Aconteceu na terça-feira, 8 de junho. Kathlen Romeu, uma mulher negra, designer de interiores e influenciadora digital no Brasil, morreu vítima de uma bala perdida disparada pela Polícia Militar (PM) durante uma operação em Lins de Vasconcelos, a norte do Rio de Janeiro. Tinha apenas 24 anos, estava grávida de 14 semanas e tinha saído daquela região, onde tinha crescido a vida inteira e onde os pais viviam, no final de abril por recear o aumento da violência.

O regresso de Kathlen a Lins de Vasconcelos surgiu com o propósito de visitar a avó materna. As duas caminhavam pelas ruas da região quando uma bala perdida, disparada por um dos agentes da PM durante uma operação, atingiu a jovem, escreve o jornal brasileiro "G1", da Globo.

Apesar de as testemunhas falarem numa operação policial, atualmente proibidas sem justificação previamente comunicada ao Ministério Público, a PM nega, dizendo que foram os agentes que estavam presentes no local a ser atacados, diz o mesmo jornal. A mãe de Kathlen Romeu, no entanto, refuta esta versão dos acontecimentos.

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"Se a minha filha fosse morta por bandido, não falaria nada com vocês porque sei que moro em um lugar que não poderia falar. Então ficaria na minha. Mas não foi. Foi a polícia que matou a minha filha. Foi a PM que tirou a minha vida, o meu sonho", revela Jaqueline de Oliveira Lopes, mãe da influenciadora digital, ao mesmo jornal.

O caso está agora a ser investigado pela Delegacia de Homicídios da Polícia Civil e cinco dos 12 agentes envolvidos na operação estão a ser investigados.

Kathlen Romeu é a mais recente vítima num país que regista cada vez mais mortes de pessoas negras, segundo os dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, no Brasil, citados pelo "G1".

Entre 2008 e 2018, o número de homicídios de pessoas negras aumentou em cerca de 11.5%. Um número que é ainda mais acentuado em operações policias, das quais 80% das mortes dizem respeito a pessoas negras, segundo o mesmo estudo.

A polémica com a loja para a qual Kathlen Romeu trabalhava

Após a morte trágica de Kathlen Romeu, a loja Farm, para a qual a jovem trabalhava, anunciou na quarta-feira, 9, uma campanha de marketing que gerou controvérsia. A ideia passava por fazer reverter o valor das vendas, feitas com o código promocional da jovem, para a família de Romeu.

Apesar da campanha, a empresa garantiu ainda que, paralelamente à ação promocional, iria continuar a prestar apoio à família. O estrago estava feito. Em poucas horas, a publicação original, entretanto editada com um pedido de desculpas, gerou milhares de comentários de revolta contra aquilo que muitos achavam ser um aproveitamento de uma tragédia para gerar dinheiro.

Uma das críticas veio de Andreza Delgado, produtora de conteúdos brasileira. "Não basta a desgraça da dor que é viver o genocídio, a loja ainda decidiu lucrar em cima da história, a tal comissão de cada venda vai para família, mas porque não fazer uma doação direta? Sem falar no lucro, por que raios gerar métrica e marketing em cima da morte dessa jovem negra de 24 anos? Nem no pior filme de terror eu imaginei isso", lê-se na publicação original partilhada na sua página de Instagram.

Numa nova publicação, publicada esta quinta-feira, 10, a loja Farm pediu desculpa pela campanha. "Com vocês, entendemos a gravidade do que representou esse ato e, por isso, retirámos o código do ar [referente ao número usado para usar o desconto de Kathlen Romeu]. Continuaremos dando apoio e suporte à família, como fizemos desde o primeiro momento em que recebemos a notícia".

[twiter url="https://twitter.com/emicida/status/1402423774016905227"/]

Numa altura em que continuam as investigações sobre a operação que tirou a vida à jovem, o rapper Emicida reagiu publicamente, pedindo "justiça por Kathlen".

"A coalizão negra exige responsabilização do governo, do Estado, e do Comando da PM do Rio de Janeiro pela morte da jovem negra, baleada em mais uma operação criminosa", escreveu.