"The madness issue" (edição da loucura). Este é o mote das quatro capas da revista "Vogue" reveladas esta sexta-feira, 3 de julho, para a edição de julho/agosto que traz consigo o tema da saúde mental. Contudo, a edição portuguesa da revista de moda está a ser acusada de se aproveitar das doenças mentais para vender e há várias figuras públicas a pronunciarem-se nas redes sociais.
Uma delas é a modelo Sara Sampaio que comentou a fotografia publicada no Instagram da "Vogue" a 2 de julho na qual anuncia a nova edição: "Este tipo de fotos não deveria estar a representar a conversa sobre saúde mental! Acho de muito mau gosto!".
Depois do comentário que já tem mais 3 mil gostos, Sara publicou um vídeo na sua conta no qual fala sobre os seus ataques de ansiedade e pânico, na sua experiência com as doenças mentais e como a imprensa, particularmente a portuguesa, a fragilizou. “Isto marca-me pela forma como a saúde mental é tratada nas notícias, especialmente nas notícias”, diz.
As criticas da modelo continuaram na página de Instagram da revista este sábado, 4 de julho, data em que a "Vogue" publicou uma descrição na qual explica o objetivo da capa e o conteúdo presente na revista: "A nossa intenção é abrir o tópico da saúde mental e trazer para a mesa de discussão as instituições, a ciência e as pessoas que estão envolvidas com a saúde mental nos tempos que correm".
Na descrição, a "Vogue" acrescenta ainda que "no interior da edição, encontram-se entrevistas e contributos de psiquiatras, sociólogos, psicólogos e outros especialistas na área. A saúde mental é apenas um dos tópicos abordados nesta edição e nunca é confundido com o tema 'loucura', é antes abordado como um lado do comportamento humano". Perante a nova publicação, a modelo Sara Sampaio volta a pronunciar-se.
"Wow, pensava que não podia ficar mais desapontada com a vogue portugal, mas depois li esta 'justificação'. É por respostas e capas destas que muita gente ainda tem vergonha de pedir ajuda psicológica", escreve.
Também a apresentadora Rita Ferro Rodrigues recorreu ao Instagram para se referir à capa como “lamentável”, defendendo que “estigmatiza a saúde mental” e que "remete para os tempos horríficos das lobotomias e dos choques elétricos. A doença mental não se romantiza, nem se glamoriza.”
O tema também já foi comentado por uma especialista em psicoterapia psicanalítica e psicanálise, Sílvia Baptista, no Instagram, fazendo uma reflexão sobre a capa que está no centro da polémica: "Esta capa da @vogueportugal é tudo o que a conversa sobre a saúde mental não precisa", começa. "Não é a glamourizar a saúde mental que a mensagem passa. Não é com filtros fashion e poses estudadas que chamam a atenção para o que quer que seja. Esta capa é pobrezinha, ignorante, provinciana na sua pior expressão", diz a especialista que mostra conhecer bem a realidade dos hospitais psiquiátricos e que nada têm que ver com o que a capa mostra.
"De tão pobre e preguiçosa que é, devia iniciar, pela mão dos seus 'criativos', uma conversa à séria sobre saúde mental. Porque se serve para vender revistas, também servirá para este intuito", acrescenta.
A discussão já chegou ao jornal britânico "The Guardian", que sublinha o “muito mau gosto” da capa portuguesa. A respeito desse artigo o director criativo José Santana diz que se a imagem parece sombria é porque o assunto o é, diz num comunicado enviado ao "The Guardian".
José Santana defende que não há nada de ofensivo na imagem, diz ao jornal "Público", e que aquilo que se vê é a personagem principal a ser cuidada por duas enfermeiras que, no caso, são a mãe e a avó da modelo — Simona Kirchnerova — num hospital psiquiátrico em Bratislava. No comunicado enviado ao jornal britânico José Santana acrescenta ainda que a imagem é uma homenagem aos doentes e aos profissionais de saúde. “Também queremos trazer para o debate as instituições, a ciência e as áreas que hoje lidam com a doença mental”, acrescenta o mesmo texto.
Já a directora da edição portuguesa da revista internacional, Sofia Lucas, reage defendendo que “estão a julgar o livro pela capa", diz ao "Público". “Trata-se de um julgamento precipitado porque as capas são polémicas mas ainda ninguém leu os temas. Abordamos temas importantes”, acrescenta. Já José Santana, no comunicado, diz ainda: “Como director criativo preocupa-me a liberdade artística ser atacada, porque parece que não se pode tocar em nenhum assunto”.