Lúcia Rodrigues, Vera Silva, Maria Rosado, Fernanda, Lúcia Oliveira, Marina Mendes, Helena Cabrita, Lara, Fernando Cruz, Ana Maria Silva, Ana Paula e Inês Barata Feio Terrahe. Além destes 12 nomes, há mais um que, apesar de não ter sido divulgado pelas autoridades, teve o mesmo desfecho que todos os outros: a morte pelas mãos do seu parceiro. Em pouco mais de três meses, já foram registadas um terço das vítimas assassinadas em 2018 em contexto de violência doméstica, e a tendência é para que este número continue a subir.
Muitas destas situações devem-se ao facto de não existir uma denúncia ou até mesmo de a vítima desistir da queixa, tal como aconteceu no caso de Helena Cabrita e da neta, Lara, assassinadas pelo pai, Pedro Henriques, a 4 de fevereiro na Margem Sul. O homem de 39 anos já tinha sido referenciado por violência doméstica, mas a mulher, Sandra Cabrita, tinha recusado proteção policial.
“Há uma série de dificuldades nestes casos”, explica à MAGG Joana Menezes, psicóloga da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV). “Primeiro porque a pessoa tem medo do que pode acontecer depois, seja porque não vê uma alternativa ou porque tem vergonha de admitir aquilo por que está a passar."
Como é que uma vítima deve agir em caso de violência doméstica?
"É que por muito que possa existir uma situação de violência doméstica, vão existir também situações boas durante aquela relação e a pessoa vai oscilar entre sentimentos negativos e positivos em relação ao parceiro. Como já tem uma autoestima tão baixa, não consegue tomar uma decisão", continua.
Dada a dificuldade de reação, a psicóloga recomenda que a vítima não se isole e sinta que pode falar com alguém sobre a situação em que está a viver. E esse alguém pode ser qualquer pessoa — desde um amigo a um familiar. Mas alerta para a necessidade de se agir consoante as necessidades de cada caso.
"Cada situação é diferente e, por isso, dependendo de cada caso, pode ser necessário dar passos diferentes e em alturas diferentes. O trabalho da APAV passa por dar a conhecer tudo aquilo que as vítimas têm à sua disponibilidade, consoante a situação em que se veem envolvidas", revela.
No entanto, para Joana Menezes há uma certeza: numa situação de risco iminente, as autoridades policiais devem ser sempre as primeiras a ser contactadas sem hesitação, já que são elas que se podem deslocar ao local e garantir a proteção imediata da vítima.
"É importante que as vítimas não mantenham o silêncio, que tenham pessoas próximas com quem possam contar numa situação em que estejam em risco", e isso passa também por combinar com amigos, vizinhos ou familiares, um plano de ação sempre que for enviada uma mensagem ou feito um telefonema numa situação limite.
Nesses casos podem ser usadas palavras-chave ou qualquer outra forma de comunicação que sirva para alertar a outra pessoa para o facto de estar a acontecer uma situação de violência.
Além de não se isolarem, também é importante não tentarem o confronto com os seus agressores. Mas o aspeto fundamental passa por, segundo a psicóloga, não subestimar o risco que pode decorrer daquela situação de violência. "Mesmo que não se registem episódios de violência física, é imperativo que as vítimas não subestimem o risco a que estão sujeitas. Principalmente se existirem ameaças de morte."
Embora Joana Menezes considere que, idealmente, ninguém deveria ser obrigado a gerir o turbilhão de emoções que decorre da vivência diária com um agressor, a verdade é que uma denúncia nem sempre leva à detenção imediata de quem agride.
O facto de a vítima se ver obrigada a ponderar tudo aquilo que pode vir a perder no ato da denúncia (como a casa, a estabilidade e a profissão) são fatores decisivos do processo mental de alguém que já está "mentalmente debilitado".
"Ninguém escolhe ser agredido. Ninguém escolhe estar num relacionamento em que é maltratado. As relações formam-se porque há um interesse mútuo e, por vezes, a vítima mantém-se vítima porque, mesmo após as agressões, há memórias boas que levam a que essa pessoa tenha esperança que aquela situação pode mudar."
É por isso que, continua, é importante que todas as pessoas que se encontram em redor percebam que uma vítima não fica numa relação em que é maltratada porque quer ou porque gosta. "Tem de haver um apoio incondicional, mesmo que não se concorde com as suas opções", defende.
Caso existam crianças na família, estas devem ser ensinadas desde bem cedo a não interferir diretamente no conflito dos pais por forma a tentar salvar um deles sob pena de também elas virem a ser agredidas.
"É importante que elas [as crianças] não interfiram diretamente mas saibam chamar os serviços de emergência sempre que necessário. Em casa, o ideal é ter sempre um telemóvel consigo e agir de forma a nunca ficar sem saída ou sem maneira de pedir ajuda e evitar lugares como a cozinha — onde há facas e outro tipo de materiais cortantes."
Amigos e família devem denunciar com base apenas em suspeitas?
Joana Menezes não tem dúvidas de que amigos, familiares ou conhecidos devem sempre privilegiar a denúncia. Mesmo em situações em que a pessoa agredida se mostre contra, já que não é a eles que cabe o papel de investigar ou arranjar provas.
"Sempre que desconfiem ou saibam de um caso de violência doméstica, a denúncia deve ser imediata. Mas, claro, garantindo a segurança de quem é agredido e informando-o da sua decisão." O objetivo, segundo a psicóloga, passa por dar-lhe a conhecer de que há a possibilidade de o agressor ser abordado pelas autoridades.
No entanto, numa situação em que exista risco imediato, não é necessário nenhuma ponderação. "Nessas situações as autoridades devem ser contactadas de imediato para que uma situação grave não termine de forma ainda pior. Mesmo que a vítima venha a negar, aquando da chegada da polícia, que alguma coisa de errado se passa na sua vida", continua.
Por serem casos muito delicado, pessoas próximas devem sempre evitar a culpabilização da vítima, não devem mostrar-se irritados ou desiludidos caso assistam a um reatar da relação ou ainda tentar mediar o contacto entre vítima e agressor. Para a psicóloga, não há consenso possível.
E para alguém que é agredido também não — só que o processo mental até se chegar a uma decisão é muitas vezes longo, penoso e "repleto de dor e insegurança".