Agnes e Angela (nomes falsos) eram raparigas aparentemente normais. Vinham de boas famílias, estudavam nas melhores escolas de Itália e viviam no distrito mais exclusivo e caro de Parioli, em Roma. Talvez tenha sido por isso que as suas opções de vida tenham chocado grande parte do país quando, em 2014, se descobriu que estas miúdas de 14 e 16 anos, tinham decidido prostituir-se — não porque tinham dificuldades, mas sim porque queriam comprar os produtos mais caros e luxuosos que conseguissem, como roupa ou telemóveis.

Segundo a revista "The Daily Beast", que teve acesso aos detalhes da investigação, tudo começou quando as duas raparigas procuraram no Google por "formas fáceis e rápidas de fazer dinheiro".

"Queria ter muito dinheiro e não queria deixar de ter aquilo que queria", revelou uma das raparigas durante as sessões de interrogatório da investigação. O problema é que, o dinheiro que ambas recebiam ao vender o corpo a estranhos era mesmo fácil. Demasiado fácil, até.

"Elas faziam demasiado dinheiro, mais de 500 ou 600€ por dia ou 300€ por performance. Com o tempo, foi-se tornando cada vez mais difícil abdicar daquilo que ganhavam ao prostituir-se", revelou à mesma publicação Maria Monteleone, uma das procuradoras envolvidas no caso.

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Foi essa quantia que preocupou os pais de Angela que, por desconhecerem a origem do dinheiro, alertaram a polícia para a possibilidade de a filha estar envolvida em alguma organização que a mantivesse como escrava sexual.

Não existia uma organização, mas sim um indivíduo que publicava anúncios em várias plataformas online para aliciar jovens a se prostituírem. A promessa era sempre a mesma: a garantia de que iriam ganhar muito dinheiro e de forma quase imediata. E era quase sempre assim.

Mas se no caso de Angela, os pais se envolveram assim que se aperceberam do que estava a acontecer, com Agnes foi tudo mais complicado. É que além de gastar o dinheiro que recebia em roupa ou em telemóveis ou jogos, a jovem começou a usar o dinheiro da prostituição para ajudar a mãe que, recentemente divorciada, estava a passar por dificuldades financeiras — e usou isso como pretexto para obrigar a filha a não parar de se prostituir.

Numa das conversas por telefone entre as duas, gravadas pela polícia e às quais a revista "The Daily Beast" teve acesso, ouve-se Agnes a pedir à mãe que a deixe sair do "trabalho" (leia-se esquina) onde tinha de ficar, porque não se estava a sentir bem.

"O que é que vais fazer, afinal? Estou com pouco dinheiro e precisamos urgentemente de recuperar os fundos que perdemos", mas a filha continuou a insistir que não se sentia bem e que, além disso, tinha ainda a escola, as aulas e os estudos com que se preocupar.

"Ou trabalhas ou estudas. Como é que cobrimos as despesas desta semana? Talvez possas estudar antes do trabalho, ou alternar os dias em que o fazes", disse à filha.

Assim que as investigações chegaram ao fim, à mãe de Agnes foram-lhe retirados todos os direitos sobre a filha e foi sentenciada a seis anos de prisão por exploração infantil e negligência. As raparigas foram colocadas num programa de proteção de testemunhas e encontram-se até hoje a receber apoio psicológico não só devido ao trauma a que foram sujeitas, mas também à dependência extrema do dinheiro.

É que mesmo depois de o caso ter sido encerrado, ambas continuaram a manter alguns dos seus clientes habituais devido à facilidade e regularidade com que conseguiam pequenas fortunas.

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Esta história serviu de inspiração para a nova série da Netflix chamada "Baby". Estreada a 30 de novembro, já está envolvida em polémica depois de ter sido acusada de "normalizar o abuso sexual, o tráfico de menores e a prostituição", e é a terceira polémica em que a plataforma de streaming se vê envolvida depois da série "Insatiable" e "Por Treze Razões".

Numa sessão de apresentação da série, escreve a revista "Variety" que Andrea De Sica, realizador, defendeu o propósito da sua produção ao afirmar que se tratava de uma história verdadeira onde eram dadas a conhecer escolhas de vida e conflitos internos.

"Tentámos ser o mais fieis possíveis à história original, tendo em conta todo os conflitos e as histórias de vida que abordámos. O que vão ver nos episódios de 'Baby' não é uma crónica de eventos reais, apesar de se basear numa história verdadeira, mas cabe ao espectador tirar as suas próprias conclusões", revelou.