O restaurante Estórias, da Casa da Comida, tem um novo chef há cerca de meio ano — e é uma cara conhecida da televisão portuguesa. Rafael Ribeiro foi um dos concorrentes da primeira temporada do "Hell’s Kitchen", reality show sobre culinária da SIC apresentado por Ljubomir Stanisic.
Depois dessa participação, trabalhou em catering, inaugurou o hotel de cinco estrelas The Editory Riverside, em Santa Apolónia, Lisboa, e colaborou com o grupo de restauração Sea Me. "Fiquei interessado no projeto. É uma casa diferente", disse, à MAGG, sobre este novo desafio (que conjuga com as formações de cozinha no Instituto do Emprego e Formação Profissional).
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O Estórias trabalha com cartas sazonais em prol da sustentabilidade. Esta mais recente é a segunda concebida por Rafael Ribeiro, mais virada para as estações quentes. Ficou disponível há menos de um mês. "Demos primazia à simplicidade. Não vale a pena inventar muito", crê o chef de 22 anos, que começou a trabalhar aos 16. "O nosso principal alvo é a felicidade e a satisfação do cliente", assegura.
Ao assumir as rédeas do projeto, foi-lhe indicado que reformulasse tudo. Mesmo mantendo alguns clássicos, deveria dar-lhes uma nova faceta. "Pegar num conceito clássico de boa comida e transformá-lo em algo moderno, mas com a mesma origem, é extremamente complexo", considera Rafael Ribeiro, por ser difícil gerir as expetativas dos clientes habituais.
A maior novidade é o menu degustação (ou "assinatura do chef") , composto por seis momentos, pelo valor de 67€. "É ir totalmente à descoberta. Conseguimos contar logo uma história. Contar um bocadinho do que somos e de com quem trabalhamos", descreve.
A MAGG teve a oportunidade de provar este menu criado por Rafael Ribeiro, que começou com o couvert, com azeitonas marinadas com laranja, alho, flor de laranjeira, manteiga, tomilho e limão, focaccia com mel e alho confitado, um balanço entre o doce e o salgado. O amuse-bouche, que "muda todos os dias", foi uma mousse de queijo de cabra com noz crocante, redução de moscatel roxo e rebentos.
A crocante e doce salada de porco ibérico com 24 meses de cura, hortelã e vinagrete foi a entrada fria. A quente, servida num copo de shot, era um croquete de galo do campo com maionese fumada, panado com três tipos de pão. Seguiu-se uma corvina deliciosa que passou meia hora em salmoura "para solidificar", com puré de pastinaca, legumes grelhados e um molho de chalotas caramelizadas divinal.
Para carne, cachaço com puré de batata doce e limão "para dar frescura" e acelgas grelhadas. A sobremesa veio na forma de três texturas de chocolate (de leite, branco e negro), com uma cúpula de chocolate, crocante de caramelo, flor de sal, gelado de limão e crumble de chocolate — o paraíso para os amantes de chocolate. Também pode optar pelo menu à carta.
O restaurante, que, antes desta nova equipa "super jovem", tinha um staff só com mulheres, apenas funciona de terça a sábado para os jantares, em prol do "bem-estar, do descanso e da vida pessoal do staff", de acordo com o chef. Com capacidade para 40 pessoas (ou 60, no caso de serem grupos), o Estórias "privilegia a experiência".
Mas como surgiu este espaço, que, na década de 90, chegou a ter uma estrela Michelin? Desde 2005 que pertence a Salomé e Rogério Alcântara, depois de o tio de Salomé, um artista de cinema, a ter incluído no negócio. "O meu tio era um contador de histórias", revela a atual dona desta empresa familiar à MAGG.
"Sempre adorou comida e cozinhar para os amigos, mas não era cozinheiro. Toda a gente dizia que ele tinha imenso jeito", garante. "Tu tens é de abrir um restaurante", ouvia muitas vezes o tio de Salomé, que era presença assídua em restaurantes estrela Michelin pelo Mundo inteiro. Incentivado e desafiado pelos amigos, acabou por ceder.
Como tinha um grupo que se chamava Casa da Comédia, surgiu a Casa da Comida. O que começou por ser um restaurante com dress code, à porta fechada, com porteiro é agora um local "mais trendy, mais fashion". A campainha continua lá, mas já é possível ir ali jantar de calças de ganga. "Durante duas décadas foi um dos restaurantes mais premium de Lisboa", conta a responsável, que vem da área da comunicação.
"Continuámos a querer ter um restaurante requintado e glamoroso, com inovação e modernidade", disse Salomé à MAGG. "Tentámos manter a origem, o que é difícil quando se vai para uma casa com 48 anos de existência. Conseguir introduzir uma carta que seja viável tanto para o chef como para os patrões e clientes", reconhece Rafael Ribeiro.
A partir de uma certa altura, "foram surgindo pedidos para fazer eventos fora", recorda Salomé. Depois do restaurante, veio o serviço de catering, que hoje "representa 70% da faturação da empresa", com "posicionamentos diferentes e equipas autónomas" e também uma cozinha de produção separada, para eventos corporativos e sociais (como casamentos, batizados e aniversários) pelo País inteiro.
O projeto, que existe há quase meio século, sofreu um rebranding há oito anos. A decoração deste espaço acolhedor tem vindo a ser alterada "para acompanhar as tendências", juntando loiças da Companhia das Índias a pratos do IKEA, de modo a "tornar o restaurante acessível a todos os públicos", justifica a dona.
Com uma fonte, um pátio exterior, um "Ferrari de fogão" (assim como o descreve o chef), mesas grandes e espaçadas entre si, vitrines com livros e outros apontamentos e uma parede de azulejos de um edifício pombalino restaurado, o Estórias fica na zona das Amoreiras.