Em 2020, foi tornado público que o cavaleiro tauromáquico João Moura tinha uma matilha de galgos para corridas. 18 deles fugiram da Herdade de Monforte, em Portalegre, em péssimo estado de saúde. Mostravam sinais visíveis de subnutrição e também de outras doenças.
Patrícia Babo, de 32 anos, acompanhou o caso pela televisão e decidiu chegar-se à frente. Queria pagar os tratamentos a um dos cães. "Eu e o meu marido fazemos reabilitação de galgos que vêm do contexto da caça e da corrida. Como temos alguma experiência com a raça, começou a despertar-nos algum interesse, mesmo a nível de temperamento", disse à MAGG.
"São cães destemidos, muito brincalhões, por norma sociáveis", descreve. "Estávamos em casa, à noite, e vimos um cão com um olhar muito terno. Muito triste, mas doce. Eu fotografei e disse ao César", conta. Estavam a pedir padrinhos para estes animais e Patrícia e César intervieram.
Os cães estavam n'O Cantinho da Milú, um abrigo de animais em Setúbal. O casal entrou em contacto e passou a comparticipar com um valor nas despesas daquele cão cinzento. Por esse motivo, puderam escolher o seu nome. "Anúbis é o Deus da morte e, se ele sobreviver, é um nome com significado", pensaram.
"Os cães vinham em bastante mau estado. Ele veio com um fungo que atingia o pelo e a pele, tinha muitas falhas de pelo, muitas crostas", recorda Patrícia. Quando Anúbis começou a recuperar, O Cantinho da Milú perguntou ao casal se quereriam adotá-lo. "Na altura, tínhamos três cães. Não tínhamos de todo pensado nisso, mas fez-nos sentido", reconhece a atual dona de Anúbis.
O abrigo já tinha "recebido muitos pedidos de adoção para aquele cão", mas estava com dificuldade em discernir se seriam de confiança ou apenas pessoas que queriam recuperar o cão para corridas, por exemplo. Depois de se conhecerem pessoalmente, a decisão ficou tomada. "Mal nos viu, ficou super feliz. Não nos largou", recorda Patrícia.
Findos os tratamentos, Anúbis foi para aquele que seria o seu novo lar. "Estranhou andar de carro e o movimento da cidade. Tinha bloqueios de parar no meio da rua durante 20 ou 30 minutos", descreve a dona. Eventualmente, tudo isso passou. "Sempre foi um cão muito sociável, sempre se chegou muito às pessoas e procurou muito miminho", acrescenta.
Atualmente, este galgo inglês azul tigrado tem 7 anos e "até à data, não manifestou qualquer tipo de problema de saúde". Pelas atitudes, principalmente o quanto gosta de pessoas, os donos acham que "possivelmente, não foi mal tratado fisicamente". "Foi claramente negligenciado", assumem, referindo-se ao tempo em que estava aos cuidados de João Moura.
Um dos cães da matilha de 18 acabou por morrer e João Moura foi acusado de 18 crimes de maus tratos a animais de companhia pelo Ministério Público. Esta acusação surgiu em 2022, mas ainda ninguém foi condenado, assim como refere o "Público". Este tipo de corridas continua a ser legal.
"Acho que o destino disto vai ser o arquivamento do processo. É pena. Estes animais, tal como todos os outros, merecem justiça. Acho muito penoso que seja assim", desabafa Patrícia, que adianta que existe "uma percentagem muito grande de galgos que são extremamente mal tratados em Portugal".
"Estes animais passaram por aquilo que nenhum animal deve passar na vida", reforça. Ao divulgar o percurso de Anúbis, quer que "as pessoas não se esqueçam de que existiram 17 animais que foram tirados de casa de uma pessoa que continua a fazer a vida impávida e serena, sem consequências".