A Boy Scouts of America (BSA), uma das maiores organizações juvenis norte-americanas de escuteiros que data de 1910, vai enfrentar 92.700 queixas de abusos sexuais — número esse que foi fechado esta segunda-feira, 16 de novembro, data decretada pelo juiz à frente do caso para apresentação das queixas.

De acordo com Paul Mones, o advogado de Los Angeles que representa centenas de vítimas, ainda que seja um "um número devastador de casos", que foram além daquilo que ele próprio pensava, como diz ao jornal "Los Angeles Times", o número possa ser ainda maior. Assim, os 92.700 casos podem representar apenas uma fração do número real de vítimas. "O alcance disto é algo que eu nunca imaginaria", afirma.

A instituição com 110 anos de história declarou falência em fevereiro deste ano, de modo a poder enfrentar as despesas judiciais relativas aos casos de abusos sexuais, que aumentaram de mais de 12 mil casos ao longo dos últimos 72 anos para mais de 90 mil num espaço de nove meses. Também nesta altura, a BSA afirmou ter ativos no valor de mil milhões de euros.

A falência da Boy Scouts of America fez com que centenas de casos ficassem suspensos à espera de um potencial acordo global, uma vez que os casos abrangem ainda os estados de California, New York e New Jersey.

A organização, pela qual já passaram mais de 130 milhões de escoteiros, avançou entretanto com um comunicado, isto depois de ter sido divulgado o número final de vítimas até ao prazo estabelecido pela justiça. A decisão causou uma onda de reivindicações nos últimos meses nos media e redes sociais.

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A BSA afirmou estar "devastada pelo número de vítimas afetadas por abusos no passado nos escuteiros e comovidos por todos os que tiveram a coragem de apresentar queixa (...) Estamos de coração partido por não poder acabar com a dor das vítimas... Lamentamos profundamente", acrescentou a organização.

A instituição de escuteiros afirmou ainda que iniciou um processo para os sobreviventes reivindicarem indemnizações. Para isso, a BSA está a desenvolver um plano de reorganização e a estabelecer um fundo de compensação às vítimas, o mais “rapidamente possível”, afirma no comunicado.

Contudo, um outro advogado de defesa das vítimas de abusos sexuais, Andrew Van Arsdale, de San Diego, mantém-se cauteloso quanto à ação da Boy Scouts of America.

"A BSA foi muito eficaz a transmitir a mensagem àqueles que tinham crianças a seu cuidado", disse. "A questão que permanece é se a BSA vai cumprir a sua palavra para melhorar a vida das dezenas de milhares que sofreram. A BSA falhou uma vez quando as vítimas eram crianças. Esperamos que não o façam novamente".

Todas as acusações de violação serão examinadas por "consultores externos" e ainda não se sabe os valores das indemnizações. Em jogo está o valor a que os escuteiros estão dispostos a pagar, uma vez que as seguradoras recusam-se a cobrir as indemnizações, alegando que estas poderiam ter sido evitadas pela organização, segundo o "Los Angeles Times".

Sabe-se apenas que o valor deverá ter em conta "a gravidade do abuso e durante quanto tempo ele aconteceu", revela o advogado Paul Mones, que tem apenas a certeza de que a quantia irá ultrapassar a das indemnizações por casos de abuso sexual na Igreja Católica americana há mais de uma década, e que envolveu mais de 500 vítimas.

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Os casos na Boy Scouts of America foram pela primeira vez relatados em 2012, envolvendo na altura cerca de 5 mil homens, de acordo com uma lista negra divulgada pelo jornal, conhecida como "arquivos de perversão".

Atualmente, a organização cujos chefes de grupo eram vistos até há pouco tempo como exemplos a seguir, conta com cerca de 2,2 milhões de membros, embora o número esteja em constante declínio há décadas, razão que levou a BSA, em 2017, a admitir raparigas. Até aí, a organização foi composta por gerações de rapazes norte-americanos que se guiavam pelos valores "patriotismo, bravura e independência" definidos na Carta do Congresso, emitida em 1916.