Os estafetas de duas das plataforma de entrega de comida mais conhecidas, Uber Eats e Glovo, revelam que nos últimos tempos têm sido vítimas de esquemas de roubo e de agressões e que, quando os casos são reportados ao suporte da plataforma, o apoio é nulo. As revelações são feitas por vários estafetas do Porto e de Lisboa ao "Jornal de Notícias".
Em abril do ano passado, dados da Uber Eats revelaram que em toda a Europa os pedidos na plataforma aumentaram 59%, numa altura em que o mundo estava confinado em casa devido à pandemia de COVID-19 e recorria ao serviço de entregas para refeições e ainda para produtos de mercearia ao domicílio. A tendência continua neste segundo confinamento, embora acompanhada de situações de risco para os estafetas.
"Temos assistido a um maior número de roubos nos últimos tempos", diz um dos estafetas ao "JN", acrescentando: "As pessoas começaram a perceber que era fácil roubar-nos".
São relatados casos de emboscadas cuja intenção é roubar os trabalhadores dos serviços de entrega, como aconteceu com um dos trabalhadores, que relata que teve de fugir de um grupo que o tentou assaltar após ter encomendado 50€ em comida. "Estamos totalmente desprotegidos e não temos condições de trabalho", denuncia o mesmo estafeta e outro acrescenta sobre os apoios das empresas: "Ligamos para o suporte através da aplicação, mas quando temos uma resposta já a Polícia tomou conta da ocorrência e foi embora".
Além dos roubos, as agressões são outra das situações relatadas ao mesmo jornal. Um dos casos aconteceu muito recentemente, em fevereiro, com um estafeta da Glovo que foi agredido por um casal por não ter entregado a refeição. A questão é que o estafeta limitou-se a seguir a política da plataforma e a não entregar a comida uma vez que o pedido foi cancelado.
A não entrega de comida é um dos casos mais vezes reportados às plataformas, situação que permite que o cliente fique com a refeição e ainda seja reembolsado. Este é um dos métodos usado para beneficiar do serviço sem qualquer custo e que tem gerado casos de violência. No meio destes episódios, a empresa dá sempre razão ao cliente e o estafeta acaba prejudicado. "Quem recusar entregar a encomenda corre o risco de ser banido da aplicação", denuncia um dos estafetas.
Confrontadas pelo "JN" sobre as acusações, a Uber Eats e a Glovo confirmam a onda de crimes, mas negam que haja de falta de apoio. Segundo o diretor-geral da Glovo, Ricardo Batista, os trabalhadores são indemnizados “sempre que são afetados no decurso das entregas que fazem” e existe “permanente contacto com as autoridades”, diz, de acordo com o "Observador". Ricardo Batista acrescenta ainda que os estafetas têm “uma apólice de seguro adicional, sem custos" que abrange lesões que ocorram durante as entregas.
Já a Uber Eats indica que existe “um seguro de proteção cujo custo é assegurado pela Uber" e revela ainda que a empresa está em constante contacto com uma equipa de ex-profissionais de forças de segurança que intervém em situações de perigo.
Devido à onda de assaltos, confirmada pelas plataformas, foram suspensos os serviços em bairros problemáticos. É o caso da Pasteleira Nova e Cerco, no Porto, e da Cova da Moura, Amadora. Para este último bairro foi encontrada uma outra alternativa, que consiste em deixar a encomenda à porta da esquadra da PSP, que é depois entregue pelas autoridades.
As condições precárias dos estafetas das plataformas de entrega ao domicílio já tinham sido referidas a propósito de uma investigação sobre o trabalho nas plataformas digitais em quatro países europeus, levado a cabo pelo investigador do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS) da Universidade Nova de Lisboa, Nuno Boavida.
“A nossa equipa divide o mundo dos estafetas em duas partes: há as Domino’s e as Pizza Huts que têm as suas frotas, que funcionam de acordo com as leis e o mercado português, e depois o mundo da Glovo e da Ubereats, onde reina o abuso, a ilegalidade e a casualidade do trabalho”, adiantou à TSF. Nuno Boavida considera que o problema destas plataformas está na falta de regulamentação.