Quando Danielle Calafato fez "match" com um homem rico e atraente no Tinder, não pensou duas vezes antes de marcar um encontro. Afinal, até tinha pena do israelita, sempre sozinho nos melhores hotéis do mundo e em jatos e carros luxuosos. Queria, acima de tudo, conhecê-lo e Sliema, em Malta, foi o local escolhido para o primeiro (e último) contacto presencial.
Um encontro. Foi quanto bastou para que o instinto de Danielle Calafato disparasse, como se estivesse perante um perigo iminente. A jovem de Malta decidiu não acompanhar o homem que se apresentava sob o nome de Simon Leviev (Shimon Hayut), agora conhecido como "Impostor do Tinder", condenado por fraude e acusado de roubar milhões de euros às ex-namoradas, para o seu iate luxuoso — e, até hoje, diz, não podia estar mais grata por ter ouvido o próprio corpo. Tudo isto em 2015.
Anos mais tarde, estreia o documentário "Impostor do Tinder", já disponível no catálogo da Netflix Portugal desde 2 de fevereiro, e tudo fez sentido. Danielle esteve prestes a entrar no leque de vítimas do falso magnata de 31 anos.
Agora, a jovem decide partilhar, de forma detalhada, o dia em que se cruzou com o perfil do alegado Simon Leviev e todos os contactos que trocou com o vigarista. O objetivo? Alertar a comunidade das aplicações de encontros para fraudes semelhantes.
Danielle Calafato recorda como tudo começou
"Tinha acabado de instalar o Tinder e estava a fazer swipe pelos perfis da aplicação, quando fiz "match" com um homem, que me enviou imediatamente mensagem", conta, em declarações à revista "Lovin Malta".
"Disse-me que estava prestes a voar para Malta. Recusei o convite para jantar, mas aceitei o almoço. Pediu-me que recomendasse um restaurante e eu escolhi o Exiles, aqui, em Sliema", recorda Danielle, com a ressalva de que, à data, o que a movia não era tanto o interesse romântico pelo jovem, mas o facto de sentir pena dele. "Estava sozinho em todas as imagens que tinha no perfil. Só tinha selfies sozinho nos carros luxuosos ou no jato".
Ainda assim, no dia seguinte, decidiu arriscar e marcar presença no encontro. Mas Simon não estava onde era suposto. "Fiquei chateada porque ele não estava onde tínhamos combinado", explica Danielle, que conta que acabou por alterar o destino e caminhar até ao alegado paradeiro do vigarista.
Quando chegou ao local, perguntou "onde estás?", por mensagem. E a partir daí começou o desconforto. "Estou a ver-te", respondeu o alegado filho do "rei dos diamantes".
"Reparei imediatamente nele. Estava vestido dos pés à cabeça com roupas de designer e o guarda-costas já estava a caminhar na minha direção". E foi nesse momento, garante, que começou a questionar a identidade do homem com quem estava prestes a ter um encontro.
"As fotos mostravam efetivamente carros topo de gama — mas qualquer pessoa pode alugar um carro. Nem pensei muito nisso. Só depois do encontro é que me apercebi da quantidade de carros diferentes que tinha espalhados pelo perfil". Mas vamos voltar ao encontro.
A jovem explica que ficou preocupada com o nível de segurança que aquele encontro requeria. Afinal, o guarda-costas revistou todo o perímetro antes de permitir que o casal começasse, efetivamente, a conversar. Danielle explica que o israelita começou a falar do quão ocupado era e de todos os (falsos) planos de trabalho e de viagens que tinha no calendário. Ainda assim, quando o assunto roçou a casa fixa, amigos e família, começou a descambar.
"Não tenho casa, não tenho família", disse o vigarista. "Só tinha um amigo, mas traiu-me". Danielle conta que foi das primeiras "bandeiras vermelhas" que saltou à vista. E, a partir daí, começou a recuar. Mas há mais.
Conversa fiada à parte, Danielle conta que Simon começou a falar como se tivesse total controlo na sua vida. No caso, na vida de quem tinha acabado de conhecer. "Estás à ver aquele iate ali? É nosso para os próximos dois dias, vens comigo e vamos agora comprar-te um biquini". A jovem recusou, o casal seguiu caminhos opostos, mas o vigarista voltou a mandar mensagem.
"Era demasiado persistente", recorda. No entanto, tudo mudou quando se apercebeu de que não tinha hipóteses íntimas ou românticas com Danielle. "Bloqueou-me uma semana depois, disse que não havia qualquer razão para ser meu amigo".
Danielle nunca mais se cruzou com Shimon Hayut, mas juntou as peças assim que se deparou com o documentário. As fotografias eram as mesmas e reconheceu um padrão nas vítimas. "São todas loiras", frisa. "eu vi todas as fotografias que as vítimas viram". "Podia ter sido eu", explica.
A jovem de Malta garante que o que a salvou foi a falta de interesse por tudo o que é material. "Para certas pessoas, o convite para uma viagem de iate é uma oportunidade de uma vida. Para mim não".
"Mas compreendo totalmente as vítimas. Fazia com que se apaixonassem por ele, com que se preocupassem com a sua segurança e alimentava-se disso. Como é que podiam recusar ajudar alguém que já tinha gasto tanto com elas? Afinal, tinham vivido a melhor vida de sempre com ele", remata. E deixa um recado para o público feminino.
"Meninas, sei que todas procuramos um príncipe encantado, mas não será claramente este homem. Não tenho dúvidas disso. Devia estar atrás das grades".
Recorde-se de que Shimon Hayut fingia ser filho de Lev Leviev, conhecido pelo "rei dos diamantes" e CEO do grupo LLD Diamonds, apresentava-se sob o nome de Simon Leviev e seduzia mulheres na aplicação de encontros Tinder.
Quando a relação começava a avançar, alegava estar a ser perseguido por inimigos e pedia-lhes o cartão de crédito emprestado, única e exclusivamente para poder sobreviver. Pedido a que as vítimas respondiam sem pensar duas vezes, sob a ilusão de socorrer o namorado dos seus sonhos. Um plano alegadamente perfeito, mas que custou vários empréstimos e milhões de euros em dívidas às vítimas em questão.
E mesmo depois de cumprir cinco meses de prisão e ver a vida e esquemas expostos no documentário da Netflix, "Impostor do Tinder", o israelita continua a frisar que está inocente. E terá recorrido às redes sociais para partilhar um comunicado.
"Se sou uma fraude, porque é que haveria de participar no documentário? Porque é que não me prenderam durante as gravações? Está mais do que na altura das senhoras começarem a contar a verdade. Se não lhes consegues dar o mundo que querem, tornam o teu num pesadelo. Vou contar toda a verdade esta sexta-feira", terá escrito Shimon Hayut, esta segunda-feira, 7 de fevereiro. Não há, no entanto, forma de confirmar a veracidade desta conta de Instagram. Segundo o falso magnata, a sua versão da história vem a público já esta sexta-feira, 11.