Jenni Hermoso, jogadora da seleção espanhola feminina, voltou a romper o silêncio sobre todos os acontecimentos que envolveram o ex-presidente da federação espanhola Luis Rubiales, após a vitória na final do Mundial feminino. Eleita a Mulher do Ano pela edição espanhola da revista "GQ", a jogadora profissional de 33 anos confessou em entrevista que sofreu bastante desde esse dia, tendo recebido várias ameaças de morte, o que a fez procurar mais ajuda psicológica.

“Tive de assumir as consequências de um ato que não provoquei, que não escolhi, que não premeditei. Cheguei a receber ameaças e isso é algo a que nunca te acostumas”, disse Hermoso. “Ter de contar isso repetidas vezes (o que aconteceu com Rubiales) estava a magoar-me muito. (...) Houve consequências, recebi ameaças, e nem pedi nem iniciei aquele beijo", acrescentou.

Jenni Hermoso não foi convocada para a seleção espanhola. "Proteger-me de quê? Ou de quem?"
Jenni Hermoso não foi convocada para a seleção espanhola. "Proteger-me de quê? Ou de quem?"
Ver artigo

A jogadora foi à procura de ajuda com uma psicóloga que já a acompanha há vários anos, para conseguir ultrapassar as dificuldades. “Graças a ela sinto-me mais forte e não estou desanimada nem a pensar em não querer mais jogar futebol”, salientou.

Após ter sido alvo de um beijo não consentido de Luis Rubiales nas celebrações depois da conquista do Mundial feminino de 2023, o caso tomou proporções mundiais e o ex-presidente foi até entrevistado por Piers Morgan. "Tivemos um ato espontâneo, mútuo, que ambos consentimos, e que surgiu da emoção do momento, a felicidade. Por isso, mantenho que essa é a verdade acerca do que aconteceu", disse na altura, sem pedir desculpas à jogadora.

Ainda assim, Hermoso não quer deixar que este episódio seja uma mancha negativa na sua vida. Na conversa com a "GQ", afirma que quer ser recordada “como uma pessoa que quis deixar a Espanha no topo, mas, acima de tudo, como alguém que tentou mudar muitas mentalidades”. “Felizmente ou infelizmente, existe esta história, mas vou aprender a utilizá-la de forma positiva para lutar por aquilo que considero ser bom para a sociedade”, acrescentou.

Estes acontecimentos acabaram por ter amplas repercussões em Espanha, ditando a demissão do antigo presidente. Várias manifestações de grupos feministas e estudantis foram feitas e a própria organização da administração da seleção feminina teve de se reorganizar. O nome de Jenni Hermoso ficou ligado a um movimento feminista criado nas redes sociais, denominado “#SeAcabó” (“#Acabou-se”, em português), o que para a jogadora foi um sinal de apoio global contra a desigualdade, protagonizando uma mudança de paradigma “justa e necessária” na luta pelo feminismo.  

“Com tudo o que aconteceu, penso que muitas de nós, incluindo muitos amigos e familiares, ficaram mais conscientes do que a palavra 'feminismo' realmente significa. Nós, no futebol, experimentamos em primeira mão a luta pela igualdade. Chamaram-nos caprichosas. Sempre se disse que queríamos receber o mesmo que os rapazes e isso não era verdade”, disse a jogadora à "GQ" espanhola.

A maior marcadora da história da seleção feminina espanhola disse também que está "muito irritada" com aqueles que afirmam que o futebol feminino "não gera tanto dinheiro quanto o futebol masculino". “É óbvio que sabemos isso e nunca pedimos para ser pagas como eles. Só queríamos o básico: ter um salário mínimo, ser respeitadas e ter a oportunidade de fazer algo muito grande. Assim que o conseguimos, ganhámos um Campeonato do Mundo”, disse.

Estes episódios entre a jogadora e o antigo presidente, que ainda hoje permanecem em tribunal, levaram a que o comité disciplinar da FIFA, no passado mês de outubro, proibisse José Luis Rubiales de exercer qualquer tipo de atividade relacionada com este desporto. O ex-presidente está banido por três anos.