Em março de 2016, Tian Haicheng ficou paralisado da cintura para baixo na sequência de um acidente automóvel — o carro onde seguia despistou-se e, a alta velocidade, caiu numa vala. O condutor e restantes passageiros saíram ilesos mas o chinês de 40 anos ficou preso a uma cadeira de rodas.
Como se não bastasse, apenas dois meses e meio depois, a mulher com quem estava casado há sete anos saiu de casa com o filho mais velho. E nunca mais regressou.
"Ela disse-me que ia ficar em casa da mãe por uns dias. Mas nunca mais voltou e levou o nosso filho com ela", contou Tian Haicheng ao "Yangtzi Evening News".
A viver em Gaotai Village, no condado de Haiyuan, província de Ningxia, Haicheng viu-se de repente sem nada. Oriundo de uma família pobre e sem direito a indemnização (o carro não tinha seguro), o homem esgotou todas as suas poupanças e chegou mesmo a contrair dívidas para sobreviver — ele e a filha mais nova, Jia Jia, na altura com apenas 4 anos.
Pai, tu não podes morrer. Se tu morreres, eu fico sem pai. A minha mãe abandonou-me. És tudo o que tenho."
Só que o desespero tomou conta dele. No verão de 2017, decidiu suicidar-se. "Os meus pais foram para o campo apanhar milho, deixando-me em casa com a minha filha Jia Jia. Menti-lhe e disse que estava constipado".
Tian Haicheng tentou enganar a filha, convencendo-a de que a medicação adequada para a suposta constipação eram os frascos de pesticida que tinha em casa, utilizados no campo para combater as pragas. Apesar de ser tão pequena, Jia Jia achou estranho aquele "medicamento". Antes de lho dar, correu para os campos para alertar os avós.
Quando percebeu que o pai tinha tentado matar-se, Jia Jia chorou. "Pai, tu não podes morrer. Se tu morreres, eu fico sem pai. A minha mãe abandonou-me. És tudo o que tenho", recordou Tian Haicheng ao "Yangtzi Evening News". Naquele momento, o homem percebeu que não podia abandoná-la. E, a partir daquele dia, tudo mudou.
A rotina diária de Jia Jia e o pai
Hoje, todos os dias, todos, sem exceção, Jia Jia acorda às seis da manhã para massajar os músculos do pai durante 30 minutos. Tendo em conta o tempo que passa na cama e na cadeira de rodas, os músculos de Haicheng começaram a atrofiar. Estes movimentos são importantes para atrasar esse processo.
No início não sabia como barbear: cortei a cara do meu pai e sangrou. Agora sou muito boa. A minha avó diz que eu faço a barba muito bem".
De seguida, a menina usa um "guindaste" improvisado pelo avô para colocar o pai na cadeira de rodas. Depois chega a altura de lhe lavar a cara e os dentes.
Se for dia de escola, Jia Jia segue para as aulas. Quando regressa, faz o jantar para os dois. Quando chega a altura de ir para a cama, a rapariga volta a usar o guindaste para colocar o pai na cama. E as tarefas ainda não estão terminadas: a meio da noite, levanta-se pelo menos uma vez para virar o pai, com o intuito de reduzir o aparecimento de escaras.
Com orgulho, Jia Jia contou que se tornou uma autêntica especialista a fazer a barba. "No início não sabia como barbear: cortei a cara do meu pai e sangrou. Agora sou muito boa. A minha avó diz que eu faço a barba muito bem".
Quando questionada sobre se sente falta da mãe, Jia Jia respondeu: "Não, porque ela não cuida do pai. Mas sinto falta do meu irmão."
Como esta história se tornou viral na China — e no mundo
Neste momento, Haicheng depende dos pais idosos e da caridade para sobreviver. Com o intuito de conseguir mais algum apoio financeiro, criou uma conta no Kuaishou, um site de transmissão em direto na China, para mostrar como é a sua vida — e obter a ajuda de estranhos. Neste momento, pai e filha têm quase 480 mil seguidores.
"As pessoas vêm para ver a minha filha a tomar conta de mim. Incentivam-me a viver, perguntam-me o que é que eu preciso".
Diariamente, os vídeos de Tian Haicheng reúnem cerca de duas mil pessoas em direto. Entretanto a história saltou da plataforma chinesa Kuaishou para o mundo, e não faltam vídeos e imagens virais de Jia Jia a cuidar do pai.