Às vezes parece que gastamos a palavra "natureza". Gastamos em conversa, gastamos em recursos, gastamos em paisagem. Mas há locais e projetos que ainda conseguem preservá-la. É o caso do município do Gavião, na região do Alentejo, que a MAGG visitou a propósito de um dos mais recentes alojamentos: o Gavião Nature Village.
Contudo, a experiência foi muito além do que achámos que seria. Não se limitou a dormir fora de casa, a desfrutar um pequeno-almoço farto num alojamento, nem a picar o ponto no check in às 16h e só sair no fim da estadia às 11h.
Desfrutámos do alojamento classificado como parque de campismo de quatro estrelas, saímos em direção ao rio Tejo onde começa um dos percursos pedestres próximos do Gavião Nature Village, ainda andámos por Belver, onde nos encantámos com o castelo onde surgiu o nome da freguesia, e descemos até à estação de comboios para praticar rapel.
Em dois dias vimos uma parte do município, mas tanto o Gavião Nature Village, como a empresa GaviAdventure dão muito mais a conhecer a quem tem mais tempo. Nas férias ou nas pontes que se avizinham, beba tudo o que há neste roteiro.
O acordar numa tenda glamping
Apesar do sonho de longa data, tentámos não colocar as expectativas de dormir num glamping muito altas. As camas poderiam ser desconfortáveis por tratar-se de uma tenda e, sendo inverno, o frio poderia tornar-se insuportável no interior. No entanto, comprovámos que, neste caso, todos os receios são infundados. Apesar de classificado como parque de campismo, temos a dizer que, se acampar é isto, então queremos fazê-lo sempre, em qualquer altura do ano.
Porque acordar num glamping é uma experiência que tem luxo por si só. Depois de uma noite com a cabeça sobre almofadas altas e o ar condicionado a fazer o trabalho que as noites frias de inverno não garantem, o despertar foi com uns raios de sol a subir a cama e a fazer de despertador natural. Arregaçámos de imediato as cortinas para descobrir o amanhecer e ainda que a cobertura da tenda estivesse embaciada, dava para ver o pequeno lago com sapos que cantam à noite.
E assim ficámos: deitados largos minutos na cama, com o sol cada vez mais próximo, até que ganhámos forças para ir ao pequeno-almoço com produtos caseiros, como a granola e o pão de abóbora, e outros regionais, entre eles o pão alentejano e o queijo de Nisa (e vão por nós: façam uma torrada do pão alentejano, coloquem o queijo e um pedaço de compota caseira de abóbora e canela e vão ver que o dia, que já promete, ainda começa melhor).
Mas antes de subirmos à casa mãe do Gavião Nature Village, onde fica também o restaurante Cadafaz e o espaço do pequeno-almoço, subimos ao terraço para ver a vista. Contudo, nada vimos.
No Gavião as manhãs começam tímidas, com uma neblina que cobre o castelo, o rio e tudo o que queremos ver quase como que a dizer: "Venham visitar".
E fomos, mais tarde.
Um espaço para "voltar às origens, sem telemóveis"
Antes de visitarmos o município, explorámos o Gavião Nature Village, propriedade de dois casais amigos de infância — Paulo Almeida, Maria do Carmo Moreira, Fernando Couteiro e Geny Couteiro — que abriram este espaço a 19 de março de 2021 para proporcionar momentos únicos a famílias (para as quais há seis tendas glamping familiares), casais (para quem é ideal a tenda romântica) e todos os que prefiram ficar num dos dez cork shelter de cortiça.
As tendas glamping têm nomes de flores e os cork shelters de aves da região, como é o caso do Gavião, que também experimentámos. O nome de cada alojamento tem uma história, escrita por Geny Couteiro dentro de um contentor quando o projeto, iniciado em 2017, ainda estava a pôr-se de pé.
Foi tudo pensado ao pormenor de modo a ser um projeto para voltar às origens, em vários sentidos. "Tentámos que o projeto se enquadrasse na natureza e não o contrário", disse Geny Couteiro à MAGG, que idealizou este espaço para que a natureza de que falávamos ao início não se gastasse.
É por isso que o alojamento foi concebido com materiais ecológicos e sustentáveis, foi instalado um painel solar e criada uma horta biológica que fornece alguns alimentos ao restaurante do alojamento aberto ao público, com gastronomia alentejana — mais típica, como os secretos de porco preto com migas de bolota (17€), e menos, como a aconchegante feijoada de cogumelos com vinho do Porto (12€).
Ao lado da horta coabitam o bode Ruça, a cabrinha Rosita (que quando a visitámos estava prestes a dar à luz), a família de galinhas Galaro e uma porquinha.
Por esta altura, a Dora, a Exploradora estará invejosa, porque encontrámos primeiro a porquinha Peppa. Quem também vai gostar de saber onde anda a Peppa são as crianças, que podem neste alojamento ter contacto com os animais e também jogar jogos tradicionais.
"A ideia foi voltar às origens, sem telemóveis e proporcionar momentos entre os pais e o filhos", referiu Geny quando nos mostrou o espaço para o jogo das sacas e da macaca, junto ao baloiço. No entanto, não são só os mais novos que se divertem.
No verão é mais provável que o instinto dos adultos seja ir diretamente para a piscina, mas em qualquer estação não falta o que fazer. Um dos exemplos é passar pelo circuito Wellness (sauna, banho turco e jacuzzi, disponível mediante marcação) ou fazer uma massagem em que sentirá um fio de cera de vela derretida a percorrer o corpo (desde 35€ por 30 minutos).
Ainda dentro do alojamento pode casar-se (a tenda Tejo e o ambiente envolvente quase dispensam demais decorações românticas) ou seguir para fora para fazer balonismo, conhecer os pontos históricos, fazer um percurso pedestre ou uma aventura.
Uma noite no Gavião Nature Village custa a partir de 99€ para duas pessoas, com pequeno almoço incluído.
"Oh meu pai, que belo ver"
A história de Belver foi bem preservada até aos dias de hoje em museus e nas estruturas originais do castelo que deu nome à freguesia portuguesa do concelho do Gavião. Diz a lenda que o nome ficou depois de uma bela princesa ter chegado à janela da torre de menagem e dito “ó, meu pai, que belo ver!”.
Já os factos dizem que D. Sancho I doou a Afonso Paes, prior da Ordem do Hospital, as chamadas terras de Gimdintesta, com a condição de aí se construir um castelo, o agora Castelo de Belver, e que aí confiou também o tesouro real nacional. A história é contada em painéis e vídeos à medida que vamos subindo os patamares do castelo, culminando na visita sobre o Tejo que não tem explicação possível: tem de ver por si só.
Se neste tempo eram as espadas que andavam nas mãos dos cavaleiros, mais tarde foi o sabão, cuja evolução é contada no Museu do Sabão em Belver. Ficámos a saber que sabão é diferente de sabonete e que o sabão que se fazia em Belver até à primeira metade do século XX era um sabão mole (composto por potássio) que servia apenas para lavar a roupa, o soalho e a louça.
Outras mãos andaram durante anos ocupadas com as mantas e tapeçarias, mais precisamente com a produção de tecidos através de um processo chamado de tecelagem e que, por sinal, é bastante trabalhoso. Experimentámos e percebemos que se ao entrelaçar os fios no tear de pedal (usado na Fábrica Natividade Nunes da Silva) demorámos quase 30 segundos, multipliquem isto por todos os fios necessários para chegar ao resultado final.
Ao adquirir o bilhete turístico, tem acesso ao Museu do Sabão, Museu das Mantas e Castelo de Belver por 4€.
Entre descer uma parede e uma ravina: escolhemos a parede
Com o GaviAdventure, o dia pode começar com uma leve caminhada e terminar num tiro com arco na praia fluvial do Alamal. Os programas da empresa de turismo desportivo no concelho de Gavião, de Bruno e Francisco (que nos acompanharam nas aventuras durante a visita ao concelho) e Sara, são para todos os gostos e tipos de grupos.
Amigos ou um grupo em despedida de solteiro/a, podem passar um dia entre risos e balas inofensivas, embora dolorosas, de uma sessão de paintball, e entusiastas pela natureza irão até à Avifauna do Outeiro para, pacientemente, esperar pela passagem de um grifo que mede 2,20 metros de asa aberta (com que tivemos oportunidade de ser brindados) e admirar ainda as cegonhas pretas que andam no chamado Sítio da Pedra da Moura Encantada.
Casais, famílias, grupos séniores e tantos mais, têm um restante leque de ofertas, incluindo a que só chega em abril: andar de kayak no Tejo numa noite de lua cheia.
Entre as propostas, nós experimentámos fazer uma parte do percurso pedestre PR1 Arribas do Tejo (que em meados de fevereiro vai ficar ligado ao PR2) e seguir pelo caminho de acesso à ponte velha. Enquanto caminhávamos entre árvores e silêncio, de vez em quando, a vista obrigava a parar para ver o Castelo de Belver, a meio da manhã destapado de neblina, o Tejo e a Estação de Comboios de Barragem de Belver numa das margens. Seguindo caminho, ainda passámos numa ponte suspensa, a ponte da Ribeira de Belver, achando que este seria o ponto alto de aventura.
Não... isso aconteceu quando já junto à Estação de Comboios de Barragem de Belver anunciaram que faríamos rapel.
"Na boa, quem já se atirou de um avião, desce uma parede", pensámos. Subimos uma ravina para chegar ao ponto do início da atividade e, sem os ténis apropriados, esta já nos valeu um frio na barriga. Portanto, tínhamos duas opções: descer a mesma ravina e arriscar a fazê-lo em género de deslizamento corporal ou descer a parede seguros pelos equipamentos de rapel. Descemos, devagarinho. Chegados lá abaixo só queríamos tudo outra vez (tal como uma criança).
Ao fim do dia, avistámos os últimos raios de sol no baloiço do Gavião — sim, a moda também por aqui anda — e encerrámos a aventura na praia fluvial do Alamal. Primeiro, com uma pequena caminhada pelo passadiço do Alamal que faz parte do PR1, que se desenvolve ao longo do Tejo, depois, com mais um dos desafios do GaviAdventure: tiro com arco. Safámo-nos (não vamos quantificar), porque o que interessa é o tiro, aqui nem se menciona o alvo.
Todos os programas podem ser encontrados aqui, assim como os formulários para pedir um orçamento.
*A MAGG ficou alojada no Gavião Nature Village a convite do alojamento