Para cada grande produção como “A Guerra dos Tronos”, há cinco ou mais séries que passam despercebidas e que não são conhecidas ao ponto de se tornarem assunto de conversa em jantares de amigos. “The Americans”, terminado em 2018 e considerado pela crítica como um dos melhores (e mais desconhecidos) títulos dos últimos anos, é só um exemplo.
Todas as semanas, a MAGG traz-lhe uma sugestão imperdível na nova rubrica “A série que ninguém está a ver”, com o objetivo de dar a conhecer algumas das produções com menos visibilidade — mas que merecem tantos ou mais elogios como outras populares.
A nova recomendação é "Patrick Melrose", uma série de 2018 que, embora seja da Showtime (a casa de séries como "Dexter" e "Segurança Nacional"), faz parte do catálogo da HBO Portugal e mostra um Benedict Cumberbatch decadente, soturno e problemático.
E esta é daquelas que merecem ser vistas com algum conhecimento prévio da história real que serve de base para o desenrolar dos cinco episódios. Lamento, puristas dos spoilers e do secretismo absoluto.
Mas se, pelo contrário, entender que não deve saber mais do que a simples sinopse que se encontra no iMDB, guarde o artigo e volte quando já tiver visto toda a temporada. Deixamo-lo apenas com esta premissa: "Patrick Melrose" é uma série desconcertante que vale a pena ver de copo de vinho na mão e sempre com a consciência de que, tudo o que de mais perverso e duro acontece na história, é real. Mas, no final, tudo acaba bem. Mais ou menos, porque o trauma fica sempre.
A base da história contada na televisão diz respeito à vida de Edward St Aubyn, um jornalista e escritor inglês que imortalizou o seu conflito interior numa série de romances publicados entre 1992 e 2012 e que acompanham a vida de Patrick Melrose — um homem mergulhado num abismo de depressão, ansiedade, drogas e pensamentos suicidas depois de uma infância marcada pela violência e pelos abusos sexuais de que foi vítima.
Só que, na verdade, Patrick era Edward. Agora com 60 anos, Aubyn continua a viver em Londres e tem dois filhos, mas até aos 25 anos, altura em que procurou apoio psiquiátrico, a sua vida limitava-se ao consumo de drogas pesadas e a todas as formas de autodestruição que lhe permitissem apaziguar os demónios de uma infância traumática e que não se esquece.
Além de viver no seio de uma família disfuncional britânica de classe alta, foi às mãos do pai que Edward foi perdendo a inocência quando este, com a complacência da mãe, abusou dele repetidamente e castrou-o emocionalmente. Este rapaz cresceu atormentado e virou-se para as drogas, para o alcoolismo e para a autodestruição em qualquer poiso — geralmente um hotel luxuoso inglês — que serviam como o refúgio perfeito para os seus vícios.
Cada episódio da série, são cinco, baseia-se na saga de romances autobiográficos de Edward St Aubyn que conta a sua história através de personagens fictícias às quais só lhes mudou o nome. Porque tudo o resto, desde os diálogos às memórias, faz parte de uma luta que Aubyn ainda hoje se encontra a travar, porque as mazelas ficaram mesmo depois de exorcizadas através da escrita.
"Patrick Melrose" expõe essa luta sem filtros e com uma crueldade que só uma série inglesa seria capaz de usar para criar momentos densos, irrespiráveis e de excelente televisão.
Para os céticos, a crítica internacional desfaz quaisquer dúvidas: "'Patrick Melrose' representa uma acusação mordaz sobre aquela que é a disfunção herdada pela alta sociedade britânica e da riqueza que lhes permite toda a crueldade que vemos na série. Feitas as contas, é tudo aquilo que 'The Crown' não é", lê-se no resumo das opiniões submetidas pelos críticos de televisão na plataforma "Rotten Tomatoes" — que avalia a série com uma pontuação de 90% (de 0 a 100%).
A adaptação dos livros ficou a cargo de David Nicholls e o elenco é composto por nomes como Benedict Cumberbatch, Jennifer Jason Leigh e Hugo Weaving.