não adiantou qualquer informação sobre o dia (ou o horário) em que serão exibidos os próximos episódios do programa.
Desta vez, o programa não vai centrar-se apenas em relações amorosas mas "em todos os tipos de amor", como explicou Fátima Lopes no "Casa Feliz" desta sexta-feira, 7 de outubro. "Um dos reencontros que está neste primeiro programa deu choradeira. É de continentes diferentes", revelou João Paulo Sousa. O apresentador de 34 anos que tinha 6 quando o original estreou, revela que "não há dois programas iguais, não há duas histórias iguais." Este é um programa que toda a família pode ver, bonito, com emoções boas", salienta João Paulo Sousa.
Mais do que o romance, o novo "All You Need is Love" vai privilegiar os afetos e as demonstrações de gratidão. E, claro, colocar o conflito e o constrangimento de lado. "Este programa tem zero competitividade. Não há ninguém contra ninguém, é tudo a favor. São coisas tão simples como dizer a alguém 'amo-te, obrigada por fazeres parte da minha vida'. É tão simples mas toca-nos. Acho que precisamos disso nas nossas vidas, de nos lembrarmos de dizermos às pessoas que gostamos delas", reforça ainda João Paulo Sousa.
Apesar de terem passado três décadas, o formato da SIC conta, além de Fátima Lopes, com alguns elementos da equipa original. É o caso de Patrícia Louro, atual produtora executiva da Endemol, que fez parte da equipa de pesquisa e conteúdos da segunda temporada, em 1995. "Hoje tenho o prazer de ser a produtora executiva do programa, num regresso adaptado aos nossos dias, retratando o amor em todas as suas formas e dimensões", explica à MAGG.
Patrícia Louro explica que o maior impacto do formato, na década de 1990, foi "retratar histórias de amor com as quais o público se identificava". "Todos amamos alguém, todos queremos que alguém nos ame. Para além de o programa servir de veículo para demonstrações de amor, também incluía declarações públicas de amor, que surpreendiam os visados. Umas corriam muito bem, outras nem tanto. O facto de o programa espelhar a verdade dos sentimentos foi o seu grande trunfo", salienta a responsável da produtora executiva da Endemol, acrescentando ainda que o formato "abriu portas e mentalidades para se falar abertamente do amor, sem pudores e com o coração."