Depois da notícia que chocou o País, acerca de Nuno da Silva, ex-concorrente do “Love on Top” que tentou matar o seu filho de 5 anos e que, no mesmo dia, fez um relato no seu Instagram dos abusos que sofreu na infância e das várias tentativas de suicídio, a MAGG falou com uma especialista para entender se os abusos na infância podem tornar crianças em adultos violentos ou/e abusadores.
O homem de 31 anos terá forçado o filho a ingerir combustível e medicação, tentando sufocá-lo em seguida, na segunda-feira, 14 de outubro. Numa publicação no Instagram relatou os inúmeros abusos que sofreu na infância e as várias tentativas de suicídio.
“Comecei a sentir-me distante, com raiva, ódio, eu com essa idade foi a primeira vez que me tentei matar… tomei um líquido de lavar a roupa. Havia momentos que estava bem, mas havia momentos em que eu saía de mim, não conseguia controlar as minhas ações, só depois de as ter é que tinha noção do que estava a acontecer (...) Eu olhava nos olhos dos meus filhos e, quando me diziam que me amavam e eu era muito bom pai para eles, eu morria, porque sabia que, num dia de loucura, eu ia tirá-los deste mundo para eles, no futuro, não sofrerem (...)”, escreveu.
“O pai pode ter agido com um comportamento dissociativo. De facto, o trauma pode, em alguns casos, levar a comportamentos violentos e perigosos devido à raiva e ao ressentimento”, explica à MAGG Carolina de Freitas Nunes, psicóloga clínica na CogniLab.
Os sinais de alerta
Os sinais de alerta são, muitas vezes, ignorados porque “ainda há muitas pessoas que acreditam que ‘cão que ladra não morde’, e os sinais não devem mesmo ser desvalorizados”, explica a psicóloga. “Este homem já devia ter dado sinais e, possivelmente, este não foi o primeiro comportamento violento e perigoso”, acrescenta.
Um passado de abusos e violência por si só já é um sinal de alerta. "Estas pessoas, por norma, são mais reativas e, na psicologia, estas chamadas de atenção e as ameaças que a pessoa vai fazendo são levadas com seriedade e os profissionais devem ser sempre alertados", refere a especialista.
Porquê replicar o trauma?
“Este comportamento foi uma forma de projeção do trauma do pai que vê o filho de forma distorcida”, referiu Carolina de Freitas Nunes. Segundo a especialista, a falta de suporte emocional na infância faz com que a pessoa vítima dos abusos se configure num quadro de stresse pós-traumático, que leva a pessoa a ter comportamentos destrutivos com ela e com os que a rodeiam.
O tratamento psicológico ou psiquiátrico adequado pode tratar estes traumas e evitar um ciclo de violência. Mas, para os homens, é mais difícil procurar ajuda.
“Os homens têm tendência a fechar-se mais. Existe um estigma associado à fraqueza quando é um homem a pedir ajuda, parece que se está a inferiorizar”, explica a psicológica, que refere também que os homens acabam por ser menos levados a sério quando relatam abusos.
Por isso, é extremamente importante conversar abertamente com a pessoa para saber se ela está aberta ou não a fazer um tratamento quer seja psicológico ou psiquiátrico. Contudo, mesmo que a pessoa não se mostre disponível, é crucial avisar as autoridades, que têm os meios e a formação adequada para lidar com este tipo de situações, para que não aconteçam casos como este.
“Vai ser difícil os filhos confiarem no pai e em adultos no geral. A figura paterna é suposto dar conforto e transmitir segurança. Estas crianças têm de ter o acompanhamento necessário para não seguirem o padrão do pai”
Carolina de Freitas Nunes destaca, ainda, que estamos a falar de “uma pessoa que está em sofrimento desde o momento em que ocorreu o primeiro abuso". “Falar sobre os problemas não cria mais dores, apenas mostra que a pessoa não está sozinha”, acrescenta.
E os filhos, como é que vão lidar com este trauma?
Quando as crianças são muito jovens, acabam por não ter percepção de que o pai os queria matar, apenas têm a noção de que o pai as maltratou e que foi uma situação fisicamente dolorosa.
“Vai ser difícil os filhos confiarem no pai e em adultos no geral. A figura paterna é suposto dar conforto e transmitir segurança. Estas crianças têm de ter o acompanhamento necessário para não seguirem o padrão do pai”, conclui a psicóloga.