"Para mim, o conceito de oficina não remete apenas para um sítio onde estão carros ou motas, mas sim para um local onde se trabalha com as mãos e as coisas se transformam." Foi assim que o chef Rui Rebelo, 38 anos, apresentou esta quinta-feira, 7 de junho, a agora sua Oficina do Duque, em Lisboa. E agora é mesmo sua: o lisboeta assumiu a chefia da cozinha e, aproveitando os ventos de mudança, decidiu alterar também a decoração do restaurante.
O chef, que já tinha passado pelas cozinhas do 100 Maneiras Bistro, em Lisboa, ou pelas de Ferran Adrià, Joan Roca ou Ramon Morató, em Barcelona, ganhou maior reconhecimento em 2012, quando participou no concurso televisivo "Top Chef". Foi nesse mesmo ano que integrou a Oficina do Duque com mais dois sócios. Em 2017 decidiu tornar o restaurante num espaço à sua medida, assumindo — sozinho e pela primeira vez — a chefia de uma cozinha. Renovou a decoração e mudou-lhe o conceito, e hoje a Oficina assemelha-se mesmo a uma oficina antiga — onde o minimalismo e o urbano se misturam para criar um espaço confortável e interessante.
A isto juntou também uma alteração à carta e à apresentação dos pratos. A mousse de chocolate com azeite frutado e flor de sal (6,50€) é já uma sobremesa clássica do restaurante, mas há novidades tanto a nível de sobremesas como de opções vegetarianas. Em especial, a combinação de sementes de quinoa com cogumelos e manjericão por apenas 10,50€.
Para ficar a conhecer todas as mudanças, a MAGG fez uma visita ao novo espaço de Rui Rebelo que, diz o chef, terá novidades "muito interessantes" na ementa para breve. Ao entrarmos, o que vimos foi um espaço onde o ordinário é trabalhado e tornado extraordinário.
Esta é uma ideia que está presente em tudo, desde a ementa até à decoração minimalista (mas confortável) do restaurante. Há duas salas, uma junto à entrada com vista para as escadas da Calçada do Duque, e outra junto à cozinha — que está aberta e à vista de todos os clientes.
A cozinha é de raiz portuguesa mas Rui Rebelo não nega a inspiração europeia, a interpretação contemporânea e a personalidade despretensiosa naquilo que faz. "Isto é a minha vida, nem mais nem menos."
"Eu sou aquela pessoa a quem diziam sempre para não meter os dedos nas tomadas elétricas para não apanhar um choque. Eu, curioso como era — e sou —, ia lá sempre meter o dedo [risos]. E é isso que quero mostrar aos meus clientes."
Isso nota-se sobretudo na comida que traduz esta transformação do ordinário em extraordinário, muito devido à combinação de ingredientes e produtos mais simples com outros mais nobres. O prato de sarrajão, muitas vezes confundido com atum, é talvez o exemplo mais paradigmático deste conceito já que, depois de trabalhado e braseado, faz-se acompanhar de puré de raízes e soja perfumada (12€).
Do peixe passa-se harmoniosamente, mas sempre com um toque criativo, para a carne. E o que chega à mesa é um prato de desfiado de rabo de boi, complementado com puré de pera rocha e chícharos — que é facilmente explicável se se imaginar um meio termo entre tremoço e grão (13€). O rabo de boi é cozido a baixas temperaturas durante 16 horas, resultando numa carne tenra e saborosa.
Nos Santos Populares há uma reinterpretação da sardinha
Mas as novidades não se ficam por aqui. Com horário alargado e com uma esplanada, de 38 lugares, a piscar o olho aos dias mais quentes de verão, a Oficina do Duque já começou a preparar as celebrações dos Santos Populares com uma reinterpretação de um dos petiscos mais conhecidos da cultura portuguesa, a sardinha que Rui Rebelo apelidou de Sardinha Extraordinária.
"É algo que assenta naquilo que há muito queria fazer e que me permite, dado que já estamos completamente enraizados em Lisboa, experimentar coisas mais extravagantes", continua. O novo petisco é envolto em cone de bambu, coentros e gengibre naquela que é, mais uma vez, a junção de um ingrediente simples a outros mais nobres. Estará disponível no menu a partir de 13 de junho até ao final do mês, com o preço de 6,50€ por três cones.
"O cone de bambu faz-me lembrar o carvão com o qual eu escrevia nas paredes em miúdo [risos]. Com isto, passamos a ter uma sardinha em ceviche em vez de ser assada na brasa."
Com a referência de aproximadamente 30€ para duas pessoas por refeição, a Oficina do Duque mantém a boa relação entre qualidade e preço pela qual tem vindo a ser conhecido pelos portugueses e turistas. Os vegetarianos também têm opções disponíveis como pratos de cuscuz com legumes assados e gelado de hortelã (9,50€) ou quinoa acompanhada com cogumelos e legumes salteados (10,50€).
"A minha ementa é como a minha vida — é fixa até eu decidir mudá-la", mas confessa que não é de procurar novas experiências. "Às vezes penso 'hoje não vou fazer nada' e sento-me à secretária preparado para não fazer nada [risos], até que alguém me liga com uma proposta e eu aceito. Não resisto a uma boa tentação."
E de boas tentações está a Oficina do Duque cheia, que faz questão de se apresentar aos visitantes como uma representação do que é trabalhar com as mãos e com os utensílios — muitos deles postos na parede de cimento junto às mesas. "Na parede estão todas as ferramentas de uma oficina, algumas são de cozinha mas outras são outro tipo, como a carpintaria."
No momento da despedida, a MAGG perguntou se aquela parafernália de utensílios podia cair a qualquer momento. O chef respondeu com a brincadeira e descontração que já lhe são características: "Nunca me perguntaram se os utensílios da parede caíam mesmo, mas garanto que isso só acontece se eu lá for puxar."
*A MAGG jantou a convite da Oficina do Duque