Novas rotinas, e algumas de difícil adaptação. A vida para os professores não ficou facilitada com a pandemia, que obrigou muitos a lidar com tecnologias e métodos de ensino totalmente desconhecidos. Toda esta mudança provoca stresse e, em casos em que o desgaste já é anterior, pode mesmo levar a casos de burnout.

O burnout caracteriza-se como um síndrome de stresse crónico vivido no contexto de trabalho e "ocorre quando existe uma situação prolongada no tempo, em que a pessoa está a viver um conjunto de situação no local de trabalho, caracterizado por exigências ou condições negativas às quais não consegue dar resposta", explicou à MAGG Maria José Chambel, psicóloga do trabalho e das organizações, neste artigo.

Segundo o diretor clínico do Instituto de Apoio e Desenvolvimento (ITAD), Sérgio Pereira, o ensino à distância piorou a condição dos professores que já tinham sintomas de burnout. "Esta profissão teve de mudar e inventar possibilidades para que funcionasse", justificou à "Lusa", citado pelo "Correio da Manhã", o especialista.

Sérgio Pereira alerta para o facto de o burnout ser uma patologia do foro mental que, quando não é tratada, pode conduzir a doenças mais graves como a depressão e a ansiedade. Segundo o psicólogo, a pandemia veio trazer "um repúdio e um sentimento de ataque no ato de olhar para o computador em teletrabalho" a quem já sofria de algum tipo de esgotamento deixando ainda estes indivíduos incapazes de trabalhar.

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O teletrabalho fez com que deixassem de haver momento de distração e relaxamento entre colegas, algo que o especialista considera importante. Relativamente ao caso concreto dos professores, Sérgio Pereira afirma que "com o teletrabalho, caíram que nem moscas os que estavam a pender por um fio", visto que "tiveram de se adaptar a uma metodologia de ensino que não estava prevista". O psicólogo considera que esta situação representou uma sobrecarga pois "para além do trabalho que tinham de fazer [em circunstâncias normais], apareceram outras burocracias e outros modelos avaliativos que não havia antes".

Raquel Varela, historiadora do trabalho, não partilha da mesma opinião quanto à forma como a pandemia afetou os professores. A especialista refere à "Lusa" que "quem gostava muito da escola, ficou pior em teletrabalho, e quem estava em burnout na escola ficou melhor em teletrabalho",  isto porque o ensino à distância "afigurou-se como uma aparente fuga das más condições de trabalho".

Contudo, a investigadora admite que, para os professores mais velhos, o teletrabalho "pode ter aumentado a sua irritação e o seu desgosto" visto que tiveram de aprender a ensinar os alunos à distância e através de tecnologias com as quais não estavam familiarizados. Segundo dados divulgados em dezembro pelo Conselho Nacional de Educação referem que a a passagem da sala de aula para o virtual alterou o dia de quase cem mil docentes que trabalham nas escolas, sendo que a maioria tem mais de 50 anos.

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Além das patologias do foro mental, Manuel Carrageta, presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia, refere à "Lusa" que se verificam nos professores "muitos enfartes do miocárdio, muitos hipertensos e muitos casos de colesterol elevado" relativamente ao resto da população. Segundo o médico, as condições de trabalho estão relacionadas com o estilo de vida da classe docente o que acaba por influenciar das doenças identificadas nos professores. 

O médico sublinha que as condições de trabalho da classe docente influenciam as doenças identificadas nos professores porque estas estão relacionadas com o estilo de vida. "Se a pessoa é fumadora, se bebe álcool e come desregradamente e em demasia, se não faz exercício... tudo influencia a saúde. A profissão em si pode condicioná-la por causa dos horários demasiado prolongados e excesso de trabalho que vai para casa", explica à "Lusa", citado pelo "Correio da Manhã".

De acordo com dados de 2016, da Associação de Psicologia da Saúde Ocupacional, 17,3% dos portugueses sofrem com a patologia de burnout. Os burnouts têm sido mais frequentes nos últimos anos, dado que apenas 9% dos trabalhadores nacionais assumiam passar por esta situação em 2008. Em 2013, apenas cinco anos depois, o número aumentou para 15%.