Em agosto de 2017 Catarina Silva, da agência DioDrive, no Porto, vendeu um pacote de sete dias para Agadir, em Marrocos. Esta cidade no sul do país parecia ter tudo o que o casal com um filho pretendia: umas férias descansadas num destino conhecido pelo calor, areal extenso e água quentinha. Só que não foi isso que aconteceu. Assim que chegaram ao resort de quatro estrelas, telefonaram à agente de viagens de 24 anos.
“A senhora ligou para a agência para falar comigo e disse-me: ‘Catarina, o mar está cheio de peixes. Cheio de peixes’”, conta Catarina Silva à MAGG. “Respondi-lhe: ‘Pois, sabe, os peixes moram no mar. Quando procura um clima com água mais quente, é natural que os encontre.”
A resposta não convenceu a cliente com cerca de 30 anos. No dia seguinte voltou a ligar. E no outro. E no outro a seguir. Em cada um dos sete dias da viagem, Catarina Silva recebeu uma chamada de Agadir. O problema era sempre o mesmo: peixes. “Ainda por cima a piscina estava com muita gente, portanto tanto a mãe como o filho não foram à água. Ela disse que passou a semana inteira no quarto.”
A trabalhar na área do turismo há dois anos, Catarina Silva recebeu algumas reclamações engraçadas — e pedidos estranhos também. “Tive uma cliente que chegou aqui e me disse: ‘Olhe, eu adorava imenso ir para São Tomé, mas uma colega contou-me que, primeiro, a água custa 3€. Consegue precisar-me isso? E segundo, é verdade que aquilo é só pretos?’.”
Catarina Silva explicou-lhe que, como é natural, em São Tomé vivem maioritariamente pessoas negras. É tão normal encontrá-los por lá como eles virem cá e encontrarem brancos, disse-lhe. Infelizmente, parece que nem toda a gente consegue interiorizar isso. Foi o caso de outra cliente que a procurou na agência em janeiro deste ano, com o objetivo de fazer uma viagem para Cabo Verde.
“Perguntei-lhe para que ilha queria ir e ela respondeu-me: ‘Para a que tiver menos pretos. E que não haja funcionários pretos a atender-me’.”
Catarina Silva tentou explicar-lhe que não existe nenhuma ilha em Cabo Verde que não tenha naturais de lá. A cliente com cerca de 50 anos não gostou da resposta. “Vai em agosto para Palma de Maiorca.”
Susana Guerreiro trabalha na área do turismo há mais de 20 anos. As queixas mais frequentes estão relacionadas com as condições meteorológicas. “São recorrentes”, explica a agente de viagens de 43 anos à MAGG. “Vento, chuva, que o clima estava muito desagradável.”
O que lhe aconteceu no ano passado, porém, foi um bocadinho mais longe do que é habitual. Uma cliente com cerca de 60 anos comprou um pacote de férias para a República Dominicana, e quando regressou dirigiu-se imediatamente à agência em Lisboa para reclamar. Porquê? Porque durante dois dias não conseguiu entrar no mar devido à ondulação. Não se tratou propriamente de agitação marítima — as águas só mexiam um bocadinho mais do que era o seu gosto.
“A cliente gosta do mar calminho. Para nadar, boiar, estar à vontade. Como a ondulação estava um pouco mais agitada, a senhora ficou um pouco chateada. Eu estava embasbacada. ‘Pois, realmente lamento mas são coisas que fogem do nosso controlo’, disse-lhe. Ela respondeu-me: ‘A ver se para a próxima tenho mais sorte. E vocês também podiam ter dado mais informação.”
“As gavetas da mesinha de cabeceira são demasiado pequenas. Não consigo guardar as minhas cuecas e as do meu marido.” Parece uma reclamação surreal, mas aconteceu mesmo a uma agente de viagens da Órbita Viagens, em Guimarães. A trabalhar na área há 15 anos, foi em agosto passado que recebeu este telefonema de uma cliente habitual. A mulher na casa dos 50 anos tinha arrendado uma vivenda T3 no Algarve para toda a família, e logo no primeiro dia ligou a queixar-se.
“Ela reclamava que era tudo muito pequeno: a casa, o mobiliário. A indignação dela era que não tinha sítio para guardar tudo o que tinha trazido.”
Stela Gomes, da agência Costa de Prata, em Pombal, só recebeu uma reclamação em 33 anos de carreira. Veio de um casal em lua de mel que comprou um pacote de sete noites na República Dominicana. “Eles ficaram num tudo incluído e queixaram-se porque, diziam eles, no resort metiam calmantes nas bebidas para os hóspedes não beberem demais”, conta à MAGG. Este caso aconteceu há 15 anos. “Foi a única vez que me abriram o livro de reclamações.”
Pedidos estranhos e histórias caricatas não lhe faltam. E algumas são mesmo difíceis de esquecer. Foi o caso de uma professora primária reformada que comprou uma viagem em 1998 para a China, e que se queixou das condições dos Guerreiros de Terracota. “Gostou, mas achou que não estava bem conservado”, ri-se Stela Gomes. “Também foi ter com o guia e perguntou se não havia um sítio mais barato para enviar uma carta do que os Correios. Está bem que no Oriente é normal regatear, mas é no mercado.”
Fazer confusão com destinos também é frequente. Foi o caso de um casal em lua de mel na Ilha do Sal, que ligou para a agência a queixar-se de que não havia palmeiras. Ou aquela cliente que chegou ao Funchal e comentou que achava que iam para Ponta Delgada. Mais preocupante foi talvez a viagem que Stela Gomes fez há dois anos com um grupo para o norte da Tailândia.
“Houve um cliente, na casa dos 60 anos, que me perguntou todos os dias quando é que íamos para a ilha. Acho que comprou a viagem para fazer frente ao filho, que tinha ido para as praias. Mais engraçado foi estarmos no Dubai, em trânsito para vir para Lisboa, e ele perguntar-me: ‘É agora que vamos para a ilha?’. Ele não tinha a menor noção de onde é que estava. Podia ter-lhe dito que aquilo era a Madeira, ele tinha acreditado.”