Foi no Convento do Sacramento, em Alcântara, Lisboa, que o chef Rúben Pacheco Correia, uma presença habitual no programa da SIC "Casa Feliz",  se sentou frente a Aníbal Cavaco Silva para uma conversa descontraída e inédita, que marca a estreia do antigo presidente da República num registo de daytime, transmitida esta quinta-feira, 19 de novembro.

É este o local em que mantém o seu gabinete de trabalho. Foi escolhido pelo ex-chefe de Estadi, depois do fim do seu mandato, como acontece com todos os antigos presidentes. Mas porquê aqui? Foi assim que a conversa começou: "Eu escolhi este convento para o meu gabinete de trabalho porque queria ficar no bulício da cidade e queria ficar perto da minha casa e também não muito longe de Campo de Ourique, um bairro a que estou muito ligado, desde os meus tempos de estudante", começou por dizer Cavaco Silva.

Não está longe do Palácio de Belém, mas confessa que não sente falta do poder. "Não tenho saudades. Não tenho nenhumas saudades. Foi um período da minha vida em que exerci as funções de presidente da República guiado pelo critério do interesse nacional, em que dediquei a minha experiência e o meu saber a um desempenho dessas funções", diz. "Foram missões que me coube representar naquele tempo, que eu fiz com muito gosto, mas sempre com a preocupação de defender o superior interesse nacional."

Entre o entrevistador e entrevistado, repousa numa mesa um astrolábio, instrumento naval que faz também a capa do livro autobiográfico assinado por Cavaco Silva "Uma Experiência da Social Democracia Moderna". O antigo presidente da República releva que se trata exatamente do mesmo objeto. E ainda revela a identidade de quem o ofereceu.

"Foi-me oferecido pelo primeiro-ministro António Costa", diz. "É o da nau Santíssimo Sacramento que naufragou no Brasil", conta, acrescentando que o gesto foi "uma simpatia, até porque eu já tinha pensado que vinha para o Convento do Sacramento."

O passeio de barco com Bush e a piada sobre o peso do chef

Uma das histórias mais engraçadas que Cavaco Silva relata passa-se um ano depois de ter tomado posse como primeiro-ministro, o que aconteceu em novembro de 1985. "Visitei oficialmente os Estados Unidos, a convite do presidente Ronald Reagan. O vice-presidente, então era George Bush, o pai, que depois foi presidente dos Estados Unidos".

Este fez-lhe um convite: "Convidou-me, a mim e à minha mulher, para passarmos um fim de semana com a família dele na casa privada que ele tinha no Maine, no Norte dos Estados Unidos, na fronteira com o Canadá."

Foram dar uma passeio de barco, experiência que, segundo Cavaco Silva, foi repleta de adrenalina: "Ele gostava de grandes velocidades, como gostava imenso daquelas curvas fechadas", lembra. "Eu devo dizer-lhe que só me senti confortável quando chegámos ao cais e eu pus os pés em terra firme."

casa feliz

Cavaco Silva já estava, no entanto, mais ou menos a par deste hobbie do presidente do Bush — assim como do seu gosto por velocidades. É que, mesmo antes desse fim de semana no Maine, o então primeiro-ministro português passou por Boston para almoçar com um cardeal, que o alertara para esta característica do vice americano. "Tanto que o corpo de segurança o acompanha sempre num barco atrás", lembra no programa "Casa Feliz". "Foi inesquecível esse fim de semana."

E, dado que a entrevista é levada a cabo por um chef, claro que não podia faltar um capítulo relacionado com comida. Anibal Cavaco Silva tem os seus pratos prediletos: "Adoro peixe fresco grelhado nas brasas: sardinhas, robalo, sargo, lulas, pregado. Acompanhado normalmente, e não dispenso, por uma salada montanheira, como dizemos no Algarve, que tem tomate, pimentos e orégãos."

No entanto, o ex-presidente da República admite que não sabe cozinhar. "Sou um péssimo cozinheiro. Uma vez, há muitos anos, fiz a tentativa de fazer fatias douradas", conta. "Foi um desastre."

Aproximamo-nos de um dos momentos mais surpreendentes desta entrevista, aquele em que Cavaco Silva faz uma graça. "Continua a devorar bolos-rei?", pergunta Rúben Pacheco Correia. "Gosto de bolo-rei, mas agora como muito pouco, porque sou contido nos doces." É aí que brinca, comentando a figura do chef que o entrevista: "E penso que o senhor deve ter cuidado com a sua dieta e, talvez, deva fazer mais exercício físico. Eu recomendo."

Rúben Pacheco Correia não leva a mal e ri-se. "Eu também concordo consigo", diz. "Mas olhe que eu não gosto de bolos-rei."