É num cenário desconhecido que começa a aperceber-se de que perdeu o seu grupo e ficou sozinho. Continua a andar, não faz ideia para aonde, até que sente que o estão a perseguir e aí começa a maratona. Corre à procura de um lugar para se esconder, corre mais porque não encontra e, ou toca o despertador, ou acorda em aflição porque foi apanhado por quem o perseguia.
São assim muitos dos pesadelos e foi precisamente para os estudar, que alguns cientistas tiraram horas de sono para perceber de que forma estes têm influência em nós. Apesar de na manhã seguinte raramente nos lembrarmos dos sonhos, são normalmente os mais agitados — pesadelos — que nos marcam a memória.
Mas sonhar com coisas que nos sobressaltam durante a noite pode ter um propósito. Qual? É isso que revelam vários estudos feitos ao longo dos anos e que se dedicaram a analisar a forma como as emoções e os sonhos se relacionam.
Um dos primeiros saiu em 2009 e analisou a relação entre os sonhos e os níveis de stresse de 624 estudantes do ensino secundário. A conclusão foi que aqueles que tiveram sonhos mais angustiantes, tinham uma maior probabilidade de sofrer de ansiedade.
E pode haver uma explicação. De acordo com Deirdre Barrett, professor de Harvard e autor do livro "Comité do Sono", "as pessoas que têm sonhos mais assustadores são frequentemente mais aterrorizadas durante o dia", revela ao site "Elemental".
Mais tarde, em 2011, um outro grupo de investigadores descobriu que as pessoas a quem foi pedido que bloqueassem um pensamento intrusivo antes de ir dormir, acabaram por sonhar sobre esse pensamento. Uma atualização deste estudo foi feita em 2015, mostrando que havia uma correlação significativa entre as características de pensamentos bloqueados e a presença de emoções do dia a dia nos sonhos.
O misticismo sobre os sonhos é equivalente àquele que nos leva a tentar perceber a relação dos signos com a nossa forma de estar. E é por isso que as pesquisas sobre o porquê dos sonhos têm continuado, e no ano passado surgiram mais desenvolvimentos.
Um pequeno estudo, publicado em fevereiro, analisou apenas 18 pessoas que sonhavam com imagens perturbadoras e descobriu que há uma relação entre uma área do cérebro e as emoções negativas. Quando ativada, é essa que faz com que tenhamos pesadelos, que podem até influenciar o stresse nos momentos em que estamos ativos.
Barrett revela, por isso, que os pesadelos são a forma de a mente "antecipar ansiosamente as coisas más e tentar pensar no que fazer".
Faltava perceber de que forma é que os pesadelos poderiam ser úteis ou prejudiciais quando estamos acordados. A resposta chegou em março do ano passado, com a realização de um estudo sobre o efeito dos sonhos e a forma como recuperamos dos mesmos. A investigação contou com a colaboração de 77 indivíduos, a quem foi pedido que cinco minutos antes de irem dormir, durante sete dias, bloqueassem um pensamento. Mais tarde tinham que dizer se o pensamento tinha sido agradável e desagradável. Na manhã seguinte, registavam o sonho que tinham tido.
O resultado? Quem teve pensamentos mais desagradáveis e sonhou com eles, sentia-se melhor em relação ao assunto que o perturbava. Já quem teve pensamentos desagradáveis mas não sonhou com eles, sentia-se mais desconfortável com aquele problema reprimido.
"A recuperação do sonho e um bloqueio bem sucedido mostraram efeitos benéficos na resposta emocional subjetiva aos pensamentos agradáveis e desagradáveis. Os resultados podem apoiar uma teoria sobre a função dos sonhos no processamento das emoções", concluem os investigadores. Por outras palavras, os pesadelos ajudam-nos a lavar a roupa suja emocional. Quem diria?