Luana Piovani atende o telefone. Como combinado, no seu dia de folga, na reta final das gravações de "O Clube". Na série da OPTO SIC, que estreou a 18 de dezembro, a atriz brasileira, radicada há dois anos em Portugal, dá vida a Michele, uma das acompanhantes de luxo da casa de diversão noturna retratada na trama realizada por Patrícia Sequeira.
Luana Piovani é uma megaestrela no seu país natal, daquelas que é notícia apenas por fazer um story ou publicar uma fotografia nas redes sociais. Não se furta a polémicas, não esconde estados de alma. E, como muitos dos seus compatriotas, habituados a um nível de mediatismo a anos luz do que se vive por cá, fala sem pudores de tudo. Até puxa conversa sobre o novo namorado, com quem vai passar o Natal, o primeiro longe dos pais (que vivem no Brasil) e dos filhos. A atriz é mãe de Dom, de oito anos e dos gémeos Bem e Liz, de cinco, fruto da relação, entretanto terminada, com o surfista Pedro Scooby.
Como é que surge a oportunidade de participar em "O Clube"?
Ligaram no meu telefone, convidaram-me para ir até à produtora Santa Rita porque tinham um convite para fazer uma série da SIC. Fui até lá, eles explicaram-me o que era e eu, na hora, topei.
O que é que a fez aceitar logo este papel?
Mais até do que esse papel, eu tive vontade de participar nesta minissérie porque acho uma ousadia necessária para Portugal, tanto pelo inverno como pelos produtos que temos aqui. Eu acho um pouco conservador aquilo que se apresenta na televisão portuguesa, então fiquei muito orgulhosa de ser chamada para fazer parte de um projeto ambicioso e ousado.
Eu gostei muito de como a Patrícia [Sequeira], por quem eu tenho a maior admiração e carinho, se colocou. Ela não teve medo de usar a palavra "erótica". E eu gosto de pessoas que são autoconfiantes e que não têm medo do seu poder. Ela disse "vamos fazer uma minissérie erótica" - ela não teve medo dessa palavra - "mas dirigida por mim, com muito cuidado e elegância". Ela não precisava ter-me dito mais nada.
Sendo Portugal um País europeu e tendo acesso a muitos produtos de ficção, os nossos produtos, sejam cinema ou televisão, são extremamente conservadores. Nunca vimos em TV algo semelhante às cenas do primeiro episódio de "O Clube". Isso causou-lhe receio em relação à reação das pessoas?
Não, pelo contrário! Causa-me alegria e esperança porque a gente precisa evoluir. A gente tem de tirar as nossas cercas do lugar. É preciso ampliar a visão, os horizontes. Dentro do respeito e da liberdade de cada um, é preciso que a gente amplie os nossos horizontes.
"Acho um pouco conservador aquilo que se apresenta na televisão portuguesa"
Quem é a Michele, a sua personagem?
Ela é uma brasileira que vem buscar a sua independência aqui. Ela é muito bonita. É um caminho que lhe é apresentado muito rapidamente. Ela percebe que faz um sucesso enorme e opta por seguir essa vida e é bastante satisfeita com isso. É uma mulher alegre. Claro que, como a maioria dos seres humanos, tem vontade de encontrar alguém, mas ela coloca a independência dela antes disso e segue a vida pensando que, apesar de ter vontade de ter, é possível que ela não tenha por ter escolhido esta vida de prostituição. Ainda assim ela segue, porque ela quer liberdade e independência.
Como é que a Luana e o restante elenco feminino se preparou para esta série?
Houve uma visita das outras atrizes até ao Elefante Branco, conversaram com as meninas… Porém, eu já frequentava o Elefante Branco, já conhecia as meninas, já fiz outras personagens parecidas, então eu não precisei fazer exatamente nenhum tipo de preparação. Mas eu tinha todas as informações e dados à mão.
Talvez isto vá soar um pouco preconceituoso mas não é costume, pelo menos em Portugal, uma mulher assumir publicamente que vai ao Elefante Branco.
Eu inclusive postei quando lá fui e gerou uma fofoca enorme no Brasil! O dono do Elefante Branco, o senhor Luís [Torres], foi ao meu aniversário. Há muito tempo que não tenho medo do que as pessoas pensam. Pago as minhas contas, acho que respeito a gente conquista com trabalho e eu sou impecável no meu trabalho, então realmente eu vou para os copos, dançar e divertir-me onde eu bem quiser!
Qualquer coisa que a Luana faça é notícia no Brasil. Em Portugal, a imprensa é menos agressiva...
… Graças a Deus! É um dos motivos para eu estar aqui.
Mesmo estando à distância, qualquer coisa que a Luana faz é notícia.
Eu acho bastante curioso, mas como eu já vivo essa vida há muitos anos, e fiz análise há muitos anos, eu suspeito que isso se dê pelo facto de eu nunca ter sido a personagem que a sociedade queria que eu fosse. Acho que as pessoas têm curiosidade sobre as pessoas que têm coragem de ser quem elas são.
Mas acha que a sociedade, na qual cresceu e se tornou figura pública, queria que fosse o quê? Uma menina bonita?
Uma menina bonita que fizesse uma novela por ano na rede Globo e que ficasse lá o resto da vida.
Mas isso não aconteceu porque a Luana não quis.
Não. Desde muito nova, a Luana sempre prezou muito a sua própria liberdade.
"Não tenho vontade de voltar para o Brasil. Aqui sinto-me segura"
Como é que foi trabalhar com atores e equipas técnicas portuguesas? Muito diferente em relação ao Brasil?
Não, não. Pouca diferença. Foi muito gostoso, as pessoas foram gentis. Na equipa, houve aquela sensação de que o de cada um era importante para todos. Fico muito feliz porque as pessoas gostam do meu jeito. Eu sou muito extrovertida, muito dada, muito festeira e isso também não é muito comum em Portugal. As pessoas são um pouquinho mais contidas. Eu vejo que as pessoas se sentem contagiadas com o meu astral e eu sinto isso positivamente.
Como foi gravar com os constrangimentos da pandemia?
Foi chato, mas essa pandemia está chata. Não pelos constrangimentos, está chata por essa parte extremamente trágica e negativa que ela traz. Infelizmente, todos temos alguém próximo que já teve COVID-19. Eu já tive, mas graças a Deus, tive pouquíssimos sintomas. É difícil. Eu sinto muita falta das confraternizações, porque eu sou da festa. Mas a gente não pode! Não pode sair, não pode ir para lugar nenhum porque ninguém pode ficar doente, porque gravamos seis dias por semana… então é uma loucura! A gente não confraterniza. Fico muito menos amiga das pessoas do que gostaria de estar. Mas é a situação atual do mundo.
Com quem tem mais proximidade do elenco?
Eu colei mais na Carol [Carolina Torres] e na Margarida [Vila-Nova]. A Carolina é meio maluquinha como eu, a gente logo se colou. Já nos vimos irmãs. E a Margarida é uma pessoa muito especial, muito sensível. Fizemos umas cenas que foram muito importantes. Temos uns papos de mulheres e de mães muito doces e profundos. Apeguei-me muito a ela também.
Sobre as cenas de “O Clube” em que há mais exposição do corpo: a Luana faz uma personagem de 27 anos, tem 44. Teve algum tipo de preparação anterior ou foi com o pensamento ‘vou fazer isso e tudo bem’?
Fui com esse pensamento. É preciso lembrar que temos de humanizar a estética. Temos de parar de achar que somos essas coisas que vêm nas revistas, que nem existem. Eu não me preocupei, não. Eu estou saudável… Estava era doida para sair do COVID e começar a gravar!
Depois desta série vão existir mais oportunidades para trabalhar com a SIC? O que é que tem planeado para 2021?
Eu estou aqui aguardando o telefone tocar. Já moro aqui há dois anos, já estou adaptada, os miúdos já estão adaptados, eu preciso trabalhar! Eu estou a aguardar o sucesso que eu sei que “O Clube” vai ter, que eu sei que vai ser a minha galinha dos ovos de ouros, para aguardar os próximos convites.
Prefira com a SIC? Colaborou brevemente com a TVI [a atriz coapresentou o reality show "Like Me" com Rúben Rua].
Na verdade, eu gosto de quem gosta de mim. Se alguém me convidar para fazer uma boa personagem, eu vou fazer. Inclusive tem outra televisão em Portugal, do governo [RTP], os meus amigos falaram-me que é de grande qualidade, que as pessoas são maravilhosas. Então estamos aí, querendo boas personagens. E também estou a produzir o meu primeiro espetáculo teatral para Portugal, que deve estrear em maio. Ainda não tem nome, mas tenho-o chamado carinhosamente de “A Woman Show”. É um projeto extremamente pessoal. Vou contar histórias da minha vida e costurá-las com canções. Vai ser feito no Coliseu.
Estou a celebrar 30 anos de carreira e a sincronicidade das coisas fez com que eu pudesse ter a graça de celebrar essa data no palco do Coliseu com um projeto pessoal, convidando a plateia para dividir o palco. Porque a plateia estará no palco comigo. Quero que tenha mesas, não quero ter as pessoas distantes de mim. Quero poder circular entre as mesas e estar próxima das pessoas. Porque eu amo gente.
Quando se estreou, tinha 14 anos, alguma vez pensou que isto ia durar 30 anos?
Não. Eu sou virginiana organizada, mas eu nunca projetei muito o meu futuro. Sempre fui dando ouvidos à minha intuição e à minha vontade de fazer determinados projetos. É por isso. Eu nunca pensei "ai quero ser apresentadora, ai quero produzir teatro, quero morar fora", eu fui é buscando desafios, fui querendo fazer “faculdades”. Porque digo que cada projeto não deixa de ser uma faculdade que você faz.
"Sou muito feliz a morar em Cascais, sinto-me numa tela de cinema cada vez que chego à costa daqui"
Mudou-se para Portugal em 2018. Dois anos depois, sente que foi a escolha certa?
Sinto e sou muito grata. A princípio eu queria ir para a Califórnia e foi a convite do Rock in Rio Lisboa que conheci mesmo Portugal. Eu já tinha vindo uma vez, mas foi muito rápido. Apaixonei-me pelas pessoas, pelo clima, pela comida, pelo vinho e decidi que a minha família se mudaria não para a Califórnia, mas para Portugal. Sou muito feliz a morar em Cascais, sinto-me numa tela de cinema cada vez que chego à costa daqui. Sou muito feliz com as minhas escolhas.
Alguma vez pensou voltar para o Brasil?
Jamais! Jamais pensei e duvido que pense.
Porquê?
Porque eu não tenho vontade de voltar para o Brasil. Aqui sinto-me segura. No Brasil, a gente não tem paz. É uma coisa que eu não consigo explicar para você porque, graças a Deus, você nunca deixou de tê-la. A gente só conhece as coisas quando as perde. Por exemplo, privacidade. A gente não se dá conta do que é, acha que privacidade é ir no banheiro fazer cocó. E não é! Privacidade é muito maior do que isso. Quando você se torna uma figura pública é que se dá conta do que é realmente privacidade. Estou falando nisso porque paz é uma coisa que brasileiro não conhece e vocês sempre tiveram e isso é uma dádiva. Esse é o porquê de eu estar aqui. Eu não quero ter medo de o meu filho estar brincando na rua, de ele pegar um transporte público.
Entristece-a olhar para o seu país e perceber que está, enfim, no estado em que está? Causa-lhe mágoa?
Causa-me quase que desespero. Quer dizer, não é desespero porque não estou mais lá. Na verdade, é um sentimento ambíguo. Porque eu sinto-me ao mesmo tempo triste e como alguém que desertou. É quase como se eu fosse uma traidora. Mas eu estou super satisfeita com a escolha que eu fiz. Ao mesmo tempo que eu me envolvo, eu não me envolvo. Mas eu acho que o grande problema do Brasil é que a gente vem escolhendo governos absolutamente corruptos e errados há muito tempo. Eles nunca focaram na educação porque obviamente é inteligente da parte deles que as pessoas não pensem e só agora se está dando conta nisso. O que eu acho é que se agora, depois de esse presidente passar, a gente conseguir fazer uma boa escolha, vamos precisar de duas gerações de boas escolas para que a gente viva numa sociedade mais justa e generosa. A gente precisa de educação. A gente não tem o básico, então não se forma o cidadão. Essa é a essência da sociedade.
"Estou com um namorado novo, estou bem apaixonada, bem feliz"
Os seus filhos já são mais portugueses do que brasileiros?
Não. Os meus filhos mais pequenos utilizam vocabulário português, mas com sotaque brasileiro. Mas o mais filho mais velho, quando conversa com os amigos, já fala com sotaque português. Suponho que seja para se sentir mais da maltinha.
Como vai ser o seu Natal?
Pois é, esta até comentando com uma amiga. Pela primeira vez em 44 anos, vou passar um Natal longe dos meus pais e dos meus filhos. Eles vão passar com o pai, separação tem dessas coisas…
Mas o Pedro está a viver em Portugal, certo?
Com a graça de Deus! Se ele mudou para cá comigo, ele tem de morar aqui! Ele passou o final do ano com as crianças e o próximo é dele. Eu estava relutando contra isso, mas eu sabia que isso ia acontecer em algum momento. Mas eu graças a Deus estou com um namorado novo, estou bem apaixonada, bem feliz. Então eu fui salva pelo gongo, digamos assim.
Então vai passar o Natal com o seu novo amor?
Exatamente. Feliz e apaixonada em Portugal. Uma nova vida! Novo amor, novo Natal novos ciclos…
O seu namorado é brasileiro, mas vive em Portugal?
Exatamente.
Já disse que ele é uma pessoa muito discreta e que não vai aparecer consigo nas redes sociais. Ele já era seu fã?
Não, porque ele não foi criado no Brasil. Tem pouquíssimas referências brasileiras. Claro que ele achou estranho a quantidade de seguidores que eu tinha mas ele não tinha muita referência minha, não…
Isso é bom para si, há menos expectativas.
Eu nunca pensei muito sobre isso porque, se eu pensasse, ia ficar maluca, não ia relacionar-me com ninguém. Mas agora que aconteceu, eu até pensei que pudesse ser bom. Mas eu acho que o amor não tem regra, quando ele acontece, é porque era para acontecer. Acho que, mesmo se ele soubesse, teria sido assim. A gente nunca vai saber.
Apesar do resto, está a ser um final de 2020 abençoado.
Pois é, mas isso é muito curioso porque eu amaldiçoei este ano e finalizei o ano com muitas coisas boas: "O Clube", o meu grande amor e foi confirmada a segunda temporada do meu programa no Brasil. Por causa da COVID-19 e do novo governo ter travado todas as produções cinematográficas, a gente perdeu o outro. Então estou com essa segunda temporada atrasada dois anos mas agora, em 2021, finalmente sairá. Chama-se "Luana é de Lua" e é do E!. Foram três coisas realmente boas, então eu olhei para 2020 e pensei ‘realmente, você é uma caixinha de surpresas’ !
Quais são os seus desejos para 2021?
Eu quero trabalhar em Portugal. Quero fazer a minha peça, quero que as pessoas se sintam tocadas pela minha história e pela maneira como eu gostaria de dividir com elas a celebração dos meus 30 anos de carreira, e gostaria de continuar a fazer produções de audiovisual aqui em Portugal. Eu quero trabalhar! Eu fui convidada para fazer novelas na SIC e na TVI quando cheguei.
E porque é que não aceitou?
Era tudo muito novo, eu tinha-me separado, três miúdos, novo país, inverno. Eu precisei mesmo de um ano para me organizar. Então quando eu estava preparada para trabalhar, veio o COVID e bloqueou todo o mundo. Estou ansiosa, quero entrar na engrenagem!