Confesso que sou uma pessoa com uma incapacidade ilimitada para se assustar. Não sei muito bem de onde vem isto, já tentei tudo para controlar estes impulsos, infelizmente estou quase com 30 anos e não há como resolver o assunto. Se o metro para, o meu coração acelera. Se alguém me aborda de rompante na rua, dou um pulo (ou grito, também é frequente). Se um filme de terror começa na televisão, eu já estou em pânico antes mesmo do primeiro diálogo.

Esta estranha forma de viver explica o porquê da minha entrada na RM Guest House — The Experience ter sido tudo menos pacífica. Quando a porta da rua se abriu e dei os primeiros passos no pequeno corredor em direção às escadas, dei um pulo para trás quando me apercebi de que alguém estava do meu lado direito. Não estava, era o meu reflexo no espelho. Olho para a esquerda e dou um novo pulo. Respiro novamente fundo. É o meu reflexo no espelho outra vez.

Não consigo contabilizar a quantidade de entrevistas que faço por semana. Por ano, serão seguramente centenas. A grande maioria não demora mais do que dez minutos, outras prolongam-se durante horas. Mas são poucas, muito poucas aquelas que me ficam na memória anos depois. Foi o caso da conversa que tive com Romeu Martins em setembro de 2016, na altura em que abriu a RM Guest House em Setúbal.

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Recordo-me dessa chamada quando chego ao cimo das escadas e vejo um enorme porco amarelo a olhar para mim. Era ele a estrela da primeira fotografia que o proprietário me enviou do espaço. Tenho de sorrir: quando abri aquela imagem, perguntei-me o que raio fazia um porco amarelo numa guesthouse em Setúbal. Quando falei com Romeu Martins e recebi as restantes fotografias, percebi que estava ali porque esta não era uma casa qualquer. E que sim, um porco amarelo tem tudo para resultar numa casa onde é suposto ser tudo diferente. E bonito — muito bonito.

A RM Guest House venceu os World Luxury Hotel Awards na categoria de South Europe Guest House no ano passado. E agora em agosto foi novamente nomeada. O que é que uma guesthouse em Setúbal tem de tão especial para depois de ganhar um prémio tão prestigiado estar outra vez nomeada? Foi exatamente isso que fomos descobrir.

Nesta guesthouse as suites inspiram-se na moda

Por cima do Museu do Choco, e em plena Avenida Luísa Todi, a RM Guest House tem sete suites, todas inspiradas na moda. A decoração foi pensada pelo proprietário, Romeu Martins, juntamente com a mulher, Rita. As malas, sapatos lingerie compõem o look de cada quarto, onde não faltam ainda lençóis 100% de algodão, arranjos florais, máquinas de café Nespresso, camas queen size e uma garrafa de vinho de boas-vindas.

Fiquei alojada na suite N. 5, inspirada em Coco Chanel e no seu emblemático perfume. Chamar-lhe suite talvez não seja fazer-lhe a devida justiça: com um pé direito imponente, paredes pretas e vista desimpedida para a avenida, este é um daqueles locais onde entramos e temos imediata certeza de que nunca vimos nada assim. Nem sequer numa revista. É único. Belo. E só existe em Setúbal.

Na RM Guest House não há serviço de spa, piscinas infinitas no rooftop (nem sequer tem rooftop), jacuzzis, restaurantes com estrela Michelin ou acabamentos em folha de ouro. Com exceção da entrada, onde fica a receção, e de uma sala de estar, resume-se a um corredor com quartos. Só que isto torna-se incrivelmente fantástico quando cada porta nos leva, literalmente, a uma aventura. Ou fazendo justiça ao nome, a uma experiência.

Durante algum tempo, fiquei simplesmente sentada na cama a olhar para o quarto. A mesa embutida na parede, o painel com o perfume da Coco Chanel, o pormenor da enorme moldura branca que compõe todos estes elementos. Numa altura em que parece que já foi tudo feito, e que abrem cada vez mais hotéis, hostels e guesthouses que nada de diferente têm para oferecer, a RM Guest House é especial. E é especial precisamente por ser única.

Não é possível encontrar um quarto assim em nenhuma outra parte de Portugal, nem sequer do mundo. Para viver esta experiência, tem de estar ali, em Setúbal, na RM Guest House. Mais especial do que isto impossível.

Se a decoração é impecável, a parte útil e prática do quarto também não falha. O colchão em gel e viscoelástico é perfeito, os lençóis 100% algodão — 305 fios totalmente produzidos em Portugal pela Lameirinho, fico a saber depois — também. As almofadas por cima da cama estão na quantidade que eu adoro, que é a chamada quantidade certa: seis.

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O meu único reparo vai para o chão do chuveiro, um pouco escorregadio. Algumas movimentações revelaram-se um pouco perigosos, o que me obrigou a ter mais cuidado no banho do que o habitual. Felizmente os amenities Molton Brown fazem esquecer os sustos.

Os croissants mais maravilhosos do mundo estão aqui

O pequeno-almoço é servido no Museu do Choco, e merece que falemos sobre ele com calma. O espaço, que também pertence a Romeu Martins, é muito charmoso — com grandes candeeiros, aquários elegantes, cadeiras e sofás confortáveis e muitos apontamentos em madeira. É um daqueles sítios onde entramos e queremos ficar com tempo. E faz sentido que o façamos.

Na mesa de pequenos-almoços são os croissants que saltam à vista. Contrariamente aos que enchem habitualmente as travessas nos hotéis, estes são enormes, dignos de uma montra de pastelaria. Agarro-me a um com sementes como se não houvesse amanhã e sinto que o céu desceu à terra e entrou naquele croissant. Que coisa maravilhosa. Com queijo e fiambre fica delicioso, com Nutella ainda melhor, com a compota de abóbora descubro a perfeição. Incrível.

Os croissants eram maravilhosos

A variedade de bolos e de pão também é simpática. E tal como os croissants, o interessante é que parece que estamos mesmo a olhar para uma montra, daquelas que nos fazem parar e sonhar. A melhor parte é que ali não temos de fazer contas ao dinheiro que trazemos na carteira. É só agarrar e meter no prato.

Os ovos estavam um pouco passados demais para o meu gosto, mas o tempero compensou tudo. Em último lugar, obrigada RM Guest House por não tirarem a polpa do sumo. Nove em cada dez unidades de alojamento têm o péssimo hábito de tirar a polpa porque, vá-se lá perceber porquê, é assim que a maioria das pessoas prefere bebê-lo. Pois bem, acho mal e proponho-me lançar uma hashtag chamada salvem a popa — #salvemapopa. É o melhor do mundo.

Consoante a época e a tipologia do quarto, os preços variam entre 100€ e 210€ por noite, para duas pessoas e com pequeno-almoço incluído.