"São 30 anos do assassinato da Dani e eu não consigo entender". A voz trémula de Raul Gazolla, viúvo de Daniella Perez, resumo o espírito de "Pacto Brutal", o novo documentário da HBO Max que está a chocar o Brasil.
É um dos crimes mais chocantes da década de 90 e que, ainda hoje, arrepia quem, na altura, acompanhava atentamente as novelas que chegavam do lado de lá do Atlântico. Daniella Perez, de apenas 22 anos, foi morta de forma premeditada, com golpes de punhal, a 28 de dezembro de 1992. O que tornou este crime apaixonante — e que o faz ser o tema do novo documentário da HBO Max — são os pormenores macabros desta história que, 30 anos depois, ainda levanta questões relevantes sobre o machismo e a morosidade da justiça, a visão da sociedade sobre as mulheres vítimas de violência, o femicídio.
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Daniella Perez e um dos seus assassinos, o ator Guilherme de Pádua, faziam par romântico na novela "De Corpo e Alma", exibida em simultâneo em Portugal e no Brasil por se tratar de uma coprodução SIC. Ela era Yasmin e ele era Bira.
Apesar da rapidez com que as autoridades brasileiras encontraram os suspeitos do crime (o ator Guilherme de Pádua e a mulher, Paula Thomaz, grávida de quatro meses na altura), o mesmo não aconteceu quando o caso chegou aos tribunais. O julgamento arrastou-se ao longo de cinco anos, tendo Guilherme de Pádua dado várias entrevistas ao longo desse período, apresentando diferentes versões do crime.
Os motivos que levaram o casal a atrair Daniella Perez para um local ermo (um matagal na Barra da Tijuca, perto do Projac, onde são gravadas as novelas da Globo) estariam relacionados com o facto de o ator crer que a sua personagem ia passar a ter menos relevância na novela "De Corpo e Alma". Guilherme de Pádua agrediu a atriz até esta ficar inconsciente e, depois, Paula Thomaz desferiu 18 golpes no corpo de Daniella, oito dos quais no coração. Em tribunal foram apresentados mais indícios chocantes, como a presença de marcas de rituais de magia negra, como um círculo queimado dentro do qual foi colocada a atriz e também a arma do crime, um punhal (usado em rituais).
Paula Thomaz e Guilherme de Pádua foram condenados por homicídio duplamente qualificado, a 18 anos e meio e 19 anos de prisão, respetivamente. No entanto, cumpriram apenas sete anos da pena, tendo saído em liberdade em 1999.
A série documental (que não tem data de estreia no catálogo português da HBO Max) conta com relatos inéditos (e impressionantes) da mãe da atriz, Glória Perez, do ator Raul Gazolla e de outros intervenientes na investigação. Glória Perez, que presta um testemunho impressionante em "Pacto Brutal", explica porque é que esperou 30 anos até participar num documentário sobre a morte da filha. "Eu sempre quis contar esta história, sempre quis que a verdade do processo aparecesse, que esta história fosse contada da forma como aconteceu e não que ela aparecesse contada como uma novela barata, como um folhetim barato, que é como ela ficou na memória das pessoas", diz a autora no documentário "Pacto Brutal".
Apesar de ser um crime acontecido há 30 anos, o formato de streaming está a despertar a atenção de um público que nem sequer era nascido à época dos acontecimentos. Nas redes sociais Tiktok e Twitter são vários os vídeos e posts onde é recordado o crime.
Guilherme de Pádua é pastor e apoiante de Bolsonaro
Atualmente com 52 anos, Guilherme de Pádua é pastor numa igreja evangélica em Minas Gerais e apoiante de Jair Bolsonaro. Em 2019, casou-se pela terceira vez com a estilista Juliana Lacerda.
O ex-ator já se pronunciou sobre o documentário da HBO Max no seu canal de Youtube, onde tem quase 3000 seguidores. Acusa o formato da plataforma de streaming de ser "parcial" e diz que precisa "defender-se das acusações e das perseguições", para que não seja "linchado socialmente".
Pádua diz não ter tido conhecimento da elaboração do documentário e que este veicula "notícias falsas". "Estou voltando para desmentir o que estão dizendo", explica o ator, que tinha abandonado as redes sociais há um ano. "Estou tentando fazer o melhor dentro daquilo que está ao meu alcance. Eu sei do meu passado, nada o vai apagar, nada o vai corrigir. Hoje todas as minhas forças estão dedicadas a fazer alguma coisa que possa ter algum sentido mais positivo ou benéfico".
Paula Thomaz, por seu turno, mudou de apelido após casar-se com o advogado Sérgio Peixoto. Vivia no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro.