Há cerca de três anos MARO deu-se a conhecer ao mundo, em especial aos portugueses, com o lançamento do primeiro álbum. Pisou os palcos do Teatro Capitólio, em Lisboa, e da Casa da Música, no Porto, para dar mostrar o novo disco que reunia composições que fizera desde pequena, mas desde então muita coisa mudou.

Foi convidada para uma digressão com o músico britânico Jacob Collier a propósito do lançamento do segundo álbum do artista, "Djesse", cuja tournée internacional começou em 2019 em Lisboa — precisamente a cidade que acolhe as origens de MARO. Jacob começou por ser um sucesso no YouTube e depressa foi reconhecido no mundo da música, o que já lhe valeu vários Grammys, dois deles com apenas 22 anos após lançar o primeiro álbum "In My Room", gravado no quarto. Ao acompanhar a tour de Jacob Collier, além de ter tudo oportunidade de partilhar o tema "Lua", MARO teve também espaço no palco do artista para mostrar as suas canções.

Mas o convite irrecusável que durou um ano, não foi renovado em 2020. Não devido à COVID-19, a decisão veio ainda antes de o mundo parar, mas sim por força e vontade maior de MARO em lançar-se no mundo da música e ver o seu nome num álbum independente, planeado com tempo, com empenho, com uma equipa dedicada e com temas que já não são os que escreveu desde que começou a compor, por volta dos 11 anos.

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A MAGG esteve à conversa com a artista portuguesa para saber quem é MARO, agora com 26 anos, que está prestes a lançar um novo álbum que é o reflexo de uma MARO mais madura e experiente no mundo da música e com vontade de fazer grandes espetáculos. Os planos de lançar o álbum no ano passado saíram furados devido à pandemia, este ano também não está a ser fácil, mas para rematar bem 2021, a artista portuguesa planeia lançá-lo no fim do ano.

Entretanto, tem dado cartas (ou vídeos) no Instagram, através do qual partilha sessões em que canta lado a lado, mas com distanciamento virtual, de reconhecidos artistas nacionais e internacionais. Um deles é o cantor brasileiro Vitor Kley, bem como o guitarrista britânico Eric Clapton, mas também já passaram nomes portugueses como Rui VelosoMarisa Liz e Tiago Nacarato.

Além do palco no próprio Instagram, outro mais recente que pisou foi o das sessões "Como é Que o Bicho Mexe", do anfitrião Bruno Nogueira, por quem foi convidada após uma mensagem com uma breve apresentação que surpreendeu MARO. "Achei engraçado, porque quase toda a gente em Portugal, pelo menos da nossa faixa etária, acho que sabe quem ele é", conta à MAGG.

MARO

MARO falou-nos sobre o percurso na música — que começou com aulas de piano e prosseguiu de forma mais séria na faculdade Berklee College of Music, em Boston, EUA —, o novo projeto e os sonhos do futuro (nunca impossíveis).

No Instagram apresenta-se como "ITS ME, MARO!". Mas quem é, afinal, a MARO?
Então, quem é que a MARO? (Risos). Sou portuguesa, de Lisboa. Tenho 26 anos, fiz agora em outubro. Estudei sempre música, desde os quatro anos, quando comecei no conservatório de piano.

MARO
créditos: maro.musica/Instagram

O gosto pela música teve alguma influência familiar?
A minha mãe é professora de música na Escola Superior de Música de Lisboa e sempre foi a força em casa para nós estudarmos e tudo, mas na realidade não foi só por causa da minha mãe que a paixão pela música cresceu.

Porque o meu pai, que nunca fez música profissionalmente, gosta imenso de tocar guitarra e mais que tudo ele é apaixonado por música e por música do mundo. Tudo o que ouvi ao longo da vida e que adorei foi sempre o meu pai que pôs no carro ou que me mostrava. Lembro-me que, mais tarde, quando já estava em Boston, ele ia mandando sempre coisas. Houve uma grande influência musical em casa. Tanto a mãe que cantava para nós quando éramos pequeninos, até ao meu pai que sabe as datas específicas dos concertos a que foi na vida toda.

Começou por aprender o quê? Algum instrumento ou por canto?
Nunca foi canto, na verdade. Nunca tive aulas de canto e é um bocadinho uma coisa mais intuitiva, se calhar porque a minha mãe cantava lá em casa assim antes de irmos dormir quando eramos pequeninos, mas o canto sempre foi como falar. Aquilo que eu estudei a vida toda foi piano. Fiz 14 anos de conservatório de piano e depois a guitarra e o canto vieram por gosto, mas como autodidata.

Quando é que a música se tornou algo mais sério?
Fiz o conservatório de piano, só que quis sempre ser bióloga e fiz Ciências e Tecnologias até ao 12.º ano. Esse é o background (histórico) académico. Depois aos 19 anos percebi que queria fazer música, porque para mim (a música até aqui) era um bocado estudar e uma guerra nesse sentido. E aos 19 percebi que não fazia sentido porque eu adorava escrever as minhas musiquinhas e tocar.

Foi aí que descobri a Berklee College of Music (em Boston, Estados Unidos), concorri e acabei por entrar com bolsa e fui estudar para lá. Formei-me em professional music (musica profissional), que basicamente é um curso da Berklee um bocadinho mais vasto, assim dá para a pessoa escolher o que quer. Porque, no fundo, o que eu sempre quis fazer era a minha música e seguir com os meus projetos e não estava assim muito preocupada em fazer um curso mais específico.

Depois em 2018, quando acabei o curso, decidi ir viver para Los Angeles, onde fiquei a trabalhar nas minhas coisas. Acabei por editar os cinco álbuns que saíram e fui em 2019 para a tour com o Jacob (Jacob Collier). Acabámos por nos conhecer porque ele me mandou uma mensagem no Instagram. Depois ele foi a LA, encontrámo-nos e acabámos por gravar também o tema "Lua". Em 2020, tinha decidido não fazer a tour com o Jacob porque queria começar a fazer o meu próximo álbum e entretanto ficou tudo parado e atrasou para este ano.

Estava a falar de Los Angeles. Qual é a maior diferença entre ser artista lá e em Portugal?
Sinto que... e às vezes tenho pena de sentir isso porque eu adoro Portugal e sempre que tenho oportunidade volto, até porque tenho a minha família cá e sempre fui assim super orgulhosa do meu País e da nossa cultura e falo muito do meu País lá fora. Só que, realmente, há uma coisa cá que é teto. Sinto que aqui se calhar não dá para sonhar tão alto, enquanto lá fora eu posso pôr uma meta completamente absurda e há sempre maneira de fazer acontecer. Consigo sempre encontrar alguém que acredita nas suas coisas e nos seus projetos e faz acontecer. É uma coisa que eu nunca senti tanto aqui. Sinto sempre que há um nível máximo que dá para chegar e lá fora não há limite.

Agora que está em Portugal?
Agora estou. Quando começou a pandemia eu estava em Los Angeles, ia arranjar casa outra vez, tinha acabado de decidir que não ia para a tour (com o Jacob) e ia ficar instalada lá outra vez. E pronto, o vírus começou e eu fui cinco meses para o Brasil e depois vim para Portugal para conseguir aproveitar uns tempos com a família já que é um tempo mais parado. E entretanto tenho ficado até agora.

E a ideia é ficar mesmo por cá ou não?
Como vou lançar o meu álbum este ano, vou viver três meses em Paris, de abril a junho, a trabalhar nuns projetos que estou a fazer, mas a ideia é voltar para cá e provavelmente ficar até dezembro. Claro que eu nunca sei e as coisas podem mudar e posso, sei lá, ter novas oportunidades. Mas a ideia é ficar cá e aproveitar a família este ano e depois com o álbum lançado no final do ano, começar 2022 em força com tours e todos os projetos em que tenho estado a trabalhar.

Há uma característica nas suas músicas e na forma como canta que é o facto de transmitirem muita paz. Onde é que vai buscar essa plenitude?
Não sei. Não acho que seja uma coisa que tente procurar. É mais, se calhar, a música em si faz-me sentir assim e isso passa para fora. Porque eu nem sabia que passava para fora. Até porque eu não consigo ouvir a minha música como os outros ouvem. É sempre diferente quando a pessoa ouve o próprio trabalho. Só que sei que a música me faz sentir isso, portanto ao sentir isso quando toco, sai para fora.

Tendo em conta esta característica, de paz e calma, como é que lidou com o confinamento?
Eu tive imensa sorte, não vou mentir. Obviamente que houve várias coisas que eu tive que foram bastante difíceis, enfim, o meu avô morreu há uns meses e eu sempre vivi quase com os meus avós. Houve muitas coisas meio difíceis, mas ao mesmo tempo imensa sorte. Consegui ir para o Brasil uns meses e fiquei na casa da minha família emprestada brasileira, no interior de São Paulo, numa quinta super bonita com um estúdio. Deu para estar isolada mas com cabeça limpa, com tempo para tocar e tinha um estudiozinho se eu quisesse gravar.

E em Portugal a mesma coisa. Estou a tentar de certa maneira ver o lado positivo desta coisa que é "ok, agora não tenho que viajar ou trabalhar de manhã à noite", então estou a aproveitar para fazer uma série de coisas que habitualmente não faria. Como passar mais tempo com a minha família, a voltar a ler imenso, porque eu sempre adorei ler e deixei de ter tempo, e escrever temas. No Brasil todos os dias escrevia canções. Mas claro que também tenho sorte, não é. Estou numa situação privilegiada em que, sei lá, não tinha aberto um restaurante que de repente teve de fechar.

E mesmo assim consegue manter a criatividade.
Sim. Acho que não afetou muito isso em mim, na verdade. Mas se calhar também por ter calhado num ano em que eu já queria trabalhar no meu álbum e isso para mim já me entusiasma muito, então acho que alimentou esta sede de fazer mais coisas porque já estou a fazer um projeto de que gosto tanto e que estou desejosa que saia.

Isso nota-se também no facto de não estar parada. Tem lançado uma série de vídeos com outros artistas no Instagram desde maio. Como é que surgiu essa ideia?
Foi perceber "o mundo vai ficar parado" e no início sei que diziam que seria um a dois meses, mas por alguma razão eu já assumi que nunca ia ser menos de um ano. E o facto de pensar isso fiquei "ok, como é que posso continuar a falar e a tocar com músicos de quem gosto e de certa maneira esta ativa no Instagram". Eu não dedico o meu tempo ao Instagram a não ser para partilhar trabalho. E é incrível que seja uma ferramenta de conexão com as pessoas que gostam e apoiam a música. Foi então uma maneira de conseguir tocar com as pessoas de quem gosto e ao mesmo tempo de conseguir que isso fosse uma coisa partilhada com as pessoas que gostam do meu trabalho.

Visto que o confinamento ainda está para durar, há assim alguém com quem ambiciona partilhar o ecrã?
(Risos). São 100 (vídeos) no total, acho que saíram menos de 60, portanto ainda faltam uns 40 e tal. Mas já são vários feitos e ainda vão sair muitos com artistas que eu admiro.

Recentemente participou nos diretos do Bruno Nogueira. Como é que surgiu esse convite?
É engraçado porque é sempre por Instagram. Quando foi a história do Jacob, ele tinha visto o meu Instagram e mandou mensagem. Acho que com o Bruno foi a mesma coisa. Digo "acho" porque não sei se ele descobriu o meu Instagram, mas sei que mandou mensagem por lá a apresentar-se, o que eu achei engraçado (risos), porque quase toda a gente em Portugal, pelo menos da nossa faixa etária, acho que sabe quem ele é.

Mas pronto, foi super querido, a dizer que era o Bruno Nogueira, que tinha esse projeto ("Como é Que o Bicho Mexe") e que gostava imenso que eu fosse lá cantar. E foi assim. Obviamente que eu sabia quem ele era e achei que seria um privilégio e disse que sim.

E qual é que foi a sensação de saber que estava com milhares de espetadores e com o Bruno Nogueira a assistir à música que tocou, sabendo o peso que ele tem neste momento?
Não vou mentir, dá sempre assim aquele nervosinho. É aquela coisa de "estou normal", mas de repente no segundo em que aparece aquela na câmara para entrar ou aceitar convite, começo a cantar e estou nervosíssima. Mas depois, já com o Jacob era a mesma coisa, quando é para muita gente chega a um momento em que me lembro porque é que estou a fazer isto na realidade, entro na música e esqueço o resto.

Em 2019 deu 90 concertos, passou por 28 países e guardou "incríveis memórias". Em 2020 teve de cancelar o lançamento do novo álbum e 2021 também não está a ser fácil devido à pandemia de COVID-19. Quando este confinamento acabar, o que é que quer fazer, além do álbum que já tem em mãos?
A ideia é lançar o novo álbum no final do ano — vai ser bastante diferente, porque eu até agora fiz tudo assim super independente, lançava e não avisava (risos), e desta vez vou lançar uns singles. Depois toda a gente vai ver, mas é uma coisa feita com mais calma, mais preparada e é o que eu quero fazer agora. Porque tudo o que lancei até agora foram coisas que escrevi quando era mais nova e que eu quis gravar e lançar, mas mais como uma espécie de "ok, isto está feito e vou seguir em frente". E desta vez não. Desta vez é um projeto que eu estou a fazer porque é o que eu quero tocar ao vivo quando as coisas começarem a andar. Portanto, a ideia é essa: lançar o álbum no final do ano e em 2022 partir com o meu mega show preparado e conseguir fazer uma digressão mundial em meu nome mesmo. Se isso fosse possível, era incrível.

Sente que está num momento de ascensão na carreira?
Sim. Acho que está a começar agora. Eu decidi fazer música e na hora em que decidi fui fazer três anos de escola, portanto, nunca foi assim uma exploração de carreira. Depois em 2018 ia começar e entretanto fui na tour com o Jacob, o que obviamente é uma coisa boa, mas nunca foi assim uma aposta a 100% em MARO.

Sinto que este ano é que vai começar essa aposta de "vamos com tudo". É a primeira vez que tenho uma equipa e a primeira vez que tenho ajuda e em que posso explorar melhor e com mais tempo as ideias que quero. Portanto, sinto que é agora que começa a parte mais especial. A tour com o Jacob em 2019 foi incrível, até para as pessoas saberem quem eu sou e obviamente já conta com uma ascensão, mas sinto que agora é que estou a começar eu, como MARO.

MARO
créditos: Rodrigo Simas

E a longo prazo até onde é que quer chegar? Tenho algum sonho?
Tenho sonhos, só que são obviamente todos altíssimos e, enfim, talvez não os partilhe. Na realidade, acho que vão acontecer e eu sempre tive uma crença muito forte nesta coisa de que quando se quer, se trabalha para isso e se gosta muito daquilo que se faz, acho que realmente pode acontecer. Mas uma coisa é garantida: se pudesse para o resto da vida fazer música, tocar assim grandes shows e trabalhar com as pessoas de quem mais gosto, não só no meio musical, mas também a nível visual — também gosto muito desse lado das coisas —, se conseguisse fazer isso, seria o derradeiro sonho.

Nunca há limites, mas o tempo também o dirá. Até porque como vimos este ano que passou tudo é imprevisível.
É mesmo isso. Eu prefiro quase não pôr para fora, é mais uma espécie de um foco para quando eu trabalho. Saber onde quero chegar, mas não é uma coisa que ponha para fora. Até porque nunca se sabe se daqui a 10 anos percebo que não é nada disto que eu quero.

Quanto a projetos com a MARO e mais alguém, como um ídolo, com quem ambiciona partilhar uma música ou um palco. Alguma coisa em vista?
Vários. Tenho, por exemplo, os ídolos brasileiros como o Chico Buarque, Milton, Gilberto Gil, Caetano Veloso, mas também Pablo Alborán, o Camilo. São tudo pessoas que eu hoje em dia também posso chamar de amigos, mas seria na mesma uma honra porque admiro muito o trabalho deles.

Mas há sempre um monte de pessoas. Lennon Stella, era brutal abrir uma tour para ela. Madison Cunningham, é uma artista que ando a ouvir todos os dias e seria brutal fazer algo com ela a nível de concertos. A lista é um bocadinho infinita. E acho que ter ídolos e pessoas que admiro é bom para continuar motivada.

E quanto a referências portuguesas, quais são?
Rui Veloso não é? Toda a gente cresceu a ouvir o Rui. Também Luísa Sobral. Acho-a uma compositora incrível. António Zambujo é um cantor incrível. Salvador Sobral é um cantor incrível. Os Ornatos Violeta têm coisas incríveis. A Carolina Deslandes, estou sempre a dizer que ela escreve coisas lindas. Temos um monte. Desde o fado, com Ana Moura, Gisela João, Carminho. Felizmente a cena musical em Portugal também tem coisas incríveis e super interessantes.

Comecei por perguntar quem é a MARO. Para finalizar gostava de saber quem é que não é a MARO?O que eu posso dizer é que sei porque é que faço música e que eu tenho de adorar o que eu faço. Portanto, quem não é a MARO é alguém que vai fazer coisas com as quais não concorda ou que não gosta e que sejam só com outros intuitos, como vender. É alguém que não faz as coisas com total dedicação e coração. Isso não sou eu.