Quando Laura Pereira começou a dar aulas, os enunciados dos testes eram feitos à mão e fotocopiados num máquina de stencil. Depois o pai ofereceu-lhe uma máquina de escrever e aí já era mais fácil dedilhar os exercícios em inglês que intercalava com colagens feitas à mão.

O computador surgiu e com ele a facilidade de deixar de copiar imagens dos livros e — na loucura — inserir bonecos do Clipart. Agora, aos 61 anos, vê-se pela primeira vez a trabalhar em casa. E não é um dia de folga ou uma tarde livre. É mesmo trabalho. E em casa. Coisa que pode durar vários meses.

Ainda que o Ministério da Educação não dê diretrizes específicas, cada escola deve adaptar-se à nova realidade e no caso do Agrupamento de Escolas de Ponte da Barca, no qual Laura é professora, a ideia é criar uma sala de aula virtual, com a ajuda da ferramenta do Google Classroom. "A ideia é formar turmas e pôr os alunos a trabalhar", explica a professora à MAGG. Para isso vão munir-se dos manuais virtuais disponibilizados pelas editoras, de maneira a que não falte material de estudo.

Após a decisão do Governo de encerrar as escolas, a Porto Editora decidiu dar acesso gratuito, a professores e alunos, à sua plataforma de ensino à distância, a Escola Virtual. Também a semana passada, a Leya informou os professores da gratuitidade de um serviço que habitualmente é pago, a Aula Digital.

O grupo de inglês, do qual Laura Pereira faz parte, vai reunir-se — virtualmente, claro — para uniformizar a forma de ensinar. Mas também Laura vai ter que aprender, 39 anos depois de ter começado a dar aulas. "Eu nunca usei este tipo de ferramentas, mas conto com as colegas mais novas para me ajudarem", refere. E acredita: "Esta vai ser uma forma de, no futuro, estar mais próxima das novas tecnologias e inseri-las na minha forma de dar aulas".

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Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas, também é da opinião de que os professores se podem reinventar com esta situação. "Os portugueses são resilientes e os professores, em particular, já provaram que conseguem superar qualquer obstáculo". 

O professor continua atento às diretrizes dadas pelo governo que, até ao momento, deixa na mão de cada escola a escolha sobre qual o melhor método a aplicar. Há quem opte por enviar trabalhos por email, por dar aulas em vídeo ou por criar plataformas de troca de conteúdo entre professores e alunos.

É o caso de Catarina Ganhão, professora de ensino básico no Colégio Guadalupe, em Verdizela, Corroios, que adoptou o Microsoft Team como ferramenta de trabalho para as próximas semanas. É lá que os professores conseguem pôr as hiperligações para vídeos do youtube ou para a escola virtual, fazer upload de fichas e testes e, além disso, fazer chamadas de áudio e vídeo com os alunos.

Como falamos de crianças com idades habitualmente entre os 6 e os 10 anos, toda esta articulação é feita com os pais. O ensino é facultativo e sem horários, mas Catarina, à semelhança dos outros professores, está disponível na plataforma das 9h às 16h30, ainda que estes horários não sejam estanques. "Todos os professores descarregaram a ferramenta para o telemóvel e se um aluno fala comigo às 17h com dúvidas, é óbvio que vou responder".

Mas e quando os miúdos não têm telemóvel, iPad e nem sequer internet? É exatamente com esta realidade que lida Filipa Jordão, professora de música da Orquestra Geração, um projeto que tem como objectivo o desenvolvimento de orquestras infantis e juvenis em escolas do 1º, 2º e 3º ciclo. Ainda que estes alunos não sejam avaliados — "não é esse o objetivo", explica Filipa — o acompanhamento é fundamental e está neste momento inviabilizado.

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"Falamos aqui de crianças que vivem em bairros onde, muitas vezes, nem sequer há internet", salienta. Além disso, lembra que os agregados familiares podem não ser os habituais e que, muitas vezes, as crianças ficam à guarda de avós ou tios, enquanto os pais vão trabalhar. "Em empregos que, seguramente, continuam a ter obrigar uma presença física, mesmo nestas circunstâncias".

Ainda sem solução à vista para chegar a quem não tem um acesso facilitado, Filipa foca-se atualmente no ensino dos mais velhos, quase todos já com telemóvel próprio. Ainda sem perceber como funciona a questão do direito de imagem e do acesso aos dados, tendo em conta esta situação tão particular, Filipa prefere não fazer vídeos. "Envio exercícios para irem praticando e ouço os áudios que me enviam pelo Whatsapp".

Para estes casos, Filinto Lima não tem solução imediata. "O futuro dita que caminhemos para um ensino cada vez mais tecnológico", refere à MAGG. Mas e a curto prazo? O presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas refere a possibilidade de os exercícios sejam feitos também em papel para que os pais possam ir buscar à escola. Mas isso só em último caso. "Pede-se o isolamento social e é para cumprir".

Filinto lembra a importância de um acompanhamento mais próximo dos pais nesta fase, com ou sem acesso a tecnologias. "O esforço é de todos. Pais, alunos e professores".

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