Eu, Ana Luísa Bernardino, me confesso. Sou uma millennial que nunca fez compras online, porque sou (ou era) daquela estirpe muito específica que vai (ou ia) ao supermercado dez vezes por dia. Faço (ou fazia) compras em parcelas e, curiosamente, enveredando sempre diferentes looks, conforme o momento vivido: de pijama e com olhos lacrimejantes, logo pela manhã, para comprar o pão e café; à tarde, com um look mais desportivo para comprar uma sopa e uma qualquer gordice (viciei imenso em hóstias de camarão, estranhíssimo); à noite, já com um rimel no olho, em busca de uma simpática garrafa de vinho. Para isso pode contribuir o facto de viver por cima de um Auchan, mas isso agora não é relevante.

O que interessa é que esta quinta-feira, 2 de abril, foi o meu dia de estreia nesta coisa que é mandar vir compras para casa através do computador. E dificilmente estarei sozinha. É que toda a gente percebeu: tendo em conta que o recolhimento é fator-chave para se travar a propagação da COVID-19, as compras com recurso a sites e serviços de entrega em casa são uma grande ferramenta. Isto, claro, se funcionarem. É que estes canais estão manifestamente entupidos e com datas de entrega a roçar os 30 dias ou mais. Neste esforço para não sair de casa, não morremos de coronavírus, morremos de fome. Irónico.

Foi isto que concluímos depois desta experiência: passámos uma manhã a fazer compras online, utilizando as plataformas digitais das que são provavelmente as maiores cadeias em Portugal, que entregam em casa: Continente, Pingo Doce (ou "Mercadão", que nome divertido), Auchan e El Corte Inglés.

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O limite para as compras era de 20€, mais coisa menos coisa — valor que dava direito a um cabaz de básicos (que por vezes ficava incompleto), tendo em conta as minhas opções de consumo, óbvio, excluindo itens alcóolicos (pena).

Nele cabiam (ou deveriam) caber o seguintes produtos: um pacote de espaguete, um quilo de arroz, duas latas de atum, uma lata de grão, uma lata de tomate triturado e pelado, azeite, iogurtes de marca branca, queijo flamengo, aveia, ovos, batatas, brócolos congelados, um quilo de cenouras, dois litros de leite, gel de banho, papel higiénico e detergente para a loiça.

Vamos ao que de melhor e de pior se viveu nesta estreia de compras online.

Continente

A parte boa. No Continente Online abundavam opções para todos os produtos contidos na lista, nisso não tivemos dificuldade nenhuma. O layout da página é amigo dos utilizadores e é fácil entendermo-nos nesta montra visual.

De carrinho cheio, tento terminar as minhas compras e eis que, claro, o site me avisa que não tenho registo feito e começa assim a aborrecida e confusa saga burocrática online — que aumenta em cinco vezes o número de janelas abertas e que, potencialmente, me faz fechar tudo de uma só vez, porque estou cansada, não há pachorra, que se lixe.

Com este cenário em mente, penso: "Olha que grande 31, estás tramada, nem em 2021 recebes o teu grão". Mas não me verguei: lá preencho o formulário, vou ao email para confirmar o que é suposto e, para minha surpresa, abrindo uma página nova, o meu carrinho continua lá, cheio e impecável, esperando por mim. Adoro compras online.

continente
continente

Agora a parte má. Odeio compras online. Não só o valor da compra subiu de 21, 43€ para 28, 41€, como a coisa se complicou no momento de fazer o agendamento da entrega. A primeira opção que me surgia no calendário era a 4 de abril, ou seja, já este sábado. E eu penso "bestial".

Corta para: depois de dar erro, insisto e surge-me então outro calendário onde, surpresa, me dizem que só tenho horários disponíveis a 30 de abril ou a 1 de maio. Em suma, vou morrer de fome até lá. Desisto, há-de haver melhor, penso.

Tempo passado no site: 19 minutos e 29 segundos
Portes de envio: 6,98€
Estimativa da chegada da encomenda: 30 de abril
Processo concluido: não

Pingo Doce

A parte boa. O Pingo Doce foi o site em que perdi menos tempo e o único em que consegui terminar o processo (mas com uma exigência relevante, que explicamos mais abaixo). Não é preciso passar pelo tal processo burocrático — basta colocar o código postal e, mais à frente, com o carrinho de compras já cheio, colocar a morada. A minha encomenda chegaria brevemente (tendo em conta as circunstâncias): a data mais próxima era a 11 de abril, ou seja, no sábado da próxima semana. O valor da entrega é de 5€.

pingo doce
pingo doce

A parte má. Era esta a exigência de que falávamos. A parte má é que há um preço mínimo para se realizarem entregas em casa, que é de 50€, o que significa que tive de acrescentar produtos ao meu cabaz, só para perceber como é que a coisa se desenrolava. O site é menos navegável, com uma barra de pesquisa que carece de inteligência — o produto que pesquisamos só desaparece se o apagarmos, mesmo que o dito já tenha sido seleccionado. Parece preciosismo de maluca, mas aborrece.

Tempo passado no site: 15 minutos e 13 segundos
Portes de envio: 5€
Estimativa da chegada da encomenda: 11 de abril
Processo concluido: sim

Auchan

A experiência mais demorada, mais stressante e mais falhada. Nas compras online do Auchan não encontrámos nada de bom, lamentamos. Entramos no site e levamos logo com um aviso — estamos numa lista de espera. Fantástico, parece que estou na rua.

auchan
auchan

Mas, pronto, foi pouco tempo (ouvi relatos muito piores) e em cerca de sete minutos entro no supermercado virtual. Chego, arregaço novamente as mangas e começo as minhas compras, num tempo que não pode exceder os 60 minutos, porque, de outra forma, somos expulsos. São poucas coisas, vai ser rápido.

Mas não tão rápido assim. É que, ao pesquisar por uma tipologia de produto, as opções surgem em lista, o que torna o processo mais penoso — cabem menos por página, é preciso fazer mais scroll e passar por mais páginas. Enfim. Como no Continente, também aqui temos de nos aventurar na jigajoga dos registos, login, abre página, fecha página, procura página.

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Entretanto, mais à frente, percebo que não tenho de pagar taxa de entrega e fico feliz. Só que, mesmo no final do processo, surgem dois contratempos, na forma de avisos absolutamente imperceptíveis para esta estreante na arte do comprar online:

1. "Não existem slots de entrega disponíveis. Experimente mudar de local de entrega para consultar disponibilidades."

O meu cérebro começa a disparar perguntas: primeiro, computador, o que é que queres dizer com slots? Não há uma palavra em português para isto? Segundo: mudar o local de entrega para onde? Para tua casa? Exato.

auchan
auchan

2. "Por favor selecione data/hora para todas as entregas, ou remova produtos para os quais não pretende efetuar a seleção de modo/local ou dia/horário de entrega."

Vai-te lixar. O campo para seleccionar data e hora para as entregas não é meu amigo, não me deixa seleccionar nada.

Isto é paródia. Não entendo, estou baralhada, desisto. Passaram 36 minutos e dois segundos.

Tempo passado no site: 36 minutos e 2 segundos
Portes de envio: 0€
Estimativa da chegada da encomenda: não foi possível ver
Processo concluido: não

El Corte Inglês

A parte boa. Navegação fácil, excelentes filtros para restringir a quantidade de produtos, a ordem por que nos aparecem. Há opções em barda, preços mais carotes, até porque todos sabermos que comprar no supermercado do El Corte Inglês é "chique a valer", diria o gordo e bochechudo Dâmaso Salcede, do Eça, nos "Maias".

Há alguns produtos esgotados, nomeadamente muitos iogurtes da marca El Corte Inglês, incluindo os naturais não açucarados. Gordice por gordice, é optar pelo pacote de gregos de stracciatella, que a diferença não é assim tão grande. Detergente e gel de banho tiveram de ficar de fora, porque de outra forma ultrapassava-se demasiado o valor máximo do cabaz, que já ia nos 21€.

Mais: a burocracia do registo e login é feita, obrigatoriamente, de início, o que é uma maçada, mas, pronto, é sempre melhor fazer-se primeiro o que mais aborrece.

compras
compras

A parte má. Pois, a parte má. Assim que entramos no site, somos avisados de que não se fazem entregas no prazo de sete dias, porque está tudo cheio (ao menos não falam em slots). Tudo bem, aceitamos, pode vir depois. Só que não pode: é que no momento de escolher o dia no calendário, não dá para andar para a frente, ou seja, não é, de todo, possível fazer encomendas que sejam entregues num prazo superior a este, percebemos bem depois, ao consultar o site.

Missão abortada, novamente, oficialmente terminada. Vou lá abaixo de pijama.

Tempo passado no site: 25 minutos e 56 segundos
Portes de envio: 6,9€
Estimativa da chegada da encomenda: não foi possível escolher
Processo concluido: não