Depois de se saber que André Ventura, 38 anos, estava infetado com COVID-19, uma página, alegadamente pertencente à distrital de Vila Real do partido, partilhou um texto disseminando uma teoria da conspiração para justificar o facto de o líder ainda não ter sido vacinado numa altura em que já o podia ter feito há cerca de um mês e meio — quando o agendamento para maiores de 37 anos abriu a 22 de junho.

"O nosso amigo e líder André Ventura está doente. Uma doença que apanhou por nós para nos andar a acompanhar pelo País e para espalhar a mensagem do Chega. Podia ter ficado em casa e nada disto tinha acontecido, mas arriscou a vida e a saúde pelos portugueses de bem", começa o texto.

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A teoria da conspiração começa a um parágrafo do fim, quando o texto argumenta que os "funcionários do governo" localizados no centro de vacinação iriam "tentar injetar veneno" em Ventura. "Duvidam que se o André chegasse ao centro de vacinação, cheio de funcionários do governo socialista de António Costa, não lhe iam tentar injetar veneno mal percebessem que era ele? Todo o cuidado é pouco", lê-se.

A publicação em questão recomenda ainda, no mesmo texto, que os militantes do Chega "não se identifiquem com tal quando" forem "tomar a vacina". "Incomodamos muita gente e vão fazer de tudo para nos parar", continua.

A mensagem remete ainda para "orações" endereçadas a Ventura para que "volte bem e ainda mais forte", argumentando que "a nossa Senhora de Fátima está com ele e não vai permitir que um dos seus escolhidos sucumba a uma doença criada na China para destruir o Chega". A publicação tornou-se viral, sendo replicada em vários órgãos de comunicação social, mas a direção do partido demarcou-se ainda nesta terça-feira, 10 de agosto, dizendo que a página é dirigida por militantes, não sendo a oficial.

"O Chega vem, desta forma, desmentir categoricamente que a página de Facebook da distrital de Vila Real que está a ser noticiada pela imprensa seja gerida por dirigentes do partido", comunicou o partido numa nota oficial ao "Diário de Notícias". A verdadeira página oficial tem apenas uma publicação, feita a 29 de setembro de 2020.

José Dias, presidente da distrital de Vila Real, considera "lamentável que as pessoas usem estas artimanhas" para prejudicar o partido e garante, em declarações ao "Observador", nada ter que ver com a página em questão. Sérgio Ramos, vice-presidente da distrital, confirma, dizendo que "a página não tem rigorosamente nada que ver" com a distrital, em declarações ao mesmo jornal.

"Tenho conhecimento dessa página e já comunicámos à nacional que esta página não é nossa”, reforça. O Chega vai agora apresentar queixa à polícia contra os responsáveis pela página, diz o "Observador".

André Ventura fez três testes (dois rápidos e um PCR). Os três resultados foram positivos, obrigando o líder do Chega a um período de isolamento profilático.

André Ventura não está vacinado e sempre quis ser "o último português a tomar a vacina"

Ventura não está vacinado, justificando a ausência de qualquer dose com uma forte atividade política, que o terá impedido de agendar, mas também devido a uma "decisão pessoal" que ainda não tinha tomado, escreve o jornal "Expresso", citando a CMTV, o canal para o qual Ventura prestou serviços de comentador e ao qual falou sobre o assunto depois de ter conhecido o diagnóstico de infeção.

"Neste momento, já podia ter agendado, mas não tinha tomado esta decisão pessoal por causa da atividade política muito ativa", explicou, assumindo que, agora, tinha "de assumir as consequências da sua decisão".

Desde maio, vacinação contra a COVID-19 já terá evitado 700 mortes
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Mais tarde, no entanto, o discurso mudou com André Ventura a assumir alguma desconfiança face à eficácia das vacinas no combate à COVID-19 — as mesmas que, desde maio, terão evitado cerca de 700 mortes, tal como concluiu um grupo de investigadores do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.

"Não é uma questão de ser estruturalmente contra as vacinas por uma ou outra razão. Quero ter mais elementos científicos sobre a vacina, como pessoa responsável. Sei que para outros é suficiente o que existe, mas quero ter mais informações e acho que estou no meu direito", explicou em declarações ao jornal "Observador".

A essa declaração, juntou outra, criticando a aplicação do certificado digital — já usado em vários países da Europa, como a Itália — que permite a entrada no interior de restaurantes, museus e hotéis a pessoas: 1) com a vacinação completa; 2) com testes negativos; ou 3) recuperadas da doença.

"Com as atuais exigências dos certificados, estão, na prática, a tornar a vacina obrigatória", diz à mesma publicação.

O dirigente político reconhece que, no seu eleitorado, há "uma frente anti-vacinas muito forte", embora o mesmo se aplique ao seu partido que é composto por vários dirigentes vacinados e não-vacinados, escreve o "Observador". A questão, no entanto, nunca terá sido discutida internamente.

Ainda que o agendamento para maiores de 37 anos tenha aberto a 22 de junho, André Ventura poderia ter sido vacinado mais cedo no âmbito do plano de vacinação para deputados.

Apesar disso, Ventura disse que seria "o último português a tomar a vacina", por não concordar com esse regime de exceção.

(Artigo atualizado às 15h42 de terça-feira, 10 de agosto, com a clarificação de que a alegada página do Chega Vila Real era gerida por militantes e não por membros oficiais do próprio partido.)