Nuno Markl é, assumidamente, um grande fã do universo Marvel, bem como de tudo o que está associado à cultura pop. Não tivesse ele uma cave cheia de super-heróis — à qual nem sabe bem como limpar o pó de tanta "bonecada", já dizia Bruno Nogueira,  e outras relíquias associadas à banda desenhada e cinema). Mais espaço houvesse, mais introduziria, em especial uma das personagens do novo filme da Marvel: "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura".

Chega esta quinta-feira, 5 de maio, aos cinemas, e é protagonizado por Benedict Cumberbatch, Chiwetel Ejiofor e Elizabeth Olsen, e realizado por Sam Raimi. A antestreia aconteceu esta terça-feira, 3 de maio, em Portugal, e um dos privilegiados a ver o filme antes de chegar às salas de cinema foi Nuno Markl, um dos maiores geeks do País, mas segundo o próprio, não o maior. Em entrevista à MAGG — e a fugir ao máximo de qualquer spoiler —, o animador de rádio, humorista e argumentista, no fundo, um multifacetado, falou sobre a sua opinião como espectador ansioso para ver esta novidade de Sam Raimi. 

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Aqueles para quem "Evil Dead", blockbuster, MCU, Taika Waititi, James Gunn, Marvel Unlimited (uma espécie de Netlix de comics) são expressões que nada dizem, não desistam já, porque falámos com Nuno Markl sobre muito mais do que "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura".

Tocámos em "Taskmaster", programa da RTP1 que termina no próximo domingo, 8 de maio, mas que provavelmente voltará para uma segunda temporada "que será anunciada em breve", avançou-nos Markl. E nessa segunda temporada poderá haver um convidado especial num dos episódios: Bruno Nogueira. Nuno Markl já mandou a dica, resta saber o que vai acontecer. 

Numa retrospectiva sobre o percurso do radialista, uma coisa é certa: no túmulo onde ficará um dia (esperemos que longínquo) para a eternidade, estará muito mais do que "O Homem Que Mordeu o Cão", rubrica da Rádio Comercial. Isto porque além do icónico espaço criado em 1997, Markl é também conhecido como o geek que tem uma cave cheia de brinquedos e referências da cultura pop e que, mais recentemente, ganhou o título do generoso do "Taskmaster".

Em tantos formatos e com tantas valências, afinal quem é Nuno Markl? Para já, um homem "de barriga cheia" após ver o "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura", da Marvel.

Acredito que o "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura" era um filme já há muito aguardado por si. Superou as expectativas ou desiludiu de alguma maneira?
Não, não me desiludiu nada. Aliás. Está ali entre superar as expectativas e ao mesmo tempo ser exatamente aquilo que eu desejava que fosse, na verdade. E não tem só que ver com a Marvel e o "Doutor Estranho". Tem que ver também com o regresso do Sam Raimi, que é um realizador que formou parte do meu gosto pelo cinema, porque sou fanático pela trilogia "Evil Dead" que ele fez. E é giro, porque quando ele começou a fazer blockbusters [sucessos de bilheteira], é visível que esse estilo e as coisas que desenvolveu naquela altura com filmes todos lowbudget, mesmo assim continuam todas as transparecer. Por muito grandes que sejam os orçamentos e mitos sofisticados que sejam os efeitos especiais, ele mantém sempre esse lado de comida caseira, quase. Por isso, acho que o filme é muito bom quer como peça dessa gigantesca novela que é o MCU, o Universo Cinematográfico da Marvel, mas é muito bom também como um filme do Sam Raimi, porque não é só um filme de aventuras, tem ali um toque de terror e, por isso, fiquei muito satisfeito. Saí de lá de barriga cheia.

Ainda assim notou aqui uma evolução neste universo Marvel?
Acho que sim. O Doutor Estranho é a personagem ideal para se conseguir dar uns pontapés valentes para a frente no universo Marvel. Porque é um super-herói de tal forma imprevisível e de tal forma poderoso naquilo que é capaz de fazer — e depois, ainda por cima, tendo em conta que está lá também a Wanda — digamos que são as duas personagens que têm mais possibilidade de oferecer aos fãs uma experiência.

Uma das coisas que adorei no filme é que apesar de ser uma grande blockbuster, que de certeza vai fazer milhões, é um filme ousado em várias coisas. Às vezes parece quase um filme experimental. Entramos ali por caminhos tão quase impressionistas e alucinantes, que às tantas lembro-me de estar a olhar para aquilo e a pensar "possa, isto é um filme da Marvel". Lembro-me quando vi o "Thor" pela primeira vez, o primeiro, que é sem dúvida um dos filmes mais fracos da saga toda. A dada altura decidi, de uma maneira muito sistemática, estava com o meu filho, e disse: "Vamos ver o universo Marvel mesmo todo seguido". E de repente o "Thor", visto assim isoladamente não é um filme super incrível, parece que ganha qualquer coisa ao estar inserido no meio desta novela gigante.

Quando surge uma possibilidade de se fazer algo diferente, de facto no "Doutor Estranho" não podia ser um realizador qualquer, tinha de ser mesmo alguém como o Sam Raimi para dar a verdadeira dimensão real à personagem. E este é um filme que ousa bastante e isso é uma das coisas que gostei muito.

Falava do seu filho. Ele que não tem toda a bagagem dos anos que o Nuno já acompanha este universo. O que é que ele achou deste novo filme? Conseguiu também perceber que esta é uma grande produção?
Sim, sim. Ele está com 12 anos e já está muito sensibilizado para tudo isto e, além disso, o Doutor Estranho, de todos os heróis da Marvel, desde o primeiro filme que é o favorito dele. Ele tem ali um encanto especial pela personagem e por estes poderes, por este lado de liberdade absoluta de que qualquer coisa pode acontecer e não precisa de obedecer a uma lógica do mundo real. Mas ele gosta muito disto nesta personagem. E, portanto delirou, ontem [na antestreia do filme]. Chegou a casa tardíssimo. Estava estafado e depois era dia de escola, mas ele até dizia: "Valeu muito a pena isto. Vale a pena estar a sofrer" (risos).

"Há um punhado de autores a trabalhar no universo cinematográfico Marvel que têm de facto marcas muito deles e que transparecem"

Considera então que este pode ser um dos melhores filmes de Sam Raimi?
Acho que sim. Acho que é mesmo dos melhores filmes dele. Ele já não fazia coisas há algum tempo. Estava aqui a tentar lembrar-me da última coisa que ele fez, mas acho que fez coisas para televisão. Fez aquela adaptação de "O Feiticeiro de Oz", que não foi assim super incrível. Mas este filme, a sensação que dá, e estava a falar disso com o Filipe Homem Fonseca, que também adorou o filme, e eu estava a dizer-lhe: "Epá, o Kevin Feige deve ter aprovado o argumento e depois deve ter dito ao Sam Raimi 'agora faz a tua cena'".

Não acredito que tenha havido alguma restrição ao trabalho dele e essa é das coisas que acho mais giro nisto. De repente, há um punhado de autores a trabalhar no universo cinematográfico Marvel que têm de facto marcas muito deles e que transparecem. Um deles é o Sam Raimi, outro o Taika Waititi, com o "Ragnarok", e agora com o próximo que também de certeza vai ser um filme mais Taika Waititi do que Marvel, e o James Gunn, com os "Guardiões da Galáxia".

E é muito giro quando isso acontece, quando se concilia esse lado de autor, com o respeito que se tem que ter com esse cânone todo. Mas dentro da obra do Sam Raimi, esta é uma das experiências mais alucinantes dele, sem dúvida. E ao mesmo tempo está cheio de piscadelas de olho mesmo a fãs do "Evil Dead". Já para não falar do Bruce Campbell, que faz o — não sei se isto é spoiler (risos) — mas o vendedor da rua acaba a espancar-se a ele mesmo, sendo que o Bruce Campbell é o herói da saga "Evil Dead" e no segundo "Evil Dead", uma das cenas mais míticas é quando ele perde o controlo da própria mão e desata a levar pancada dele próprio. Portanto, para um fã de "Evil Dead" foi lindo de ver.

E o que é que ambicionava adicionar à coleção na sua cave relacionado com este novo filme?
Já não tenho espaço para mais nada (risos). Já não dá para pensar em juntar o que quer que seja mais aqui. Mas...

Se tivesse assim um cantinho.
Aquela criatura, de que agora não me lembro do nome, a criatura dos tentáculos e do olho no início, que acho que ficava ótima numa parede.

Por curiosidade, já que estamos a falar da cave, como é que se limpa uma cave destas?
Acho que entro numa espécie de negação. De vez em quando passo ali um espanador, mas de um modo geral quero acreditar que não há assim tanto pó em cima das coisas.

Partilhou entretanto que já há uma playlist no Spotify com a banda sonora do filme "Doutor Estranho". Em que momentos é que o Markl ouve estas faixas?
Geralmente é muito difícil ouvir bandas sonoras fora dos filmes, porque algumas peças são muito escritas para serem acompanhadas por imagem. Mas algumas ouvem-se otimamente fora do filme. Sou grande fã de bandas sonoras e das coisas que elas evocam só de estarmos a ouvir. E depois como tenho amigos geeks de bandas sonoras também... Já hoje estive a falar com o Filipe Melo sobre esta banda sonora e sobre o Danny Elfman [cantor e compositor], que por acaso tive a sorte de entrevistar quando ele veio ao Fantasporto um ano e é um compositor de que gosto muito.

"O gosto que tenho por estas coisas, fez com que de repente tenha sido visto como uma referência neste universo"

Como é que vivia a cultura pop quando era mais pequeno, dado que não havia internet e tinha menos acesso a conteúdos do que hoje em dia?
É uma boa questão, de facto. Porque não tínhamos assim muitas opções. Lembro-me que comecei a ficar fã da Marvel por causa de uma revista, inicialmente muito manhosa da Agência Portuguesa de Revistas, do "Homem-Aranha". Encontrei alguns exemplares ainda há pouco tempo em casa da minha mãe. Aquilo era num papel muito manhoso, mas de facto eram as histórias de Stan Lee e a minha porta de entrada foram essas revistas. Não havia assim uma oferta muito grande e eu diria que aquilo que me abriu as portas da Marvel foi em parte essas edições da Agência Portuguesa de Revistas e em parte uma figura do Homem-Aranha, de uma marca específica de brinquedos, que é a Mego, que eu lembro-me que um colega de escola tinha. Tinha roupa mesmo, era de pano, e ele levou aquilo para a escola e eu pensei "tenho de ter isto". Massacrei muito os meus pais, porque tinha de ter aquele Homem-Aranha e assim foi. Num Natal ou nos anos, recebi a figura e ainda tenho mais umas figurinhas dessas da Mego. O Hulk também e um Batman. Sei que hoje em dia aquilo vale rios de dinheiro. Talvez não, depois do estado em que ficaram de brincar com elas.

Tirando essas figuras, fez assim alguma loucura para comprar uma banda desenhada (BD), por exemplo?
Não, nem tanto. As loucuras do departamento de BD são mais do Filipe Homem Fonseca, que é daquelas pessoas que compra duas edições de cada comic: uma para ler e outra para ficar dentro de um plástico. Eu não tenho assim tantas bandas desenhadas.

Acho uma bênção tremenda, e os puristas da banda desenhada vão odiar-me por dizer isto, mas no caso da Marvel, uma bênção foi eles terem lançado aquele serviço o Marvel Unlimited online, que é no fundo uma espécie de Netflix de comics. Estão lá praticamente todos. Aquilo tem uma subscrição anual e está lá a história toda da Marvel, em alta definição. E é ótimo para fazer uma espécie de recaps. Por exemplo, agora que está a estrear o "Doutor Estranho" e eles fazem uma espécie de curadoria dos melhores para a pessoa entrar no ambiente.

Mas os meus gastos mais malucos são mais nestas figuras que eu tenho na cave. Mesmo assim tenho estado muito contido por falta de espaço. No entanto, se houver assim uma coisa fora de série, acho que abro espaço. Dou a alguém qualquer coisa ou arrumo noutro sítio.

Por tudo isto que falámos, considera-se assim o pai de todos os geeks portugueses?
Acho que, genericamente, há pessoas mais geek do que eu. Não tenho tempo para ser tão geek quanto eu gostaria. Porque depois tenho o meu trabalho, tenho um filho e às tantas já não é possível ter aquele grau de absorção completo. Há pessoas que têm uma mente muito mais enciclopédica do que a minha. Mas o gosto que tenho por estas coisas, fez com que de repente tenha sido visto como uma referência neste universo, e não me importo com isso, mas sei que há gente muito muito dedicada, quase 24 horas, a este tipo de coisas. Que era o que eu faria, possivelmente, só que depois tenho tantas outras coisas para fazer.

Mas se puder fazer qualquer coisa em que junte as duas coisas é perfeito. Lembro-me que quando estava a escrever "1986", a série, está cheia de geeknesíces lá pelo meio e coisas mesmo das minhas obsessões da infância e juventude, de coisas que via e brinquedos com que brincava. E é muito giro quando se consegue juntar as duas coisas no trabalho.

O que ainda pode acontecer. Alguma vez considerou algum projeto dedicado à cultura pop?
Sim. Uma das coisas que já fiz foi "A Cave do Markl". Era assim uma tertúlia semanal para falar desses assuntos. Depois tive de parar, porque estavam a acontecer muitas coisas, mas é algo que tenho vontade de reativar proximamente. Estar só a falar livremente de assuntos geek. Nem que seja para um número limitado de pessoas. Adorei fazer isso na Comic Con.

Fiz várias edições d'"A Cave do Markl" lá e foi uma coisa muito gira. Lembro-me que havia aquelas sessões em que estava a sala cheia, porque estava lá o Ricardo Araújo Pereira e o César Mourão, nomes que chamavam muita gente, mas depois fiz algumas que eram muito especificas e com muito menos gente.

Houve uma em que foi o Bruno Caetano e o João Pombeiro, que são animadores e foram falar da experiência de fazer animação e dos bastidores, de como se fazem desenhos animados, e teve muito menos gente, obviamente, do que quando tive lá as estrelas grandes. Mas adorei fazer essas sessões, porque as pessoas que estão lá querem mesmo lá estar. E adoro fazer coisas para quem está avidamente interessado, não é só aquele público muito casual que diz: "Estão ali estrelas dentro, vamos vê-las". Por isso, gosto muito quando se fazem coisas com uma audiência mais limitada, mas que está ali a beber cada momento.

Da televisão à rádio, por onde andará o Markl nos próximos tempos

Entrando um bocadinho em tudo o resto que faz. Está a acabar o "Taskmaster". O que é que fica, para já (talvez haverá novas temporadas), deste programa?
É possível que sim [que haja novas temporadas], está a ser pensado. Porque de facto isto superou as expectativas de muita gente. Quer dizer, nós somos fãs do original e sabíamos que era um bom concurso, um bom programa de humor, mas não fazíamos ideia de como é que o público o ia receber. E o facto de as pessoas estarem com essa loucura toda e de repente a RTP1, ao sábado, tem assim uns picos de liderança nas audiências, é uma coisa surreal e muito boa. Será pena se não fizermos uma segunda temporada. Por isso, tudo indica que irá acontecer e que será anunciada em breve.

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E gostou do seu papel no programa?
Ah, por mim tinha só este emprego. Se me dissessem "olha, a partir de agora fazes só 'Taskmaster'", eu ficava "ok". Ficava com saudades da rádio, gosto muito de fazer rádio, mas fui bastante feliz a fazer aquilo, de facto.

Por falar em rádio. Já está há muito tempo a fazer o "O Homem Que Mordeu o Cão" (criado em 1997), uma rubrica que é emblemática. Por quanto mais tempo é que a teremos?
A minha relação com o "O Homem Que Mordeu o Cão" já passou por várias fases. A euforia inicial de começar a ver muitas pessoas a gostar, depois aquela sensação de "meu Deus, mas isto agora já começa a ser demais, tenho de pensar noutras coisas". E de facto inventei outras coisas pelo caminho. Depois houve uma altura em que só pensava "pá, não posso ficar conhecido só pel'"O Homem Que Mordeu o Cão'. Não posso ser enterrado e na minha pedra, no meu túmulo, falar-se em Nuno Markl, 'O Homem Que Mordeu o Cão'. Tenho de mostrar que sou capaz de fazer outras coisas".

Mas depois comecei a abraçar a parte boa do "O Homem Que Mordeu o Cão". Uma das coisas que faz com que aquilo dure há tantos anos, e que as pessoas ainda não tenham perdido o interesse, é que aquilo, na sua essência, é contar histórias. É contar histórias irreais que aconteceram a pessoas e estão sempre a acontecer coisas a pessoas. Portanto, há sempre histórias para contar, sempre coisas para experimentar e enquanto a humanidade for o que é, e me acontecerem desastres que meto lá pelo meio, funcionará sempre. E é muito giro ver várias gerações que passaram pelo "O Homem Que Mordeu o Cão".

Foi também o que me fez perceber que estou a ficar velho. No início havia pessoas que diziam "a minha avó gosta muito de te ouvir". E eu pensava "pá, fenomenal. Estou a chegar às gerações mais velhas". E depois essa coisa foi mudando ao longo do tempo. "A minha avó gosta muito de te ouvir" e na minha cabeça pensava "bom, continuo a chegar às gerações mais velhas". Mas depois olho e são pessoas de barba que me estão a dizer isto.

Acima de tudo é também algo que faz muita falta nos tempos que vivemos, porque entretém.
Sim, as pessoas dizem-nos isso. Que há um conforto que estejamos lá todos os dias a contar as histórias. E o que é certo é que a rubrica vai fazer agora 25 anos, em outubro, e estou aí planear coisas. Estou a escrever um espetáculo para celebrar os 25 anos, que acho que vai ser engraçado. Já tínhamos feito um quando foi os 20 anos e agora estou a pensar num conceito assim diferente.

Na rádio, há algo mais que gostasse de fazer?
Isso é sempre uma boa questão, porque acho já fiz tanta coisa em rádio, que já não sei bem o que é que hei de fazer. Por acaso estou agora a fazer aquela rubrica "As Minhas Coisas Favoritas", que me dá muito gozo fazer, porque geralmente para fazer comédia convém que haja alguma coisa que corre mal e que haja conflito. E o que acho giro enquanto desafio é fazer comédia sobre coisas boas, de que gostamos. Porque é mais fácil fazer comédia com coisas de que não se gosta. De resto, acho que já fiz de tudo. Já fiz rádio-novela, já fiz sketch, crónicas. Mas continua a ser um meio que adoro, mais do que a televisão. Esta coisa de podermos pôr as imagens na cabeça das pessoas que estão a ouvir é muito giro.

E há alguma perspetiva de projetos com Bruno Nogueira, dado que ficou muito marcada a relação entre os dois em "Como É Que o Bicho Mexe?" e depois em "Princípio, Meio e Fim”?
Sabemos que eventualmente iremos gravitar na direção um do outro, nem que seja porque nunca demos por terminado "Uma Nêspera no Cu", aquela coisa que fazemos com o Filipe Melo também. E temos sonhos para fazer ainda à volta da "Nêspera".
Falamos praticamente todos os dias, portanto, acompanhamos muito o trabalho um do outro e pedimos muito feedback um ao outro, logo é normal que mais dia menos dia nos reencontremos nalgum projeto. Para já, adorava convencê-lo para na segunda temporada do "Taskmaster". Tê-lo como convidado, porque era incrível.

Acha que aceita?
Não sei, não sei. Não faço ideia. Já lhe fui mandando as cabras (risos).

Em tanta coisa que faz — é animador de rádio, humorista, argumentista —, afinal, quem é que é o Nuno Markl?
É uma boa questão. Acho que aquilo que eu sou transparece nas várias coisas que faço. Seja o que for. Numa série, como a "1986" que escrevi, seja nas coisas que vou contando na rádio sobre desastres que me acontecem. Acho que, olhando assim para o meu trabalho, não há nada que eu faça que seja indiferente àquilo que sou. Não há assim nenhum trabalho de encomenda em que dispa a pele do Markl e escreva de outra maneira para que pareça outra coisa que não sou.

Portanto, acho que se percebe mais ou menos aquilo que sou com base nas coisas que digo e escrevo. Até mesmo no Taskmaster", onde se vê que sou uma pessoa muito disponível para carregar outras às costas e depois estar ali ao serviço (risos).

Mas acho que estou espalhado pelos vários projetos que faço. Já não faço nada que não queira fazer. Ou seja, houve um tempo em que aceitava fazer muitas coisas, depois arrependia-me de algumas porque estava super desconfortável a pensar "porque é que aceitei fazer isto e achava que conseguia meter algo meu nisto?" e agora sinto que estou a conseguir fazer coisas nas quais consigo ser eu e isso é ótimo.