Atenção: este artigo contém spoilers sobre a saga "Bridget Jones"

Temos de começar, desde já, por fazer uma confissão: o nosso entusiasmo para ver "Bridget Jones: Louca Por Ele", que estreia esta quinta-feira, 13 de fevereiro, nas salas de cinema portuguesas, estava ao nível de uma dieta depois do Natal – inexistente. Não porque não quiséssemos acompanhar mais umas peripécias da rainha do caos, interpretada por Renée Zellweger, mas porque o terceiro filme, "O Bebé de Bridget Jones", já nos tinha deixado sem fé nenhuma no futuro da saga.

Os primeiros dois filmes, "O Diário de Bridget Jones" e "O Novo Diário de Bridget Jones", lançados em 2001 e 2004 respetivamente, pareciam-nos ter sido mais do que suficientes. Mas o terceiro, na nossa opinião, foi completamente desnecessário, sendo que a personagem, que tinha acabado feliz no filme anterior, voltou a ter a vida virada ao contrário. E em vez da típica disputa amorosa entre os pretendentes de Bridget, tivemos dois homens a lutar pelo título de pai da criança, numa versão britânica do "Quem Quer Ser Milionário?", mas com um teste de ADN como prémio.

Mas vá, uma vez que somos adeptos de segundas oportunidades, foi com um misto de curiosidade (e uma pitada de receio) que nos sentámos a ver o quarto capítulo desta saga. Seria "Bridget Jones: Louca Por Ele" uma repetição das fórmulas já batidas ou faria a proeza de nos transportar para o universo das verdadeiras comédias românticas dos anos 2000, que fizeram com que a personagem de Renée Zellweger se tornasse numa das mais queridas e com mais longevidade do cinema? Já temos uma resposta.

Veja o trailer

Apesar de alguns clichés e estereótipos dispensáveis, o novo filme não só trouxe a mesma alma dos primeiros projetos, como também adicionou uma camada da qual não estávamos à espera, mas que nos surpreendeu pela positiva. Desta vez, Bridget Jones não é só aquela produtora britânica tontinha que nos faz rir pelas suas peripécias, mas uma personagem muito mais complexa do que antes, fruto da morte do marido, Mark Darcy, interpretado por Colin Firth, e daquilo que isso acarreta.

Trocando por miúdos, esta continuação não só veio de mãos dadas com a mesma vibe cómica dos primeiros filmes, sem cair (tanto) no ridículo, como aconteceu no terceiro. Sim, porque o projeto parecia ter sido escrito por alguém que achava que evolução e progresso tecnológico era sinónimo de enfiar um iPad na mão da Bridget para ela utilizar como diário. Felizmente, desta vez, acertaram na muche: mantiveram as piadas, deram uma pitada de emoção e não forçaram a integração das especificidades do mundo atual.

Apesar de sentirmos que estão a tentar arrastar o final feliz da personagem ao máximo, este filme foi uma oportunidade de a protagonista crescer, aprender a lidar com os novos desafios e de nos fazer sentir que a sua história até pode ter mais para oferecer – especialmente depois do fim, que mostrou que há toda uma nova relação por explorar. É que, à boa moda da britânica, esta acaba por entrar num relacionamento com a personagem que tem tudo para lhe dificultar a vida – o professor dos filhos, interpretado por Chiwetel Ejiofor.

Isto tudo sempre com vários momentos de karaoke (que, verdade seja dita, embora característicos daquilo que associamos à personagem, foram utilizados em demasia e em nada contribuem para o enredo) e uma banda sonora que grita comédia romântica dos anos 90, fruto da utilização de hits como "The Sweetest Gift", de Sade, "Modern Love", de David Bowie, e "I Have to Praise You", de Fatboy Slim. Podíamos ficar por aqui, mas fizemos um apanhado das três coisas de que mais gostámos no filme.

O affair louco de Bridget

Renée Zellweger as Bridget Jones in Bridget Jones: Mad About the Boy
Renée Zellweger as Bridget Jones in Bridget Jones: Mad About the Boy créditos: © 2025 Universal Studios. All Rights Reserved.

Há quase dez anos, no final do último filme, Bridget teve um filho e casou com o pai da criança: Mark Darcy, que iria fazer parte do seu final feliz (achávamos nós). Mais uma vez, numa tentativa de tornar a vida da personagem o caos, esta agora não só tem dois filhos, William (Casper Knopf) e Mabel (Mila Jankovic), como está a criá-los sozinha, porque o companheiro morreu.

A sequela começa quatro anos depois dessa desgraça, um período pautado por uma seca sexual que, de acordo com aquilo que a protagonista dá a entender, faria um monge parecer promíscuo. Por isso, Bridget decide que talvez esteja na altura de dar o corpo às balas. Como? Bem, vai diretamente para o inferno digital, graças a Miranda, interpretada por Sarah Solemani, que lhe cria um perfil no Tinder – que atire a primeira pedra quem nunca foi vítima de um amigo assim.

É aqui que entra Roxster, que tem poucos mais anos de vida do que a coleção de diários de Bridget, diga-se. Depois de um breve encontro num parque, o bioquímico de 29 anos, a quem Leo Woodall (sim, o galã sensualão de "One Day" e "White Lotus") dá vida, também cria um Tinder para ver se lá encontra a britânica e consegue-o. Vão a um primeiro encontro e não só lhe acha piada como tem a ousadia de pedir consentimento antes de a beijar – um verdadeiro príncipe encantado da era pós-#MeToo.

A coisa corre tão bem que quase que temos um momento "50 Sombras de Grey". Felizmente, este universo nunca permite que Bridget tenha um encontro sexy sem uma pitada de caos, por isso surgem cenas suficientemente constrangedoras para quebrar completamente a sensualidade. Se bem que, se essa tivesse sido a direção criativa, nem nos importaríamos muito, visto que sentimos sempre que nos foi concedido um privilégio ao olhar para Leo Woodall no grande ecrã, especialmente quando aparece sem T-shirt (ouvimos e não julgamos, OK?).

O romance de verão arrasta-se de forma promissora, com direito a momentos fofos, trocas de mensagens e um uso tão questionável de emojis que Bridget mais parece uma avó a tentar fazer flirt com o jovem. Mas, como qualquer pessoa com um histórico de vida trágico poderia prever, a felicidade é um conceito volátil para esta coitada, sendo que Roxster desaparece da sua vida sem deixar rasto. Ghosting aos 50? Sim, porque a humilhação não escolhe idades.

O melhor de tudo? Roxster tenta voltar, utilizando a carta da idade como desculpa e dizendo que, se antes não sabia se estava preparado para estar num relacionamento com uma mulher mais velha, o afastamento fez com que todas as dúvidas se dissipassem. Achávamos que Bridget ia ceder e, para nossa surpresa, não o fez. Finalmente, teve juízo – e percebeu que o amor próprio vale mais do que um romance de verão com um miúdo que, indiretamente, lhe chamou velha.

A evolução da personagem como mulher (e mãe)

bridget jone
bridget jone créditos: Divulgação

Pode parecer difícil de acreditar, mas Bridget Jones já não é a mulher que enche diários a queixar-se dos desamores, do peso, dos cigarros fumados e da quantidade exorbitante de vinho que bebia. Bom, os copos ainda lá estão – e o trio de amigos com quem ia para a farra também, não se preocupe –, mas agora manda garrafas abaixo devido a preocupações ligeiramente mais complexas. Afinal, algum dia a personagem teria de crescer, não é?

Se antes a grande questão era "vou morrer sozinha?", agora é "será que estou a traumatizar os meus filhos para sempre?". A evolução é real, meus amigos. Ser mãe, na cabeça de Bridget, era suposto ser como nos filmes: banhos de espuma em família, piqueniques no parque e lições de vida emocionantes. A realidade? Ir a jantares de grupo sozinha, fruto de estar viúva, levar com olhares condescendentes, sentir que está a falhar constantemente e tentar não chorar quando os miúdos perguntam pelo pai.

Para além de a sua experiência de maternidade ser completamente caótica, Bridget teve de lidar com um luto que ninguém a ensinou a processar. Durante quatro anos, evitou o romance, dedicou-se totalmente aos filhos, visto que tinha deixado o emprego enquanto produtora – ao qual acaba por voltar por sugestão, imagine-se, da icónica ginecologista, interpretada por Emma Thompson –, e convenceu-se de que o caos da sua vida estava finalmente sob controlo. Alerta, spoiler: nunca está.

Prova disso é que, contra tudo aquilo em que acreditava, teve de contratar uma salva-vidas – ou uma ama, vá, chamada Chloe. Isso ou pedir ao tresloucado do ex, que agora é tio dos filhos e a quem recorre para tomar conta deles de vez em quando. Sim, estamos a falar de Daniel Cleaver, interpretado por Hugh Grant, que pode não ter crescido para umas coisas (o facto de continuar a ser o mesmo garanhão de sempre), mas não deixa de ser um tio exímio quando comparado com Geoffrey, o tio da protagonista, que a assedia nos primeiros filmes.

Afinal, ao longo da história, Bridget vai percebendo que ser mãe também é isso: aceitar que não pode fazer tudo sozinha, por mais teimosa que seja, e que casamentos e filhos perfeitos não existem (por mais que a antagonista do filme, Nicola, queira esfregar-lhe na cara o contrário). É descobrir que pedir ajuda não é sinal de fraqueza, mas uma forma de zelar pela sua sanidade mental – e que a melhor forma de ser uma boa mãe é garantir que não se enlouquece no processo.

E mais do que isso, a personagem também se apercebe de que ser mãe não significa perder-se como mulher. Pode continuar a ser caótica, apaixonada, sonhadora, a beber o seu copo de vinho enquanto tenta perceber que raio se passa com a vida e, sobretudo, perceber que, pela primeira vez, não precisa de um homem para se sentir completa – apesar de já estarmos à espera de que, no fim, a química aparentemente inexistente entre Bridget e o professor dos filhos, Mr. Walliker, acabasse por fazer faísca. Não podia faltar um cliché.

A reflexão sobre o luto (e a despedida a Darcy)

Renée Zellweger as Bridget Jones in Bridget Jones: Mad About the Boy
Renée Zellweger as Bridget Jones in Bridget Jones: Mad About the Boy créditos: © 2025 Universal Studios. All Rights Reserved.

Por mais experiência que tenhamos em romances desastrosos, nunca ninguém nos prepara para perdermos o nosso grande amor. Foi isso que aconteceu a Bridget, até porque Mark Darcy nunca foi somente o homem que a amou tal como ela era – foi, por outro lado, além do pai dos seus filhos, o tipo de pessoa que enfrentava o mundo com uma seriedade desconcertante para ajudá-la quando ela tropeçava nos próprios pés. Ainda nos lembramos de quando este a salvou de uma prisão feminina na Tailândia, certo?

O que é facto é que, de repente, o tão conhecido advogado da ficção desapareceu. Morreu no Sudão, numa missão humanitária, porque, claro, tinha de ser algo dramaticamente heroico a retirá-lo da trama (e, desta vez, não podiam mandar a carta do afastamento devido a interesses irreconciliáveis). É aquele tipo de coisa que, se acontecesse a outra pessoa – nomeadamente a Daniel Cleaver, que até esteve morto temporariamente no terceiro filme – ela própria teria revirado os olhos.

Durante quatro anos, as circunstâncias mudaram, mas o seu modus operandi não: quando a vida lhe fugia ao controlo, tentou fingir que estava tudo bem. Dedicou-se aos filhos, deixou o trabalho e convenceu-se de que não tinha tempo para o luto. Afinal, tinha William e Mabel para criar, e as manhãs eram ocupadas a procurar mochilas desaparecidas e a deixá-los preparem pequenos-almoços nutricionalmente questionáveis. Mas o luto não desaparece só porque se ignora.

Veja as fotos do filme

Ao longo do filme, o luto de Bridget manifesta-se em pequenos momentos que nos apanham de surpresa, como aconteceu logo no início, em que fala com o marido em pensamento (e ainda parece que o vê em todo o lado). Mas o mais doloroso – e bonito, vá – desta despedida a Darcy é quando, no aniversário do mesmo, a mulher junta os filhos, que lhe escrevem cartas e fazem desenhos, atando-os a um balão e mandando-os para o céu. Se vertemos uma lágrima? Não desmentimos, nem confirmamos.

Outra parte central de aprender a lidar com o luto vem através de William, profundamente afetado pela ausência do pai, a carregar o peso da saudade sem saber como expressá-la. Bridget tentava preencher o vazio da melhor forma que sabia, mas como é que se explica a uma criança que algumas pessoas nunca voltam? Como se responde quando ele diz que tem medo de esquecer-se da voz do pai? Bridget não sabia, mas percebeu que, no meio do caos e das falhas inevitáveis, a única coisa que os filhos precisavam dela era simples: que continuasse ali.

Por isso, a grande lição da protagonista em relação ao luto não é simplesmente esquecê-lo, mas aprender a viver com ele. Aceitar que a dor existe, mas que não define tudo o que ela é (ou aquilo que quer ser). É permitir-se amar, rir e sentir outra vez – porque, por mais que custe, seguir em frente não é uma traição. É a maior prova de que o amor que teve foi real. Agora, se os filhos vão gostar que o tenha feito com o professor? Essa é uma questão para os próximos episódios.