Como é que se explica a dois pais que o seu filho nasça sem olhos, nariz e uma parte do crânio, quando nenhuma das ecografias indiciava anomalias na saúde do bebé? É a pergunta que tem estado na ordem do dia depois de, a 7 de outubro, Rodrigo ter nascido com malformações graves que surpreenderam a própria equipa médica que esteve presente no parto.
É que além de a gravidez não ter sido acompanhada no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, onde foi realizado o parto, a mãe já tinha feito três ecografias com o seu obstetra, Artur Carvalho. E em nenhuma das três foi detetada qualquer anomalia na formação do bebé.
O primeiro sinal de alerta terá surgido, escreve o "Correio da Manhã", quando a mãe fez uma ecografia 5D numa outra clínica da especialidade e já depois dos três exames anteriores. Terá sido aí que terão sido detetadas anomalias no bebé que, por sua vez, levaram os pais a confrontar o médico que os seguia. Face aos resultados, o obstetra Artur Carvalho terá garantido que não havia motivos para alarme.
No entanto, havia. O bebé nasceu com malformações graves e foi a equipa médica que preparou os pais para o pior: Rodrigo deveria morrer nas primeiras horas de vida. Duas semanas depois, porém, a criança já respira sozinha e não precisa de uma sonda para se alimentar.
Joana Simão, tia do bebé, revelou à mesma publicação que a criança perdeu peso nos últimos dias, no entanto encontra-se "estável".
Sobre este caso, Pedro Gonçalves Pereira, médico neuroradiologista, revela à MAGG que atualmente já existem soluções de diagnóstico "que permitem resolver muitas das dúvidas que aparecem nos exames ecográficos", referindo-se à ressonância magnética fetal.
E garante que a ecografia do feto é um exame "muito delicado". "Estamos a avaliar ecograficamente um ser vivo, um feto, que é habitual mexer-se durante o exame. Além disso, a própria ecografia tem várias condições técnicas que requerem um treino bastante aprofundado e um conhecimento muito valorizado nas limitações e nas possibilidades do exame."
Segundo o especialista, é nos casos de dúvida após a realização de uma ecografia que deve ser pedida uma ressonância magnética fetal — já que é através dela que se permite detetar malformações ou lesões no bebé. Estas são feitas por radiologistas e neuradiologistas, "em centros públicos e privados de todo o País".
O objetivo, defende, é o de estudar o cérebro, o crânio e toda a estrutura do corpo do bebé "com uma acuidade de diagnóstico e uma definição de imagem que ultrapassam a ecografia." E o especialista não tem dúvidas de que não importa qual seja o tipo de dúvida que surja durante uma ecografia. Se existir, deve ser investigada e esclarecida.
"Perante qualquer dúvida mais ou menos pertinente do ponto de vista clínico, há sempre possibilidade de a esclarecer inequivocamente através da ressonância magnética. É um exame que deve ser requisitado para o bem do feto, para tranquilidade dos pais e até para a própria tranquilidade do obstetra que segue o desenvolvimento daquela gravidez."
Ainda assim, Pedro Gonçalves Pereira explica que este não é um exame que se possa fazer a todas as grávidas de forma sistemática.
"A ressonância magnética fetal não tem a facilidade de utilização e de acesso que tem a ecografia e está reservada para situações em que, perante um plano ecográfico em que algumas estruturas do crânio, do cérebro e do resto do corpo não sejam claramente visíveis e identificáveis quando têm de ser, possa ser possível avaliar o desenvolvimento do bebé. Nestes casos, e havendo dúvidas, o recurso à ressonância deve ser uma regra e não uma exceção", continua.
Salvaguardando o facto de não conhecer concretamente o caso de Rodrigo, o especialista diz que o desenvolvimento pós-natal da criança é uma incógnita.
"A evolução do seu estado de saúde vai depender sempre das áreas cerebrais que foram atingidas e daquelas que, mesmo afetadas, sejam capazes de, neste primeiro e segundo ano de desenvolvimento, caso o bebé sobreviva, recuperar das lesões pré-existentes."
Em casos onde existam lesões de pequenas dimensões, o cérebro tem alguma capacidade de recuperar. Porém, no caso de malformações graves que envolvam muitas áreas cerebrais ou uma grande quantidade de cérebro afetado, "o prognóstico é menos favorável".
Os pais de Rodrigo já fizeram queixa contra Artur Carvalho, o obstreta que os seguiu durante a gravidez. Esta é a décima queixa recebida pelo Conselho Disciplina da Ordem dos Médicos numa altura em que o médio tem, atualmente, cinco processos em aberto. Outros quatro arquivados.