A medida parece inevitável. Ao registar mais de 240 casos por 100 mil habitantes, Lisboa está em risco de recuar no plano de desconfinamento. Para o matemático Carlos Antunes, um dos responsáveis pelas linhas de orientação seguidas pelo governo no combate à COVID-19, a "tendência é crescente".

"Estamos com 250 casos [por 100 mil habitantes], mas com um potencial de atingir já amanhã [esta quarta-feira, 16 de junho] os 280 casos em Lisboa. Houve uma diminuição no fim de semana prolongado e isso fez com que a incidência baixasse, mas essa descida foi artificial", explica em declarações ao jornal "Público". Nos concelhos vizinhos de Lisboa, a tendência crescente também se verifica: enquanto em Cascais e Sintra já se ultrapassou a marca dos 120 casos por 100 mil habitantes, as regiões como Odivelas, Loures e Oeiras estão muito próximas dos 100 casos.

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É com este contexto em cima da mesa que Carlos Antunes é assertivo: "um passo atrás pode e deve ser dado em Lisboa". A ideia passa por contornar a situação atual, numa altura em que a incidência está a evoluir. A posição assertiva de Carlos Antunes contrasta com a de Raquel Duarte, especialista em saúde pública, que diz que a decisão de recuar ou não no desconfinamento deverá depender da evolução da situação epidemiológica na região nos próximos dias.

"Os próximos dias vão ser fundamentais para perceber se as medidas chegam ou não", diz ao mesmo jornal. Mas recorda que o levantamento das medidas que se deu em Lisboa só funciona se se fizer acompanhar de uma maior responsabilidade social.

"Se a responsabilidade individual não for cumprida, as outras falham", diz, atribuindo este aumento de casos a situações de ajuntamentos de pessoas.

As restrições previstas caso Lisboa recue

Da mesma forma, também Duarte Vital Brito, da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, aguarda a reavaliação por parte das autoridades de saúde. "As regras existem e estão estabelecidas Neste momento, é aguardar pelas reavaliações. São decisões também políticas e não meramente do foro da saúde pública", diz ao "Público". Apesar disso, é facto que os casos estão a aumentar e que, por isso, "alguma coisa adicional será preciso fazer".

"A verdade é que os casos já estão a aumentar há algum tempo. A tendência tem sido crescente, o que era expectável com o desconfinamento, continua.

Se a tendência atual se mantiver e Lisboa for obrigada recuar, pela primeira vez, no plano de desconfinamento, as restrições que entrarão em vigor serão várias.

  • Restaurantes, cafés e pastelarias têm de fechar às 22h30 durante os dias de semana e às 15h30 ao fim de semana e feriados;
  • Na restauração, limite de quatro pessoas (interior) ou seis (exterior) por mesa;
  • Salas de espetáculos têm de fechar às 22h30;
  • Casamentos e batizados com um máximo de 25% de lotação;
  • Ginásios sem aulas de grupos;
  • Eventos no exterior com lotação reduzida (a ser definida pela DGS);
  • Lojas de Cidadão com atendimento presencial por marcação;

António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa em desacordo

O alerta dos especialistas surge na altura em que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa parecem em desacordo face à eventualidade de se recuar no desconfinamento. Começou no sábado, 12 de junho, quando Marcelo Rebelo de Sousa afastou a possibilidade de voltar atrás no desconfinamento devido à "média de mortos baixíssima, à média de [internamentos em] unidades de cuidados intensivos muito baixa e à media de internamentos perfeitamente aceitável".

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"Naquilo que depender do presidente da República, não se volta atrás", reforçou.

Na segunda-feira, 14, António Costa assumiu uma posição contrária. "Se alguém pode garantir [que não se volta atrás no desconfinamento]? Não, creio que nem o senhor presidente da República seguramente o pode fazer, nem o fez", disse em declarações aos jornalistas. Nesse mesmo dia, a troca de recados continuava, desta vez por Marcelo Rebelo de Sousa que respondia a António Costa. "Por definição, o presidente nunca é desautorizado pelo primeiro-ministro. Quem nomeia o primeiro-ministro é o presidente, não é o primeiro ministro que nomeia o presidente".

Na manhã de terça-feira, 15, quando questionado sobre se terá desautorizado Marcelo, Costa desvalorizou.

"Só pode haver aqui um mal entendido, alguma intriga ou confusão. Nem nunca me passaria pela cabeça desautorizar o senhor presidente da República. Acho que isto é tudo um equívoco, certamente, entre as perguntas que foram feitas e as respostas que foram dadas".